Missa do 25º. dom. comum. Palavra de Deus: Amós 8,4-7; 1Timóteo 2,1-8; Lucas 16,1-9.
A Sagrada
Escritura nos revela não somente quem é Deus, mas que o Deus em quem nós cremos
tem uma sensibilidade muito grande com os pobres, com os que sofrem. Através do
profeta Amós, Deus faz duras críticas às pessoas que exploram os pobres, aos
que causam a prostração dos pobres da terra (v.4). Causar prostração significa
derrubar a pessoa, esgotá-la, explorá-la, adoecê-la, sugar suas energias. Quem
são as pessoas que prostram os pobres da terra? Segundo o profeta Oseias, são
alguns empresários que pagam salários muito baixos aos seus funcionários;
políticos que trabalham pelo favorecimento dos mais ricos e em prejuízo dos
mais pobres (“dominam os pobres com dinheiro e os humildes com um par de
sandálias”); comerciantes que “diminuem medidas, aumentam pesos e adulteram
balanças” (cf. Am 8,5); e o agro, que põe à venda o refugo do trigo, sendo que
o refugo pertence aos pobres, conforme está escrito: “Quando fizerem a colheita
da sua terra, não colham até às extremidades da sua lavoura, nem ajuntem as
espigas caídas da sua colheita. Deixem-nas para o necessitado e para o
estrangeiro. Eu sou o Senhor, o Deus de vocês” (Lv 23,22).
A condenação de Deus para com os que
exploram os pobres não significa romantizá-los e não enxergar que alguns deles
são desonestos, mal intencionados e que exploram as empresas nas quais
trabalharam, por meio de advogados desonestos. Não podemos fazer de conta que
não existem casos em que empresas chegam a falir por causa de ações
trabalhistas injustas e absurdas. Embora existam pobres assim, não podemos cair
no erro de generalizá-los como pessoas de má vontade e que simplesmente não
querem trabalhar. Do mesmo modo como há ricos desonestos e corruptos, há pobres
assim também.
Justamente porque o Pai sempre
teve uma atenção particular para com os pobres da terra, o Filho a teve também. Jesus veio para salvar a todos, mas sempre dedicou a maior parte do
seu tempo diário para estar com os pobres, sentir suas dores e levar-lhes uma
palavra de esperança: “Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus”
(Lc 6,20). A preocupação de Jesus com os pobres joga por terra o discurso
moralista e espiritualista de que a missão da Igreja é salvar almas, e não se
envolver em questões sociais que causam desigualdade social e aumento do empobrecimento
em muitas pessoas. Portanto, a opção preferencial pelos pobres não é coisa de
padre, bispo ou Papa comunista, mas de padre, bispo ou Papa fiel a Jesus Cristo
e ao seu Evangelho.
No Evangelho de hoje Jesus nos propõe
uma parábola que mexe com a nossa maneira de pensar a vida e de dar prioridade
a muitas coisas – ou seria uma só? (ganhar dinheiro, ficar rico) –, nos
esquecendo do essencial. Um administrador, descoberto na sua desonestidade, foi
colocado contra a parede: “Presta contas da tua administração, pois já não podes
mais administrar meus bens” (Lc 16,1). Na visão de Jesus, todos nós somos administradores,
pois Deus nos confiou bens como saúde, liberdade e recursos financeiros para a
nossa sobrevivência neste mundo. No dia do nosso julgamento, Jesus, constituído
pelo Pai juiz dos vivos e dos mortos (cf. At 10,42; 2Cor 5,10), nos perguntará:
‘Como você administrou a sua vida? Como você administrou seus bens? Você se
lembrou de socorrer os pobres em suas necessidades?’.
Quando o administrador infiel
recebeu o aviso de que seria mandado embora, começou a pensar no seu futuro – o que significa que nós precisamos pensar na nossa salvação. O administrador
chegou à mesma conclusão que Jesus quer que nós cheguemos: a nossa salvação
depende da forma como tratamos os pobres da face da terra: “Já sei o que fazer,
para que alguém me receba em sua casa quando eu for afastado da administração”. Então
ele chamou cada um dos que estavam devendo ao seu patrão. E perguntou ao
primeiro: “Quanto deves ao meu patrão?” Ele respondeu: “Cem barris de
óleo!” O administrador disse: “Pega a tua conta, senta-te, depressa, e escreve
cinquenta!” (Lc 16,4-6).
Os devedores, na parábola de Jesus,
representam os pobres. O administrador desonesto representa a pessoa que está
disposta a fazer de tudo para ser salva, isto é, para entrar no Reino de Deus.
Numa tentativa de atenuar o escândalo dessa parábola, muitos pregadores afirmam
que o administrador mandou os devedores abaterem da dívida aquilo que seria o
seu lucro como administrador. Essa maneira de ver acaba por trair a intenção de
Jesus, que é nos escandalizar, no sentido de nos perguntar: ‘Até onde você
iria, para ser salvo? Do que você seria capaz, para recuperar a sua salvação?’.
Eis o escândalo dessa parábola: o
administrador, que já havia lesado seu patrão uma vez, o lesou pela segunda
vez, diminuindo a dívida dos pobres, com a esperança de que eles o recebessem em suas casas quando fosse despedido. Jesus conclui a parábola dizendo: “E o
senhor elogiou o administrador desonesto, porque ele agiu com esperteza. Com
efeito, os filhos deste mundo são mais espertos em seus negócios do que os
filhos da luz” (Lc 16,8). Quem é o “senhor” que elogiou a esperteza do administrador?
Obviamente que não foi o seu patrão, mas o “Senhor Jesus”, que se alegra quando
nos vê recolocando em ordem os nossos valores e dando prioridade à nossa
salvação e não ao desejo comum de riqueza, implantado em nós pelo sistema
capitalista.
Voltemos por um instante ao perigo
de romantizar os pobres. A grande maioria de nós sonha em ficar rico,
acreditando que o dinheiro nos garante não só sobrevivência no presente, mas,
principalmente, segurança em relação ao futuro. Por isso ser verdade, Jesus faz
um lamento: ‘As pessoas que buscam se enriquecer são muito mais espertas do que
os meus discípulos de todos os tempos, que não têm a mesma esperteza no que diz
respeito à sua vida espiritual e à própria salvação’.
Concluindo a parábola, Jesus nos dá
um importante conselho: “Usai o dinheiro injusto para fazer amigos, pois,
quando acabar, eles vos receberão nas moradas eternas” (Lc 16,9). Para Jesus,
todo dinheiro é sujo, desonesto, injusto, até aquele que nós ganhamos
trabalhando de maneira honesta. Todo dinheiro é injusto porque provém de um
sistema que privilegia os ricos e prostra por terra os mais pobres. Seja pouco,
seja muito, o dinheiro que temos precisa ser destinado não somente à nossa sobrevivência,
mas ao socorro dos mais pobres. São eles que nos receberão nas moradas eternas.
Essa revelação de Jesus é surpreendente! Quem estará na porta do Céu para nos
receber não será São Pedro, mas os pobres que nós ajudamos (ou que, infelizmente, ignoramos e não nos preocupamos em ajudar).
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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