Vigília Pascal.
Gênesis 1,1.26-31a; Êxodo 14,15-15,1; Isaías 54,5-14; Romanos 6,3-11; Mateus
28,1-10
Na
noite de quinta-feira santa, nós começamos a fazer a nossa Páscoa, juntamente
com Jesus. Aquela noite nos lembrava que somos um povo pascal. Somos pessoas
pascais não somente porque, como Jesus, chegará o momento de nós passarmos
deste mundo para o Pai, mas, sobretudo, porque o nosso Deus é a Aquele que nos
faz passar, que nos faz atravessar as noites escuras na direção da aurora de um
novo dia. Na verdade, há passagens em nossa vida que só podem ser feitas se Deus
abrir o caminho, a estrada, se Ele nos fizer passar.
Toda Páscoa é um processo; toda
passagem difícil, lenta e exige de nós firmeza, constância, perseverança em
nosso propósito de passar, de atravessar. No meio do processo da páscoa dos
hebreus, Deus disse a Moisés: “Por que clamas a mim por socorro? Dize aos filhos
de Israel que se ponham em marcha” (Ex 14,15). Diante das situações difíceis,
onde costumamos nos entregar ao desânimo e ao pessimismo, Deus nos convida a
nos levantar, a retomar a marcha, a continuar a travessia iniciada, deixando para
trás o Egito da nossa aflição e caminhando com Ele na direção da Sua promessa
de uma vida nova.
Ao longo da nossa existência, Deus
nos convida a fazer muitas travessias, e nelas Ele se coloca sempre junto a
nós. A presença de Deus junto a Israel podia ser vista numa nuvem, escura e tenebrosa
para os egípcios, mas iluminadora e consoladora para os israelitas. Sempre que nós
nos dispomos a fazer a travessia de uma situação de morte para uma situação de
vida, sofremos “perseguições”: lembranças, pensamentos, fantasias e sentimentos
vão nos provocar medo, ameaça, tentando nos convencer de que não dará certo, de
que a travessia não vai funcionar. Não devemos prestar atenção a essa nuvem
tenebrosa que está atrás de nós, como um passado que não quer perder o domínio
sobre nós. Devemos manter nosso olhar na nuvem luminosa, que é o próprio Deus a
nos dizer: “Dê mais um passo, eu ajudo você a atravessar. Eu caminho à sua
frente. Eu farei você passar!”.
Mas o futuro se mostra incerto e aparentemente
impossível de ser alcançado! Há um mar de obstáculos à nossa frente! Se não
queremos desanimar e desistir da travessia, precisamos nos lembrar de que, quanto
maior o obstáculo, mais se mostra Deus vivo e verdadeiro em nossa vida. Devemos
confiar! Se Ele nos convidou a fazer a passagem da escravidão para a liberdade,
da morte para a vida, também abrirá o caminho, removerá o obstáculo, e nos fará
passar! O nosso Deus nunca começa uma obra e depois a abandona pelo caminho. Ele
completará a obra que começou em cada um de nós!
É
certo que nenhum de nós passou pelas águas do Mar Vermelho! Mas, nesta vigília
pascal, o apóstolo Paulo nos recorda que todos nós passamos pelas águas do Batismo.
Para a maioria de nós, isso aconteceu quando éramos crianças, para nos lembrar
que a salvação que o Batismo nos dá é graça de Deus e não mérito nosso. O
apóstolo afirma que nós fomos batizados (mergulhados) na morte de Cristo. Isso
significa que somos chamados a fazer um exercício diário de morrer para toda
situação de pecado. Nossa tarefa diária consiste em morrer para o pecado e
viver para Deus, imitando Jesus Cristo em sua obediência ao Pai. O Batismo nos
identificou a Jesus Cristo por uma morte semelhante à sua, para nos
assemelhar-mos a Ele também na sua ressurreição. Esta será a etapa final da
nossa Páscoa!
É
por isso que nesta noite de vigília o Evangelho nos transporta para “depois do
sábado”. Depois do grande silêncio de Deus, da Sua aparente indiferença para
com o sofrimento de todos os crucificados do nosso tempo, tem início uma nova semana.
Mas nós nos perguntamos: Como recomeçar a vida depois que a morte sepultou
consigo as nossas esperanças?
As duas mulheres vão ver o sepulcro
são surpreendidas por um grande tremor de terra. Quantos tremores de terra nos
surpreenderam neste ano? Toda essa situação de pandemia, provocando inúmeras
mortes em todo o mundo, trazendo tristeza para muitas famílias, uma sensação de
ameaça para todos nós, um cansaço profundo para os profissionais da saúde, um
verdadeiro terremoto para a economia de todos os países afetados pela
pandemia... Como falar de ressurreição diante desses “tremores de terra” que
abalaram e estão abalando a fé de muitas pessoas?
Mas o forte tremor de terra que as
mulheres ouviram foi o sinal claro da intervenção de Deus na morte de Jesus: o
anjo do Senhor desceu e retirou a pedra que lacrava o sepulcro, não para que
Jesus saísse, e sim para que as mulheres pudessem entrar e constatar que Ele
não estava ali, pois havia ressuscitado: “Sei que procurais Jesus, que foi
crucificado. Ele não está aqui! Ressuscitou, como havia dito! Vinde ver o lugar
em que ele estava” (Mt 28,5-6).
Na maioria das vezes, nós
interpretamos os tremores de terra como experiências onde somos soterrados,
onde grandes pedras caem sobre nós e esmagam nossos sonhos, sepultando nossas
esperanças. Mas quando o nosso Deus permite que o chão da nossa vida se abale
não é para nos fazer sentir medo. Pelo contrário. Tanto o anjo do Senhor quanto
o próprio Jesus ressuscitado disseram às mulheres: “Não tenham medo!” Deus só
permite os “tremores de terra” quando eles nos ajudam a despertar do sono da
morte, quando eles quebram aquilo que se endureceu dentro de nós, quando eles
arrebentam as grandes pedras que nós mesmos colocamos ou permitimos que os
outros colocassem na entrada da nossa própria sepultura, onde permanecemos
enterrados junto com os nossos medos.
Nesta vigília pascal o Senhor
Ressuscitado vem ao encontro de cada um de nós, como foi ao encontro das
mulheres, e nos diz: “Alegrai-vos! Não tenhais medo!” A morte vai continuar a
existir, mas ela não tem mais poder sobre nós. Ela pode apenas ferir o nosso
corpo, mas não pode matar a nossa fé, a nossa esperança e o nosso amor. Diante
de todos os tremores que possam acontecer na história da humanidade, nós
prosseguimos confiantes em nossa travessia, em nosso seguimento de Jesus
Cristo, morto e ressuscitado, levando em nosso coração a Palavra do seu Deus e
nosso Deus, do seu Pai e nosso Pai: “Podem os montes recuar e as colinas
abalar-se, mas minha misericórdia não se apartará de ti, nada fará mudar a
aliança de minha paz, diz o teu misericordioso Senhor” (Is 54,10).
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
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