Missa do 15º dom. comum. Palavra de Deus: Deuteronômio 30,14-18; Colossenses 1,15-20; Lucas 10,25-37.
“Mestre, que devo fazer para receber
em herança a vida eterna?” (Lc 10,25). Quem hoje procura por Jesus interessado
na vida eterna? Grande parte das pessoas que creem, incluindo nós, procura por
Jesus para questões da vida aqui e agora. Portanto, a pergunta desse homem, a
respeito da vida eterna, por si só nos questiona: a vida eterna é uma saudável
e necessária preocupação para nós? Aqui vale o alerta do apóstolo Paulo: “Se
temos esperança em Cristo somente para esta vida, somos os mais dignos de
compaixão de todos os homens” (1Cor 15,19).
Segundo Jesus, a vida eterna,
sinônimo de salvação, se alcança a partir dos dois principais mandamentos da
Lei de Deus: Amá-lo de todo o coração e amar o próximo como a nós mesmos. Aqui
cabem outros dois questionamentos: 1. A nossa relação com Deus é pautada no
amor, ou no medo e na necessidade? Em outras palavras, nós buscamos a Deus, na
oração pessoal e na celebração da missa, porque O amamos ou porque temos medo
de que, se não o fizermos, as situações vão piorar, ou ainda porque necessitamos
que Ele nos faça algo ou nos conceda algo? 2. Como anda o nosso amor ao
próximo, em tempos de individualismo, de fechamento e de indiferença para com o
outro?
A pergunta que o homem faz a Jesus é
muito válida para nós também: “E quem é o meu próximo?” (Lc 10,29). A resposta
mais “natural” a essa pergunta seria afirmar que todo ser humano é o nosso
próximo. Mas as coisas não são tão simples assim. Já na época de Jesus, o
conceito de “próximo” havia sofrido múltiplas restrições: os judeus se abriam
somente aos estrangeiros simpatizantes do judaísmo; os fariseus excluíam do seu
amor os pecadores e samaritanos; os essênios faziam o mesmo com os que eles
consideravam “filhos das trevas”. Hoje, o conceito de “próximo” está ferido
pela polarização, de modo que não apenas nos sentimos dispensados de amar quem
pensa diferente de nós, mas nos damos ao direito de até mesmo odiá-lo.
Jesus responde à pergunta sobre o
próximo através da conhecida “parábola do bom samaritano”. A atitude do
sacerdote e do levita, que veem o homem caído e ferido, mas seguem adiante,
pelo outro lado, é a nossa atitude moderna de ver os acontecimentos e dizer que
“não temos tempo, não nos diz respeito, é problema das autoridades, há
instituições encarregadas disso, são preguiçosos” (Pe. Nilo Luza). Além disso,
todo o mundo vive correndo, com pressa. Quem enxerga o outro? Como enxergar
alguém ao nosso lado, se os nossos olhos estão constantemente olhando para a
tela do celular? Nós alegamos não ter tempo para nos envolver com questões
sociais, mas perdemos tempo nos interessando por futilidades nas redes
sociais...
O que Jesus espera de nós, seus
discípulos, é a sensibilidade do samaritano: “Chegou perto dele, viu e sentiu
compaixão. Aproximou-se dele e fez curativos, derramando óleo e vinho nas
feridas” (Lc 10,33-34). Como ficará claro no final da parábola, o samaritano “usou
de misericórdia” para com o homem ferido. Ter atitude de misericórdia, segundo
a concepção bíblica, é amar o próximo. A questão, portanto, não é afetiva, mas
efetiva; não se trata de sentir afeto pela pessoa do outro, mas de deixar-se
afetar pelo seu sofrimento, aproximar-se dele e oferecer a ajuda que está ao
nosso alcance.
Ao colocar o samaritano como modelo de todo discípulo seu, Jesus nos ensina que a principal pergunta a inquietar a nossa consciência e o nosso coração não é: “Quem é o meu próximo?”, mas “De quem estou sendo chamado(a) a me fazer próximo(a), neste momento?”. De quem você precisa se fazer próximo(a) neste momento? Do seu companheiro de trabalho? Da sua vizinha? Do seu cônjuge? Dos seus filhos? Dos seus pais? Dos seus avós? Na sua exortação apostólica “A alegria do amor”, o Papa Francisco afirmou que “a família foi desde sempre o ‘hospital’ mais próximo. Prestemo-nos cuidados, apoiemo-nos e estimulemo-nos mutuamente, e vivamos tudo isto como parte da nossa espiritualidade familiar” (AL, n.322).
Para cuidar daquele homem ferido, o bom
samaritano precisou perder tempo, esquecer-se de si e dos seus afazeres. O
próximo é assim: alguém que me recorda que o mundo não gira em torno de mim,
dos meus problemas, projetos e necessidades. Escutemos a voz de Deus em nossa
consciência e em nosso coração, para sabermos de quem somos chamados a nos
fazer próximos, neste momento da nossa vida. Permitamos que Jesus nos ajude a
enxergar a vida para além das nossas preocupações, dos nossos interesses, vendo
aqueles que estão feridos e caídos à nossa volta e nos fazendo próximos deles.
Deixemos com que o Espírito Santo desperte a força da compaixão dentro de nós,
para que saibamos reagir com misericórdia quando, no caminho da vida, cruzarmos
com alguém que está sofrendo.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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