quinta-feira, 28 de novembro de 2013

EXISTE UMA RECOMPENSA PELA DOR DA ESPERA

Missa do 1º. dom. do advento. Palavra de Deus: Isaías 2,1-5; Romanos 13,11-14a.; Mateus 24,37-44.

     Iniciamos hoje o tempo do Advento. Advento significa “esperar por Aquele que vem”. Por isso, neste momento é importante perguntar-se: o que eu espero, em relação à minha vida? Eu espero por algo? O que eu espero de Deus? Espero algo apenas para esta vida presente, ou espero algo em relação à minha vida futura, isto é, em relação à minha salvação?
     O que é a espera? A espera é a certeza do nosso coração de que existe algo mais, e nenhuma realidade presente pode preencher ou substituir esse algo mais que Deus tem para nos dar. Por outro lado, toda espera é sofrida. Mas o Advento nos diz que há uma recompensa para a dor da espera, há uma esperança para o presente de quem se abre para o futuro de Deus. A questão, portanto, é saber: o que você espera? Qual esperança sustenta a sua vida?
     Muitos desistiram de esperar. Muitos se desencantaram com as promessas de Deus, cederam à tentação de abandonar Aquele que estamos esperando, para irem atrás de algo mais concreto, mais imediato. Muitos estão colocando a esperança da porta para fora de sua vida, ao dizerem “cansei de esperar”: cansei de esperar mudanças em mim, em determinada pessoa, numa determinada situação... Cansei de esperar em Deus... Mas aqui nós precisamos lembrar as palavras do Salmo 25,3: “Os que esperam em ti não ficam envergonhados, ficam envergonhados os que por um nada negam sua fé” (Sl 25,3).
     Apesar do nosso cansaço e de todos os motivos que teríamos para abandonar a esperança, Jesus nos convida a esperar por sua vinda. Mas Ele nos alerta que ela se dará como o dilúvio se deu no tempo de Noé. Nada de extraordinário aconteceu; todos estavam vivendo seu dia a dia absorvidos em suas próprias preocupações. “Eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e arrastou a todos...” (Mt 24,39). Não é esse também o retrato da nossa geração? Cada um absorvido no seu próprio mundo, lidando com seus próprios problemas; cada um olhando para a tela do seu celular, do seu tablet, do seu computador, cada um perdido dentro de si mesmo, sem se dar conta do que está acontecendo no mundo à sua volta?  
     É para todos nós que Paulo dirige seu apelo, neste início de Advento: “Já é hora de despertar...” (Rm 13,11). Já é hora de deixarmos de viver dopados, anestesiados, hipnotizados com a tecnologia que cada vez mais nos mergulha no mundo virtual e nos torna ausentes do mundo real. Precisamos ter um comportamento de pessoas destinadas para o encontro com o seu Senhor e Salvador. Tudo aquilo que fizermos – o nosso comer e beber, o nosso trabalhar e descansar, o nosso prazer e distração, o nosso conectar-se ao virtual e ao real – tudo isso seja vivido para glorificar a Deus (cf. 1Cor 10,31) e não para nos afastar de Deus.
