Missa do 3º dom. Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 5,27b-32.40b-41; Apocalipse 5,11-14; João 21,1-19.
Jesus iniciou sua missão chamando
quatro discípulos: Pedro, André, Tiago e João. Por serem pescadores, estavam na
praia, lavando/consertando as redes, quando Jesus lhes fez o convite: “Sigam-me,
e eu farei de vocês pescadores de homens” (Mt 4,19). Pescar homens significa
resgatar pessoas das situações de destruição e de morte.
O Evangelho de hoje nos surpreende
com a decisão de Pedro e de seis outros discípulos de irem pescar – pescar peixes!
Ao que parece, os discípulos estão desorientados, após a morte e a ressurreição
de Jesus. A desorientação é tão grande que eles voltam ao momento antes de
serem chamados por Jesus; voltam a ser pescadores de peixes!
Como nós estamos em relação à nossa
vida: olhando para a frente ou para trás? Estamos sendo fiéis à tarefa que a
vida nos confiou ou a abandonamos, para regredir e voltar a fazer coisas que
não têm nada a ver com a nossa responsabilidade perante a missão que a vida nos
confiou?
“Eu vou pescar” (Jo 21,3) pode
significar a atitude do cristão de voltar a ser um simples ser humano, que vive
sua vida reduzida ao físico e ao psíquico, sem abertura ao espiritual; uma vida
sem grandes sonhos, sem grandes ideais, reduzida ao sobreviver. E, no entanto,
isso não responde mais ao que o coração humano busca. Pedro e os outros
discípulos não pescam nada! Assim também, quando abandonamos o caminho que
Jesus nos convidou a percorrer com ele, quando fugimos da tarefa à qual ele nos
chamou, nossa vida começa a perder o sentido – nossas redes ficam vazias.
Jesus conhece e respeita nossos
momentos de crise, de desencanto, de perda de sentido e de afastamento da nossa
própria vocação. Propositalmente, ele toca na ferida das nossas redes vazias,
da nossa vida sem sentido: “Vocês têm alguma coisa para comer?” (Jo 21,5). Na
verdade, Jesus quer nos levar a uma reflexão: por que será que não estamos mais
conseguindo alimentar o sentido da nossa vida? Por que será que, apesar dos
nossos esforços em pescar, nossas antigas redes continuam vazias? Não será justamente
porque não é mais ali o nosso lugar? Não será porque não é mais aquela a nossa
tarefa?
Para renovar o convite aos seus
discípulos a voltarem a crer na missão que lhes foi confiada, Jesus lhes
desafia: “Lancem a rede à direita da barca, e vocês acharão” (Jo 21,6). Lançaram,
pois, a rede e não conseguiam puxá-la para fora, por causa da quantidade de
peixes. Então, o discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: “É o Senhor!” (Jo
21,7).
O
discípulo amado reconhece que aquele homem que está na praia falando com eles é
o Senhor ressuscitado! Após a sua ressurreição, ele não abandonou seus
discípulos, não deixou sua Igreja sozinha no mundo. Ele continua a se preocupar
com cada discípulo seu que está perdendo o sentido da sua própria vocação e
missão. Ele já fez isso com os dois discípulos de Emaús (cf. Lc 24,13-35) e com
Tomé (Jo 20,24-29); agora, Jesus deseja devolver convicção e sentido ao coração
de sete discípulos seus que desistiram de resgatar pessoas do mar da destruição
e da morte para, simplesmente, pescar peixes.
O Evangelho centra a atenção em
Pedro. Foi ele quem decidiu ir pescar. Foi ele quem parece ter perdido o
sentido do chamado que recebeu de Jesus. Ele estava nu – desprovido da sua
identidade, desprovido de sentido e de esperança perante sua própria vocação de
pescador de homens. Agora, ao se dar conta de que Jesus Ressuscitado está ali,
próximo deles, na beira da praia, veste sua roupa – símbolo da retomada da sua
identidade de discípulo, de pescador de homens, e mergulha no mar, nadando
rapidamente até chegar ao Senhor Ressuscitado.
Após a refeição com seus discípulos,
Jesus chama Pedro para uma conversa particular. Antes da morte de Jesus na
cruz, Pedro o havia negado três vezes, com medo de também ser preso e condenado
à morte. Agora, por três vezes, o Senhor Ressuscitado lhe pergunta: “Você me
ama?”. Diante da resposta afirmativa de Pedro, Jesus o remete para a sua
verdadeira tarefa/missão: “Apascenta os meus cordeiros” (Jo 21,15); “Apascenta as
minhas ovelhas” (Jo 21,16); “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,16).
Apascentar é cuidar. O sentido da nossa vida não está em nós mesmos, em girar
em torno do nosso ego, mas está em cuidar de algo ou de alguém que nos foi
confiado. Pedro deixou de amar Jesus por medo da cruz. Agora que ele está
diante do Ressuscitado, tomou consciência de que amar realmente machuca e faz
morrer o nosso ego, mas é exatamente aquilo que dá sentido à nossa vida.
Hoje a pergunta “Você me ama?” é
dirigida a cada um de nós. Nós podemos até ter alguma fé em Jesus e ter a
consciência de que necessitamos absolutamente dele, mas quem de nós o ama
verdadeiramente? Até mesmo aqueles que não abandonaram a sua tarefa, a sua
missão pastoral, quantos desses fazem o que fazem por amor, e não por mera
obrigação ou, quem sabe, por simples sobrevivência financeira? Além disso, o nosso
amor por Jesus se verifica no cuidado para com as coisas e as pessoas que ele
confiou aos nossos cuidados. Essa consciência deveria estar presente quando
pensamos em desistir – desistir do matrimônio, da vida consagrada, da própria
vocação, da tarefa que a vida nos confia todos os dias. Se não desistimos não é
porque ainda compensa nos manter onde estamos, mas unicamente por amor ao
Senhor Ressuscitado. Em outras palavras, não cuidamos das ovelhas porque elas
merecem tal cuidado, mas porque Jesus, a quem amamos, nos pede para cuidar.
Uma palavra final – o nosso
envelhecimento. Talvez muitos de nós esperem recompensas e garantias de sucesso
pelo fato de servirmos ao Evangelho. No entanto, Jesus foi muito realista com
Pedro: quando ele envelhecer, “irá para onde não quer ir” (cf. Jo 21,18), ou
seja, morrerá de uma morte que não desejaria morrer. Talvez Jesus peça a alguns
de nós não apenas uma vida oferecida em sacrifício pela salvação daqueles que
ele ama, mas também uma morte sem glória, sem o reconhecimento do mundo, uma
morte anônima ou até mesmo “amaldiçoada” aos olhos humanos. Diante desse
realismo que parece até mesmo duro da parte de Jesus, volta a soar o seu
chamado a cada um de nós: “Segue-me” (Jo 21,29).
Hoje nós supostamente estamos
seguindo Jesus. Não significa que morreremos seguindo-o. Por isso, a cada dia é
preciso ter a coragem de nos colocar diante da sua pergunta: “Você me ama?”. “Você
acredita que eu estou ressuscitado e acompanhando-o(a) também nas suas pescas
fracassadas, nos momentos em que sua vida parece perder o sentido e você
desiste da tarefa que lhe foi confiada?”. “Você me amará quando envelhecer,
quando se tornar para a Igreja e para o mundo uma pessoa insignificante?”. “Você
continuará acreditando que sua vida tem um sentido mesmo quando, devido à
velhice, você não puder fazer quase que mais nada, e só sobreviverá daquilo que
receber dos outros?”.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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