quinta-feira, 5 de maio de 2022

A QUAIS MÃOS VOCÊ TEM SE CONFIADO?

 Missa do 4º dom. Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 13,14.43-52; Apocalipse 7,9.14b-17; João 10,27-30.

 

Todo ser humano nasce dependente dos cuidados de alguém. Na medida em que ele cresce, ganha autonomia e passa a cuidar de si mesmo. No entanto, essa autonomia não significa autossuficiência. Todo ser humano tem necessidade de pertença; mesmo sendo adulto, ele busca pertencer a alguém, a algum grupo; mesmo sendo adulto, ele busca se confiar a alguém, porque sente não só a necessidade de ser cuidado, mas também de ser orientado a respeito da vida. Isso significa que todo ser humano é, de uma certa forma, uma ovelha conduzida por um pastor. Portanto, a pergunta que precisamos nos fazer é quem, de fato, tem sido o nosso pastor, o nosso cuidador, o nosso orientador.

Até tempos atrás, instituições como Família, Escola e Igreja funcionavam como cuidadoras, orientadoras. Mas atualmente essas instituições estão em crise, e a grande maioria das pessoas está cada vez mais sem referência de cuidado e de orientação, o que faz com que cada um siga o seu caminho e tente sobreviver como pode, neste mundo individualista e profundamente desorientado. A consequência disso é uma humanidade que vive “como ovelhas sem pastor” (Mt 9,36), atingidas por uma profunda desorientação, desorientação esta que leva muitos a se confiarem a mãos erradas: mãos de lobos, e não de pastores; pior ainda, mãos de lobos disfarçados de pastores.

A esse respeito, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil afirma que nosso País está diante de “duas ameaças” que “merecem atenção especial. A primeira é a manipulação religiosa, protagonizada tanto por alguns políticos como por alguns religiosos, que coloca em prática um projeto de poder sem afinidade com os valores do Evangelho de Jesus Cristo... A segunda é a disseminação das fake news, que através da mentira e do ódio, falseia a realidade” (Carta em defesa da democracia nas eleições, 22/04/2022). Por que os falsos pastores conseguem arrebanhar muitos seguidores em nosso País? Porque somos um povo que tem preguiça de pensar; porque substituímos a leitura de livros por programas televisivos vazios e por filmes e vídeos da internet; porque nos deixamos arrastar pelas nossas emoções e não colocamos nossa razão para funcionar.

“As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem” (Jo 10,27). O nosso desafio é identificar a voz de Jesus no meio do barulho e da correria da nossa vida moderna. Essa voz pode ser encontrada em nossa consciência, quando silenciamos; ela também pode ser encontrada no evangelho de cada dia, que a liturgia da nossa Igreja nos propõe. Ao mesmo tempo, nós precisamos ser a voz de Jesus para inúmeras pessoas que estão desorientadas à nossa volta, especialmente crianças e adolescentes que sofrem abuso dentro de casa ou que não tem quem os oriente no caminho da vida; jovens que estão perdidos nas redes sociais, seguindo “youtubers” ou “influencers” que os deixam ainda mais desorientados, tornando suas vidas vazias de sentido.    

Jesus disse, a respeito das suas ovelhas: “Elas jamais se perderão. E ninguém vai arrancá-las de minha mão” (Jo 10,28). Aqui mais uma vez é preciso deixar claro: embora todos nós queiramos ser livres e autônomos, acabamos por nos confiar às mãos de alguém. A questão, portanto, é saber às mãos de quem eu tenho me confiado. Quem me orienta quanto à vida afetiva e sexual, quanto à vida profissional e financeira, quanto ao lidar com as minhas emoções e com as minhas necessidades espirituais? Quem eu sigo nas redes sociais? O que as postagens dessas pessoas acrescentam à minha vida? Aquilo que eu vejo todos os dias nas redes sociais fortalecem a minha liberdade ou a tornam frágil e incapaz de me ajudar a tomar decisões que sejam importantes para a minha vida?  

Nós somos livres para seguir e nos deixar orientar por quem quisermos. Não esqueçamos o que aconteceu com muitos judeus, na época de Paulo e Barnabé: “Era preciso anunciar a palavra de Deus primeiro a vós. Mas, como a rejeitais e vos considerais indignos da vida eterna, sabei que vamos dirigir-nos aos pagãos” (At 13,46). Jesus, nosso Pastor, não exclui ninguém do seu rebanho; é a nossa resistência à sua Palavra que provoca a nossa autoexclusão. Ele deseja saciar e nossa fome e a nossa sede, nos conduzindo às fontes da água da vida (cf. Ap 7,16-17), mas nós temos liberdade de escolher continuar nos alimentando de conteúdos vazios nas redes sociais, conteúdos que nos causam desnutrição intelectual, emocional e espiritual. Jesus deseja conduzir cada ovelha do seu rebanho ao Pai, que enxuga as lágrimas de todos os rostos, mas muitos ainda preferem continuar se machucando e provocando para si mesmos situações que são de chorar e de lamentar.

“Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai” (Jo 10,29). Às mãos do Pai, que é maior que tudo o que nos acontece, queremos confiar hoje, em especial, as mães; elas que são, na sua grande maioria, modelos de pastor, de cuidado, de orientação – que se sintam cuidadas e orientadas pelo Pai. Pedimos ao Pai que sacie a fome e a sede de cada mãe, e a conduza às fontes da água da vida, saciando sua sede de afeto, de cura, de amparo, de perdão e de regeneração. Enfim, pedimos ao Pai que enxugue as lágrimas dos olhos de toda mãe que chora devido à desorientação dos seus filhos, devido às feridas do seu relacionamento conjugal ou devido às injustiças deste mundo. Que toda mãe sinta-se no colo de Jesus, Bom Pastor, nos braços do Pai, sanadas, cuidadas e guardadas para a vida eterna. Amém!  


Pe. Paulo Cezar Mazzi

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