     Assim como o dilúvio arrastou a todos, assim a vinda de Jesus diz respeito a todos. Nela, “um será levado e o outro será deixado” (Mt 24,40). “Ser levado” significa ser salvo; “ser deixado” significa perder-se. Portanto, Jesus nos diz: “Ficai atentos, porque não sabeis em que dia virá o Senhor... Ficai preparados! Porque, na hora em que menos pensais, o Filho do Homem virá” (Mt 24,42.44). Estar preparado significa viver com o coração voltado para Deus; significa viver na consciência de que, na hora em que menos imaginarmos, seremos convidados a deixar o provisório e abraçar o definitivo. Então, o encontro com o Senhor Jesus será a recompensa pela dor da espera que sofremos.
     A melhor forma de nos prepararmos para o encontro com o Senhor é permitir que a sua Palavra oriente nosso proceder na vida pública e privada, em casa e no trabalho, em relação àquilo que pensamos, sentimos e fazemos. Quando isso acontece, as nossas espadas e lanças – nossas atitudes que ferem, que prejudicam os outros, que causam injustiça e sofrimento em nossa sociedade – são transformadas em arados e foices – em atitudes que promovem a vida por meio da solidariedade, da compaixão, do perdão e da reconciliação (cf. Is 2,4). Quando vivemos nossa vida na espera do encontro com o Senhor, nos damos conta de que não tem mais sentido vivermos armados e fazendo guerra contra tantas pessoas à nossa volta. A nossa verdadeira arma deve ser a fé, assim como a nossa verdadeira guerra consiste em perseverar e não desistir de esperar pelo Senhor.
     Enfim, o tempo do Advento nos faz este convite: “Vinde... deixemo-nos guiar pela luz do Senhor” (Is 2,5). Deixemos com que a luz do Senhor nos mostre um outro horizonte para a nossa vida, e encha o nosso coração de alegria, assim como o coração do vigia se enche de alegria quando chega a aurora de um novo dia. Mas não apenas deixemo-nos guiar pela luz do Senhor; sejamos também portadores dessa luz. Por meio da Novena de Natal – e também das redes sociais – levemos essa luz do Senhor, e a luz que é o próprio Senhor, a tantas casas/famílias/ambientes de trabalho/pessoas que precisam ter sua guerra transformada em paz, seu ressentimento transformado em perdão, seu distanciamento transformado em comunhão, sua tristeza transformada em alegria, seu desespero transformado em esperança. 

