sexta-feira, 10 de abril de 2020

DIANTE DOS ABALOS, UMA CERTEZA PERMANECE INABALÁVEL: A MISERICÓRDIA DO SENHOR NÃO SE AFASTARÁ DE NÓS!


Vigília Pascal. Gênesis 1,1.26-31a; Êxodo 14,15-15,1; Isaías 54,5-14; Romanos 6,3-11; Mateus 28,1-10

Na noite de quinta-feira santa, nós começamos a fazer a nossa Páscoa, juntamente com Jesus. Aquela noite nos lembrava que somos um povo pascal. Somos pessoas pascais não somente porque, como Jesus, chegará o momento de nós passarmos deste mundo para o Pai, mas, sobretudo, porque o nosso Deus é a Aquele que nos faz passar, que nos faz atravessar as noites escuras na direção da aurora de um novo dia. Na verdade, há passagens em nossa vida que só podem ser feitas se Deus abrir o caminho, a estrada, se Ele nos fizer passar.
            Toda Páscoa é um processo; toda passagem difícil, lenta e exige de nós firmeza, constância, perseverança em nosso propósito de passar, de atravessar. No meio do processo da páscoa dos hebreus, Deus disse a Moisés: “Por que clamas a mim por socorro? Dize aos filhos de Israel que se ponham em marcha” (Ex 14,15). Diante das situações difíceis, onde costumamos nos entregar ao desânimo e ao pessimismo, Deus nos convida a nos levantar, a retomar a marcha, a continuar a travessia iniciada, deixando para trás o Egito da nossa aflição e caminhando com Ele na direção da Sua promessa de uma vida nova.
            Ao longo da nossa existência, Deus nos convida a fazer muitas travessias, e nelas Ele se coloca sempre junto a nós. A presença de Deus junto a Israel podia ser vista numa nuvem, escura e tenebrosa para os egípcios, mas iluminadora e consoladora para os israelitas. Sempre que nós nos dispomos a fazer a travessia de uma situação de morte para uma situação de vida, sofremos “perseguições”: lembranças, pensamentos, fantasias e sentimentos vão nos provocar medo, ameaça, tentando nos convencer de que não dará certo, de que a travessia não vai funcionar. Não devemos prestar atenção a essa nuvem tenebrosa que está atrás de nós, como um passado que não quer perder o domínio sobre nós. Devemos manter nosso olhar na nuvem luminosa, que é o próprio Deus a nos dizer: “Dê mais um passo, eu ajudo você a atravessar. Eu caminho à sua frente. Eu farei você passar!”.
            Mas o futuro se mostra incerto e aparentemente impossível de ser alcançado! Há um mar de obstáculos à nossa frente! Se não queremos desanimar e desistir da travessia, precisamos nos lembrar de que, quanto maior o obstáculo, mais se mostra Deus vivo e verdadeiro em nossa vida. Devemos confiar! Se Ele nos convidou a fazer a passagem da escravidão para a liberdade, da morte para a vida, também abrirá o caminho, removerá o obstáculo, e nos fará passar! O nosso Deus nunca começa uma obra e depois a abandona pelo caminho. Ele completará a obra que começou em cada um de nós!
É certo que nenhum de nós passou pelas águas do Mar Vermelho! Mas, nesta vigília pascal, o apóstolo Paulo nos recorda que todos nós passamos pelas águas do Batismo. Para a maioria de nós, isso aconteceu quando éramos crianças, para nos lembrar que a salvação que o Batismo nos dá é graça de Deus e não mérito nosso. O apóstolo afirma que nós fomos batizados (mergulhados) na morte de Cristo. Isso significa que somos chamados a fazer um exercício diário de morrer para toda situação de pecado. Nossa tarefa diária consiste em morrer para o pecado e viver para Deus, imitando Jesus Cristo em sua obediência ao Pai. O Batismo nos identificou a Jesus Cristo por uma morte semelhante à sua, para nos assemelhar-mos a Ele também na sua ressurreição. Esta será a etapa final da nossa Páscoa!
É por isso que nesta noite de vigília o Evangelho nos transporta para “depois do sábado”. Depois do grande silêncio de Deus, da Sua aparente indiferença para com o sofrimento de todos os crucificados do nosso tempo, tem início uma nova semana. Mas nós nos perguntamos: Como recomeçar a vida depois que a morte sepultou consigo as nossas esperanças?
            As duas mulheres vão ver o sepulcro são surpreendidas por um grande tremor de terra. Quantos tremores de terra nos surpreenderam neste ano? Toda essa situação de pandemia, provocando inúmeras mortes em todo o mundo, trazendo tristeza para muitas famílias, uma sensação de ameaça para todos nós, um cansaço profundo para os profissionais da saúde, um verdadeiro terremoto para a economia de todos os países afetados pela pandemia... Como falar de ressurreição diante desses “tremores de terra” que abalaram e estão abalando a fé de muitas pessoas?
            Mas o forte tremor de terra que as mulheres ouviram foi o sinal claro da intervenção de Deus na morte de Jesus: o anjo do Senhor desceu e retirou a pedra que lacrava o sepulcro, não para que Jesus saísse, e sim para que as mulheres pudessem entrar e constatar que Ele não estava ali, pois havia ressuscitado: “Sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui! Ressuscitou, como havia dito! Vinde ver o lugar em que ele estava” (Mt 28,5-6).
            Na maioria das vezes, nós interpretamos os tremores de terra como experiências onde somos soterrados, onde grandes pedras caem sobre nós e esmagam nossos sonhos, sepultando nossas esperanças. Mas quando o nosso Deus permite que o chão da nossa vida se abale não é para nos fazer sentir medo. Pelo contrário. Tanto o anjo do Senhor quanto o próprio Jesus ressuscitado disseram às mulheres: “Não tenham medo!” Deus só permite os “tremores de terra” quando eles nos ajudam a despertar do sono da morte, quando eles quebram aquilo que se endureceu dentro de nós, quando eles arrebentam as grandes pedras que nós mesmos colocamos ou permitimos que os outros colocassem na entrada da nossa própria sepultura, onde permanecemos enterrados junto com os nossos medos.
            Nesta vigília pascal o Senhor Ressuscitado vem ao encontro de cada um de nós, como foi ao encontro das mulheres, e nos diz: “Alegrai-vos! Não tenhais medo!” A morte vai continuar a existir, mas ela não tem mais poder sobre nós. Ela pode apenas ferir o nosso corpo, mas não pode matar a nossa fé, a nossa esperança e o nosso amor. Diante de todos os tremores que possam acontecer na história da humanidade, nós prosseguimos confiantes em nossa travessia, em nosso seguimento de Jesus Cristo, morto e ressuscitado, levando em nosso coração a Palavra do seu Deus e nosso Deus, do seu Pai e nosso Pai: “Podem os montes recuar e as colinas abalar-se, mas minha misericórdia não se apartará de ti, nada fará mudar a aliança de minha paz, diz o teu misericordioso Senhor” (Is 54,10).

Pe. Paulo Cezar Mazzi


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