quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

SÓ NUMA TERRA ARADA COM A CRISE DE FÉ A SEMENTE DA ESPERANÇA PODE PENETRAR E GERMINAR

 Missa do 3. dom. do advento. Palavra de Deus: Isaías 35,1-6a.10; Tiago 5,7-10; Mateus 11,2-11.

 

            Como temos vivido a nossa vida? Com otimismo ou com pessimismo? Com esperança e alegria, ou com desencanto? A nossa época, decididamente, não é nem de alegria, nem de esperança, mas de medo, de preocupação, de insegurança e de ansiedade; uma época em que cada vez mais sentimos uma tendência a irmos para baixo. Não é só o estresse do dia a dia que faz baixar a nossa libido – o prazer ou a alegria de viver –, mas os diversos problemas, como doenças, conflitos, dificuldade financeira, solidão, insegurança no trabalho, violência e, principalmente, a sensação de que estamos sozinhos no mundo, sem alguém que possa nos salvar da destruição causada, algumas vezes, por nós mesmos.

            O abatimento da nossa esperança e da nossa alegria são importantes, porque nos colocam em comunhão com a crise de fé pela qual estava passando João Batista, na prisão: “És tu, aquele que há de vir, ou devemos esperar um outro?” (Mt 11,3). João Batista tinha uma grande expectativa em Jesus, de quem ele esperava uma intervenção radical e definitiva na história humana. Mas Jesus escolheu atuar de uma outra forma na consciência das pessoas e na história humana, deixando de lado a radicalidade que impõe à força uma mudança que sabemos, ou julgamos, ser necessária.

            Na verdade, João estava se perguntando se ele havia perdido tempo em crer em Jesus; se ainda teria sentido em continuar a crer e esperar nele. Nós precisamos ser muito sinceros e reconhecer que nossa fé não está tranquila, mas agitada, angustiada, insegura. Não entendemos tudo o que está acontecendo conosco e com o mundo. Não enxergamos claramente onde está Deus e quais as razões pelas quais Ele parece não intervir no mundo, mas escolhe deixar que a humanidade continue a fazer mal a si mesma. Será que Deus realmente nos ama e se importa conosco? Será que nós entendemos suas promessas, contidas na Sagrada Escritura, ou elas não passam de consolação ilusória para quem sofre?

            Jesus responde à crise de fé – nossa e de João Batista – afirmando: “Feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim” (Mt 11,6). Feliz aquele que não joga fora sua fé só pelo fato de eu não intervir na sua vida como ele espera. Feliz aquele que não se fecha em ideias pré-concebidas a meu respeito, mas se mantém aberto àquilo que eu quero lhe revelar, dando-me a conhecer a ele de uma maneira nova e mais profunda. Feliz aquele que cuja fé não tem resposta para tudo, mas que aceita sofrer a angústia das perguntas, deixando-se questionar pela realidade por meio da qual o Espírito Santo continua a falar ao ser humano.   

            Embora João Batista estivesse passando por uma crise de fé, Jesus afirma que ele nunca foi um caniço agitado pelo vento, ou seja, uma pessoa volúvel, que muda de opinião conforme a onda do momento, que não tem raiz, isto é, que não tem convicção interior e que se deixa arrastar como folha seca pelo vento da desorientação em que vive o mundo. João Batista também não era um homem ligado ao supérfluo, cujo sentido de vida dependia do seu próprio bem-estar. Muito pelo contrário, era um homem simples e austero, que vivia do essencial e não se deixava aprisionar em falsas necessidades. João Batista era um autêntico profeta: um homem que vive junto aos outros homens, afetado pelos mesmos problemas que eles, mas que consegue ver, por trás de uma realidade ambígua e contraditória, a mão de Deus orientando a história para a verdade, a justiça e o bem comum.

            E você, como se vê? Como Jesus descreveria você? Como uma pessoa que se deixa determinar a partir de fora ou que busca se determinar a partir de dentro? Você é uma pessoa cuja esperança se assenta na Palavra do Deus que não mente, ou que depende de que as circunstâncias externas sejam favoráveis ao seu bem-estar, e que os ventos soprem a favor dos seus sonhos e projetos? “Fortalecei as mãos enfraquecidas e firmai os joelhos debilitados” (Is 35,3). Suas mãos ainda de erguem e seus joelhos ainda se dobram para orar? Suas mãos ainda persistem em fazer algo para tornar o mundo melhor, ou elas decidiram “jogar a toalha”, como a maioria? Seus joelhos ainda sustentam seus passos no seguimento de Jesus, ou desistiram de caminhar atrás dele?  

“Criai ânimo, não tenhais medo! Vede, é vosso Deus, (...) é ele que vem para vos salvar” (Is 35,5). “Ânimo” é contrário de desânimo – sem alma, sem vigor, sem vida interior, um cadáver ambulante. Nosso “ânimo” deve ser firme como o ânimo do agricultor: independente de ter a garantia de que vai chover, ele trabalha firmemente a terra, arando e semeando, na esperança de que, no momento certo, a chuva virá e fará a semente germinar (cf. Tg 5,7). Se a chuva cai numa terra onde nada foi semeado, ali só cresce o mato. A nós, portanto, cabe semear. Não temos o poder de fazer chover. Como bons agricultores, devemos semear com firmeza, inclusive e sobretudo no tempo da tristeza, sabendo que “aquele que semeia entre lágrimas, colherá com alegria” (Sl 126,5).

            Se muitas pessoas querem colher o que não semeiam e esperam que caia do céu aquilo que elas não se dão ao trabalho de cultivar, Deus procura por bons agricultores, por pessoas firmes na sua fé e na sua esperança, por pessoas que semeiem em todos os tempos, e não somente quando existe garantia de chuva. Não revistamos a terra da nossa alma com uma camada de cimento chamada “indiferença”, “apatia”, “desânimo”. Mantenhamos a terra da nossa alma descoberta, arada com o arado da crise de fé, de uma fé que se deixa cortar por dentro, para que ali, no corte aberto, seja lançada a semente da esperança, e dela brote o fruto que comprova que Deus jamais desamparada aqueles que nele esperam (cf. Sl 25,3).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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