                                                                                                                                                             Pe. Paulo Cezar Mazzi
             

     

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A PORTA DA REDENÇÃO ESTÁ ABERTA

 Missa de Cristo Rei. Palavra de Deus: 2Samuel 5,1-3; Colossenses 1,12-20; Lucas 23,35-43.
      
       Considere essas expressões: “reina o caos”, “reina a violência”, “reina a discórdia”, “reina a corrupção”; na vida de tal pessoa “reina a droga”; no ambiente de tal empresa, “reina a divisão, a inimizade”; na vida de muitas famílias “reina a discussão, as brigas, a separação”; no coração de tal pessoa “reina o ódio, a maldade, a infidelidade”... Quem “reina” em nosso mundo: Deus ou o maligno? Quem “reina” dentro de você: a paz ou a guerra, a verdade ou a mentira, a luz ou as trevas, o bem ou o mal?
       A leitura do segundo livro de Samuel nos fala do momento em que o rei Davi é ungido rei para governar todas as tribos de Israel. Sob o reinado de Davi, Israel, que antes estava dividido em tribos do norte e tribos do sul, agora se torna um povo unificado. Ora, a função do rei Davi era recordar Israel que somente Deus é o seu Rei; somente Deus deve reinar sobre o seu povo. Para nós, isso significa que quando permitimos que Deus reine sobre nós, quando decidimos viver sob o senhorio, sob a autoridade de Deus, nós somos unificados; já não somos mais “joguetes” nas mãos das nossas divisões internas.
        Para um mundo como o nosso, onde reina tanta maldade, onde o sofrimento reina na vida de tantas pessoas, onde tantos são dominados pelo mal e escravizados por diversos tipos de vícios, o apóstolo Paulo proclama que o Pai nos libertou do poder das trevas e nos recebeu no reino de seu Filho amado, por quem temos a redenção, o perdão dos pecados (cf. Cl 1,12-13). Portanto, dentro da nossa liberdade, se trata de escolher quem ou o quê queremos que seja o “senhor” da nossa vida; quem ou o quê queremos que “reine” sobre nós.
     Conta-se que em uma terra em guerra, havia um rei que causava espanto. Sempre que fazia prisioneiros, não os matava. Levava-os para uma sala onde havia um grupo de arqueiros de um lado e uma enorme porta de ferro do outro, sobre a qual se via gravadas figuras de caveiras cobertas por sangue. Nesta sala ele dizia-lhes:”Vocês podem escolher entre morrerem flechados, ou passar por aquela porta”. E todos escolhiam serem mortos pelos arqueiros.
       Ao terminar a guerra, um soldado que, por muito tempo servira o rei, dirigiu-se ao soberano e disse: “Senhor, posso lhe fazer uma pergunta?” O rei respondeu: “Diga, soldado”. Então o soldado perguntou inseguro: “O que havia por detrás da assustadora porta?” O rei, confiante, disse: “Vá e veja você mesmo!” O soldado então abriu vagarosamente a porta... e descobriu, surpreso, que a porta se abria sobre um caminho que conduzia para fora do castelo, rumo à liberdade. O soldado, admirado, apenas olhou para seu rei, que disse: “Eu dava a eles a escolha, mas preferiram morrer a arriscar-se a abrir esta porta”.
          Em seu Filho Jesus, o Pai nos dá a possibilidade de abrir a porta que nos tira da escravidão, das guerras internas e externas em que vivemos, mas muitos ainda têm medo dessa liberdade e preferem viver sob o domínio de pessoas, de atitudes e de coisas que são maléficas, destrutivas...   
        Para nós, hoje, proclamar que Jesus Cristo é o Rei do Universo significa crer que o Pai confiou ao seu Filho o poder de libertar, de redimir e de salvar todo ser humano (cf. Jo 17,2), e este poder se revela justamente na cruz! Na cruz, um homem já condenado à morte reconheceu Jesus como Rei, ao lhe pedir: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado” (Lc 23,42). Para este homem condenado, a porta da libertação e da salvação se abriu exatamente ali, quando Jesus, então, lhe disse: “Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23,43).
       Por mais que você se condene e se prenda a atitudes erradas, por mais que se sinta condenada(o) e preso(a) a algum tipo de domínio maléfico e destrutivo, “hoje” é o momento de você se colocar sob o poder redentor de Jesus Cristo e da sua cruz, e permitir que o Paraíso comece a reinar dentro de você. “Hoje” é o momento para que Jesus comece a reinar em nós, em nossas famílias e comunidades, em nosso ambiente de trabalho, no coração da humanidade...
      Reina o Senhor! Toda a terra verá. Ele voltará com glória, força e poder. Povos e nações, todos afluirão ao ouvirem o som dos anjos anunciando, e então diante do Rei dos reis tremerão. Glória e majestade ao Rei, Cristo Jesus, Cordeiro Santo, Raiz de Davi, que amou o mundo e abriu as portas do céu a todo aquele que Ele redimir. Renda-se! Ainda há tempo de retornar. Renda-se! Vida nova receberá. Renda-se! Abandone-se sem reservas!... Renda-se! O Senhor disse e cumprirá. Renda-se! Toda lágrima enxugará. Renda-se Àquele que era, que é e que há de vir! (Renda-se, Ministério Adoração e Vida). 
                                                                      
