terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

CONVERSÃO: VOLTAR-NOS PARA AQUELE QUE PODE NOS SALVAR

 Missa de Cinzas. Palavra de Deus: Joel 2,12-18; 2Coríntios 5,20 – 6,2; Mateus 6,1-6.16-18.

             Quaresma, um tempo de quarenta dias. Como o apóstolo Paulo acabou de afirmar, um “tempo favorável” para a nossa salvação. Para chegar ao monte Horeb e se encontrar com Deus, Elias caminhou quarenta dias (cf. 1Rs 19,8). Para iniciar a sua missão de nos salvar, Jesus permaneceu no deserto quarenta dias (cf. Mc 1,13). Jonas, por sua vez, assim pregou à cidade de Nínive: “Daqui quarenta dias, Nínive será destruída” (cf. Jn 3,4). Assim como os ninivitas tiveram um tempo de quarenta dias para se converterem e mudarem suas atitudes, assim a quaresma se abre hoje para nós como um tempo forte de conversão.

No sentido geral, “conversão” significa “mudança”. Ela se mostra necessária quando nos damos conta de que tomamos uma direção errada na vida, trazendo destruição para nós mesmos, para os outros e para o mundo em que vivemos. No sentido bíblico, porém, a conversão tem um sentido mais profundo. Ele não é apenas mudança de direção, mas um “voltar-se”: “Agora, diz o Senhor, voltai para mim com todo o vosso coração (...). Voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar o castigo” (Jl 2,12-13).

O tempo da quaresma é um tempo de revisão de vida, o tempo em que, como o filho pródigo, podemos tomar uma decisão em vista de salvar a nossa vida pessoal, comunitária e social: “Vou me levantar, voltar para o meu pai e dizer-lhe: ‘Pai, pequei’” (Lc 15,18). Enquanto Igreja, somos membros do Corpo de Cristo, e o nosso pecado pessoal afeta esse Corpo. Enquanto seres humanos, estamos inseridos na sociedade humana, e o nosso pecado pessoal também produz sofrimento no corpo social. “Voltai-vos para mim e sereis salvos, homens todos dos confins de toda a terra” (Is 45,22). A quaresma não tem por objetivo apenas a nossa salvação individual, mas a salvação da humanidade como um todo.

De quem depende a nossa conversão? Em primeiro lugar, de cada um de nós, tomando consciência da mudança que precisamos fazer em nossas atitudes, em nossa conduta de vida afetiva, profissional e espiritual. Mas a conversão é, sobretudo, obra de Deus em nós. Só Ele pode nos convencer da necessidade de mudança; só a sua graça pode transformar nosso coração endurecido como pedra num coração humanizado e dócil à ação do Espírito Santo (cf. Ez 36,26). Justamente porque a conversão é fruto da graça de Deus em nós, o apóstolo Paulo faz este apelo: “Deixem-se reconciliar com Deus!” (2Cor 5,20). Permitam que Deus cure as feridas que o pecado abriu em vocês, na Igreja e na sociedade humana! Deixem-se conduzir pelo Espírito Santo; deixem-se transformar por sua graça!

Jesus nos recorda no Evangelho que a nossa vida é feita de relacionamentos: nós nos relacionamos com o próximo, com Deus e conosco mesmos. Esses relacionamentos estão saudáveis ou adoecidos? Eles têm gerado em nós paz ou conflitos? Para sanar o nosso relacionamento com o próximo, Jesus nos fala da esmola. Ela deve se traduzir em atitudes de compaixão para com quem sofre, para com quem necessita de nós. Para sanar o nosso relacionamento com Deus, Jesus nos fala da oração. Ela deve se tornar o espaço que damos a Deus para que Ele nos cure, nos corrija e nos transforme pela ação da sua graça. Enfim, para sanar a nossa relação conosco mesmos, Jesus nos fala do jejum como retomada da nossa liberdade diante dos nossos instintos. O jejum reordena a nossa vida, porque nos faz passar do “reagir” ao que sentimos para o “responder” àquilo que nos afeta, e responder a partir da nossa vocação de filhos de Deus e não como simples pessoas mundanas.

“Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade” (Ef 2,14). Uma vez que o nosso pecado pessoal atinge a Igreja em que nos encontramos e a sociedade em que vivemos, tornando-se também pecado social, a Campanha da Fraternidade nos chama à conversão convidando-nos a modificar aquelas atitudes que são opostas ao Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. Segundo Efésios 2,14-16, Cristo “derrubou o muro de inimizade” que se parava os povos; em seu corpo pregado na cruz, “ele destruiu a inimizade” e reconciliou todos os homens com o Pai. Ora, se Cristo derrubou o muro da inimizade, por que alguns católicos estão usando as redes sociais para erguer um muro de inimizade entre o povo católico e o Papa Francisco, entre o povo católico e a Conferência Nacional dos Bispos no Brasil (CNBB)? Se Cristo orou ao Pai pedindo pela unidade entre os cristãos – “Pai, que todos sejam um, para que o mundo creia que tu me enviaste” (cf. Jo 17,21), por que alguns católicos usam as redes sociais para combater o diálogo e a unidade entre a nossa Igreja e outras igrejas cristãs?

Quando Jesus iniciou sua quaresma, o diabo estava lá, esperando por ele no deserto para tentá-lo, para confundi-lo (cf. Mt 4,1; Mc 1,13; Lc 4,2). Assim também nossa Igreja no Brasil inicia sua quaresma sentindo a força do maligno agindo nela, para dividi-la, colocando uns contra os outros. Se o espírito do mal divide, o Espírito Santo une; se o espírito do mal levanta muros de inimizade entre as pessoas, o Espírito Santo constrói pontes que possibilitam o diálogo, o entendimento e a comunhão. Deixemo-nos guiar nesta quaresma pelo Espírito Santo, e assim não cairemos nas armadilhas do espírito maligno.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi     

 

 

 

 

 

 

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