                                                                       Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

RECONSTRUIR SOBRE BASES VERDADEIRAS E JUSTAS

Missa do 33º. dom. comum. Malaquias 3,19-20a.; 2Tessalonicenses 3,7-12; Lucas 21,5-19.

            “Vós admirais estas coisas? Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído” (Lc 21,6). Era um casal admirável, perfeito, vivendo um relacionamento à prova de fogo, ao menos aparentemente. Para surpresa de todos, o casal se separou. Era um império invejável, uma empresa de grande sucesso, crescendo e se expandindo cada vez mais. De repente, o império desabou, a empresa faliu, ou está correndo o risco de falir. Era uma igreja repleta de fiéis, construindo “megatemplos” nas grandes capitais. Agora, é uma igreja reduzida a algumas centenas de pessoas, tentando sobreviver enquanto instituição. Era um corpo exibindo beleza, músculos e saúde para todo mundo ver. Agora é um corpo que definha numa cama, ou consumido pelos vermes debaixo da terra.
           Quantas “construções” que antes nós admirávamos, mas agora são apenas escombros, ruínas? Quantas pessoas eram para nós a imagem do sucesso e hoje são a imagem do fracasso? Esta é a verdade: pessoas caem, impérios desabam, fortalezas desmoronam. E por que tudo isso? Porque os muros das nossas falsas seguranças precisam cair. Porque as paredes que construímos para nos separar das pessoas, e também para nos separar de Deus e da nossa própria verdade, precisam ser derrubadas.
            Ao longo deste ano, talvez você tenha conseguido construir muitas ou algumas coisas. Mas Jesus nos faz um alerta: tudo aquilo que neste mundo está sendo construído tendo por base a injustiça, a ganância, a indiferença para com quem sofre, cairá, e não ficará pedra sobre pedra. Tudo aquilo que você constrói tendo por base a mentira, a desonestidade, o egoísmo, será destruído. Em outras palavras, não se trata da destruição de edifícios, de palácios e de casas de luxo, mas da destruição da vaidade, do orgulho, da soberba.
            O profeta Malaquias fala da vinda de Deus como um fogo que consumirá os soberbos e os ímpios – os que cometem injustiça, como se fossem palha. Daquilo que essas pessoas construíram e se orgulharam, não sobrará nem raiz, nem ramo. Porém, esse fogo de Deus trará justiça e salvação para os que construíram sua vida tendo por base o respeito ao Senhor e ao seu semelhante (cf. Ml 3,19-20a).   
            Na Sagrada Escritura, o fogo representa o julgamento de Deus. O salmo que meditamos hoje diz: “O Senhor fez conhecer sua vitória, revelou sua justiça aos olhos das nações... Ele vem para julgar a terra inteira: ele julgará o mundo com justiça e os povos com retidão!” (Sl 98,2.9). Nós temos medo desse fogo de Deus, mas ele nada mais é do que a verdade, um fogo que consumirá nossas mentiras, queimará nossas máscaras e nos confrontará com a verdade que nos liberta.
            Há sinais deste fogo da justiça e da verdade de Deus agindo no meio da humanidade. Há sinais de que este mundo construído na base da mentira e da injustiça vai ter um fim. O primeiro sinal são os falsos profetas, em relação aos quais Jesus alerta: “Não sigais essa gente” (Lc 21,8). O segundo sinal são as guerras e as revoluções, a respeito das quais Jesus afirma: “É preciso que estas coisas aconteçam, mas não será logo o fim” (Lc 21,9). O terceiro sinal são as forças destrutivas da natureza (cf. Lc 21,11). Tivemos um exemplo disso há dias atrás, nas Filipinas. Em meio a tudo isso, haverá perseguições por causa da fé, e Jesus diz: “Esta será a ocasião em que testemunhareis a vossa fé” (Lc 21,13).
          Os tempos em que vivemos são tempos difíceis. Você reconhece isso? Você percebe os apelos de Deus nos acontecimentos atuais? Você tem procurado construir sua vida sobre uma base verdadeira, sobre a base da fé, ou tem agido como alguns tessalonicenses, vivendo à toa, muito ocupado em não fazer nada (cf. 2Ts 3,11), nem por sua própria salvação, nem pela salvação dos outros?
             Há um fogo que se alastra aos poucos no meio de nós e que precisa nos conduzir para a verdade. Há um terremoto que precisa nos sacudir, nos acordar, nos desacomodar. Há dores de parto que precisam ser suportadas, se queremos que algo novo possa nascer em nós. Diante de tudo isso, duas coisas são necessárias: confiança e atitude. Confiança em Deus, porque Jesus diz: “Vós não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça” (Lc 21,18). Atitude da nossa parte, porque Jesus afirma: “É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida” (Lc 21,19).
                                                        Pe. Paulo Cezar Mazzi

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

RESSURREIÇÃO: VIDA ABERTA PARA O FUTURO DE DEUS

Missa do 32º. dom. comum. Palavra de Deus: 2Macabeus 7,1-2.9-14; 2Tessalonicenses 2,16–3,5; Lucas 20,27-38.

Alguns lutam pela vida, enquanto outros “jogam fora” a própria vida. Alguns morrem depois de ter vivido “intensamente” a sua vida, enquanto outros morrem como se nunca tivessem vivido. Alguns se agarram desesperadamente a esta vida por não acreditarem na ressurreição e na vida eterna, enquanto outros são capazes de sofrer injustiças nesta vida porque esperam de Deus a ressurreição para a vida eterna, como os irmãos Macabeus.
  A fé na ressurreição surgiu como consequência da fé no Deus que, como Jesus acabou de afirmar, “não é Deus dos mortos, mas dos vivos, pois todos vivem para ele” (Lc 20,38). Foi apoiando-se nesta fé que Abraão conseguiu suportar a prova de oferecer seu filho único a Deus, crendo que o mesmo Deus tem o poder de ressuscitar os mortos. “Por isso, recuperou seu filho, como um símbolo” (Hb 11,19). Assim como Abraão, quando você crê na ressurreição, torna-se capaz de suportar as contrariedades desta vida; torna-se capaz de sacrificar suas certezas humanas, porque entrega sua vida ao Deus que tem o poder de ressuscitar os mortos. É exatamente essa entrega que faz com que você recupere aquilo que no momento precisa sacrificar.
      Quando você crê na ressurreição, confia que em Deus tudo aquilo que você perdeu será recuperado e transformado. Quando você crê na ressurreição, se torna capaz de esperar pelo Senhor Jesus, “que transfigurará nosso corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo glorioso” (Fl 3,21). Quando você crê na ressurreição, confia no poder que o Espírito Santo tem de dar vida ao seu corpo mortal (cf. Rm 8,11). Enfim, pelo fato de você crer na ressurreição, pode dizer como o salmista: “Até o meu corpo repousará na esperança, porque não abandonarás minha vida no sepulcro (...). Deste-me a conhecer os caminhos da vida; tu me encherás de júbilo na tua presença” (Sl 16,8-11; At 2,26-28). 
         A fé na ressurreição enche o seu coração da certeza de que nenhuma pergunta sua ficará sem resposta, nenhuma dor ficará sem consolo, nenhuma ferida ficará sem ser curada e nenhuma lágrima ficará sem ser enxugada. A fé na ressurreição é a certeza de que a justiça que você nem sempre encontra neste mundo, encontra seguramente em Deus, pois Jesus afirma que todos ressuscitarão: “os que tiverem feito o bem, para uma ressurreição de vida; os que tiverem praticado o mal, para uma ressurreição de julgamento” (Jo 5,29).
           A maneira como nós cremos na vida após a morte influencia a nossa maneira de interpretar e viver a nossa vida presente. Quando você na reencarnação, sua vida presente é sempre um “olhar para trás”, como se tudo o que acontecesse com você fosse em função de um passado não resolvido, de uma dívida não paga. Porém, quando você crê na ressurreição, sua vida presente é sempre um “olhar para a frente”, pois “não existe mais condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus” (Rm 8,1), uma vez que “ele nos perdoou todas as nossas faltas: apagou (...) o título de dívida que existia contra nós; e o suprimiu, pregando-o na cruz” (Cl 2,13-14). 
        A fé na ressurreição convida você a se lembrar de que “agora é o começo do resto da sua vida” (Provérbio), uma vida que é única e que nunca mais se repetirá, pois “é fato que os homens devem morrer uma só vez, depois do que vem um julgamento” (Hb 9,27). A fé na ressurreição ajuda você a compreender a vida eterna não como uma conquista sua, ou como fruto dos seus méritos, mas como graça de Deus: “Pela graça sois salvos, por meio da fé, e isso não vem de vós, é o dom de Deus” (Ef 2,8).
        A ressurreição não vem de nós mesmos, mas é dom de Deus, e este dom é o centro da nossa fé cristã: “A mensagem central do cristianismo é: não há morte em que já não esteja presente o começo de uma nova vida. Não há cruz que não seja seguida da ressurreição. Não há escuridão em que já não brilhe a luz pascal, nenhuma dor em que somos deixados sozinhos” (Anselm Grün). 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A MARCA DO DEUS VIVO

Missa de todos os Santos. Palavra de Deus: Apocalipse 7,2-4.9-14; 1João 3,1-3; Mateus 5,1-12a.

Você tem um ideal na vida? O ideal funciona como “uma força que nos puxa para cima”, ou que nos “empurra para frente”, nos ajudando a superar os obstáculos que encontramos no caminho. Alguns têm como ideal serem o melhor numa determinada profissão. Outros têm como ideal tornarem-se ricos, pessoas de sucesso. Alguns poucos têm como ideal trabalharem pela humanidade, tornarem o mundo um lugar melhor. Mas também é verdade que não são poucas as pessoas que abriram mão dos seus ideais, desacreditaram que a sua própria vida ou que o mundo em que vivem poderia se tornar melhor. Desistindo dos seus ideais, elas se jogaram no rio da vida como uma folha seca, e se deixaram levar pela água.
         Embora cada um de nós possa ter o seu ideal de vida, o nosso ideal como cristãos e como filhos de Deus é a santidade, e ser santo, sobretudo no mundo de hoje, significa ir contra a corrente: “O cristão não pode ser uma folha que se joga em um rio e se deixa levar pela água. É preciso nadar contra a corrente” (Pe. Léo). Ser santo significa não se permitir ser arrastado pelo fluxo do mundo, pelas tendências atuais da moda, da onda do momento, mas deixar-se conduzir pelo Espírito Santo de Deus, ainda que o Espírito Santo nos obrigue a andar na contramão, a nadar contra a corrente.
Muitos dirão que é impossível tornar-se santo no mundo em que vivemos. No entanto, o livro do Apocalipse afirma que o início da nossa santificação se dá na terra, não no céu. É enquanto estão na terra que os servos de Deus são “marcados na fronte” (Ap 7,3). Os santos são pessoas que aparentemente não se diferenciam das demais, mas elas trazem em si “a marca do Deus vivo” (Ap 7,2). Hoje tem se tornado cada vez mais comum as pessoas se tatuarem. Você se deixa marcar pela santidade do Deus vivo? As pessoas enxergam em você – especificamente, nas suas atitudes – a marca da santidade de Deus?
No céu, as pessoas santas são descritas como pessoas que estão de pé, diante do trono de Deus e de seu Filho, o Cordeiro, e trajam roupas brancas (cf. Ap 7,9). Mas as roupas brancas delas não significam que viveram na terra em palácios, em redomas de vidro, protegidas contra as “sujeiras”, as misérias e as dores do mundo. Pelo contrário, enquanto estavam na terra, essas pessoas tiveram que lidar com diversas tribulações, como o sofrimento, a dor, a maldade, a corrupção, a violência, a injustiça que há no mundo. Assim como Jesus, elas se “sujaram”, se envolveram com a miséria humana, mas, no momento da morte, “lavaram e alvejaram suas roupas no sangue do Cordeiro” (Ap 7,14).
         O livro do Apocalipse deixa claro que não há santificação sem tribulação. Qual é a sua tribulação, neste momento? Ela é fruto do seu afastamento de Deus, ou da sua fidelidade à vontade de Deus? Ela é fruto da sua decisão de soltar-se como uma folha e deixar-se levar pelo rio do mundo, ou é fruto da sua decisão de nadar contra a corrente e deixar-se conduzir pelo Espírito Santo? Quando a tribulação é consequência da nossa decisão em caminhar segundo a vontade de Deus, é possível ser feliz mesmo na tribulação.  
       Jesus deixa claro no Evangelho que sem santidade não há felicidade. Para o nosso mundo, a felicidade depende do consumo (o que você come, bebe, veste, possui); ela depende da beleza, do triunfo, do dinheiro, do sucesso. No entanto, o alemão Vettel, ao conquistar o tetra campeonato mundial de fórmula 1 na Índia, disse: “Assim que cruzei a linha de chegada me deu um vazio”. A felicidade que o mundo nos promete, além de exigir a eliminação de toda e qualquer tribulação, dura tanto quanto o efeito de uma droga: passado o efeito, o vazio que sentíamos antes se torna maior ainda...
Ao mencionar as bem-aventuranças no Evangelho, Jesus revela que a felicidade que vem de Deus transcende este mundo; ela não se resume ao aqui e agora. A felicidade nasce da coerência com o nosso caminho de santidade, um caminho que passa pela pobreza em espírito, o que significa ter a Deus como nosso único e verdadeiro bem; pelo lidar com a aflição, com a fome e a sede de justiça, e com a perseguição por causa do Evangelho; pela atitude de misericórdia, de mansidão e de promoção da paz diante dos conflitos; enfim, pela pureza de coração, pureza que significa rejeitar o que não convém à nossa santidade e abraçar o que convém a ela.
Retomemos o nosso ideal de santidade, espelhando-nos em todos os santos que, passando por inúmeras tribulações, aprenderam a suportá-las, nadando contra a corrente e deixando-se conduzir pelo Espírito Santo de Deus. 

                                                               Pe. Paulo Cezar Mazzi

MEU REDENTOR ESTÁ VIVO!

Missa de finados. Palavra de Deus: Jó 19,1.23-27a; Filipenses 3,20-21; João 11,17-27.

Existem muitas coisas que diferenciam as pessoas: a cor da pele, o país onde nasceram, a condição econômica, o tipo de educação, o tipo de família, a crença – um se declara desta igreja, outro daquela; um se declara desta religião, outro daquela, um de diz ateu, outro agnóstico etc. Apesar de tudo aquilo que nos diferencia uns dos outros, a morte nos iguala a todos, a morte atinge a todos.
Sabemos que todos nós um dia morreremos. Mas a nossa fé nos faz saber algo mais: “Eu sei que o meu redentor está vivo e que, por último, se levantará sobre o pó; e depois que tiverem destruído esta minha pele, na minha carne, verei a Deus” (Jó 19,25-26). A nossa fé nos permite dizer que temos um Redentor. “É ele quem redime da cova a tua vida” (Sl 103,4). Ter um Redentor significa que temos Alguém que nos tira da morte, Alguém que um dia nos fez uma promessa: “Eis que eu vou abrir os vossos túmulos e vos fazer subir dos vossos túmulos, ó meu povo. Então sabereis que eu sou o Senhor... Porei o meu espírito dentro de vós e haveis de reviver” (Ez 37,12-14).
Cada um de nós pode dizer como Jó: ‘O meu Redentor, Aquele que redime a minha vida da cova da morte, Aquele que me resgata, está vivo. Ele venceu a morte. Por último, depois de tudo, Ele se levantará sobre o pó da minha miséria, da minha mortalidade. Depois que a doença ou o próprio envelhecimento tiver destruído a minha pele, na minha carne, no meu corpo mortal, verei a Deus. O que me espera é o encontro com o Pai; eu O verei face a face’.
O destino último da nossa vida são as mãos do Pai, e não o pó da terra. Foi por isso que o próprio Jesus morreu dizendo: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23,46). Quem, diariamente se coloca nas mãos do Pai, não teme a morte, e pode dizer como o salmista: “O Senhor é minha luz e salvação: de quem terei medo?” (Sl 27,1). A luz de Deus nos permite contemplar, no grão de trigo que morre na terra, a espiga que vai brotar (cf. Jo 12,24). Mesmo carregando em nosso corpo os sinais da morte que um dia nos atingirá, podemos dizer: “Sei que a bondade do Senhor eu hei de ver na terra dos vivos. Espera no Senhor e tem coragem. Espera no Senhor!” (Sl 27,13-14).
Mais do que despertar em nós a consciência da morte, a Palavra do Senhor quer nos lembrar que somos cidadãos do céu; portanto, nós pertencemos ao céu. “De lá aguardamos o nosso Salvador, o Senhor Jesus Cristo. Ele transformará o nosso corpo humilhado e o tornará semelhante ao seu corpo glorioso” (Fl 3,20-21). A ressurreição não é apenas uma verdade para a nossa alma, mas também para o nosso corpo. Este corpo sujeito à morte, chamado de “corpo humilhado”, será transformado pelo Senhor Jesus Cristo, em “corpo glorificado”. É por isso que, quando professamos a nossa fé, dizemos: “creio na ressurreição da carne e na vida eterna”  
Por mais que nós lutemos pela vida, chega um momento em que a morte sempre parece se impor, pondo fim a muitos dos nossos sonhos, a muitas das nossas esperanças. Assim aconteceu com a família de Marta, Maria e Lázaro. Quando Jesus chegou em Betânia, encontrou Lázaro sepultado há quatro dias. Se o profeta Oséias disse que “no terceiro dia” Deus faria o seu povo reviver (cf. Os 6,2), passado o terceiro dia, não há nada mais a esperar. O quarto dia é a imagem da total falta de esperança: nada mais pode ser feito. O que morreu, morreu definitivamente. Será?
As palavras de Marta a Jesus – “Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido” (Jo 11,21) – também estão presentes em nossa vida, em nossos questionamentos. Nós costumamos pensar que se Deus está presente em nossa vida, o mal não nos atingirá jamais. No entanto, Jesus, sabendo da doença de Lázaro, permitiu que ele morresse, para nos lembrar que a sua presença em nossa vida não é para nos poupar de todo e qualquer tipo de mal, nem para nos impedir que um dia nós morramos, mas para nos garantir que a morte não é o nosso fim, mas uma porta estreita, pela qual temos que passar, para chegarmos à verdadeira vida.
“Teu irmão ressuscitará” (Jo 11,23). Hoje, ao visitar cada túmulo ou nos lembrar de todos os nossos parentes e amigos que faleceram, precisamos ter em nosso coração as palavras de Jesus: ‘Teu filho ressuscitará... Teu pai ressuscitará... Tua mãe ressuscitará...’ “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá” (Jo 11,25). Cremos em Jesus e no poder da sua Ressurreição? A nossa fé no Senhor Jesus, nossa Ressurreição e nossa Vida, se mostra não apenas na maneira como encaramos a morte – a nossa e a dos outros – mas também na maneira como vivemos a nossa vida...           

Pe. Paulo Cezar Mazzi