Missa do 2º dom
de Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 2,42-47; 1Pedro 1,3-9; João 20,19-31.
Na noite do domingo de Páscoa, “estando
fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se
encontravam, Jesus entrou e pondo-se no meio deles, disse: ‘A paz esteja
convosco’” (Jo 20,19). Portas fechadas por causa do medo... A pandemia do novo
coronavírus nos empurrou para dentro de casa e nos trancou no medo de sermos
contaminados e morrermos. O sentimento do medo é hoje certamente o mais comum
em nós. Existe também o medo quanto à nossa sobrevivência, uma vez que as
previsões econômicas mundiais são sombrias, pessimistas, até mesmo ameaçadoras.
A boa notícia da Páscoa é que o
Senhor Ressuscitado entra e se coloca junto de nós! Ele atravessa nossas portas
fechadas e dissipa o medo que nos angustia e nos paralisa, dizendo: “A paz
esteja convosco” (Jo 20,19). “Depois destas palavras, mostrou-lhes as mãos e o
lado. Então os discípulos se alegraram por verem o Senhor” (Jo 20,20). A paz
com a qual Jesus quer encher nosso coração é a paz que traz as marcas da cruz,
do sofrimento, de quem lutou com a morte e venceu! Ao mostrar as suas chagas,
Jesus quer nos encorajar a não ter medo de lutar em favor da vida, da justiça e
da esperança. A paz que o Ressuscitado nos transmite é sinônimo da coragem que
afasta o medo, da alegria que supera a tristeza e da esperança que dissipa o
desespero.
Nada mudou da porta para fora. O
mundo continua o mesmo. Os problemas e os desafios continuam a existir, mas há
uma mudança dentro dos discípulos – a mesma mudança que Jesus quer provocar
dentro de cada um de nós! “Como o Pai me enviou, também eu vos envio... Recebei
o Espírito Santo” (Jo 20,21-22). O nosso lugar como discípulos do Senhor
Ressuscitado é em meio a um mundo que precisa conhecer a verdade da
ressurreição. Jesus não nos quer fechados em nossos próprios problemas, mas
abertos à vida, abertos àquilo que a vida está nos pedindo neste momento, e a
vida sempre nos pede para cuidar: cuidar dos pequenos, dos fracos, dos
injustiçados, dos menos favorecidos; cuidar dos feridos, dos desemparados, dos
esquecidos; numa palavra, cuidar daqueles que são as chagas vivas de Jesus em
nosso tempo. E podemos abraçar com alegria a missão de cuidar, sabendo que somos
cuidados pelo Espírito Santo, que é a própria força do Senhor Ressuscitado em
nós!
Oito dias depois, exatamente num
domingo como hoje, Jesus quis voltar a se manifestar aos seus discípulos. Havia
alguém que ainda estava fechado em sua falta de fé, alguém para quem não bastou
o testemunho daqueles que viram o Senhor Ressuscitado. Tomé estava fechado em
seu capricho pessoal: “Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não
puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não
acreditarei” (Jo 20,25). Temos muito de Tomé em nós! Quem de nós não deseja um
encontro pessoal com Jesus? Quem de nós não sente falta de uma experiência
intensa de fé? Para muitos de nós não basta o testemunho dos apóstolos, não
basta a voz da Igreja, não basta a palavra da Escritura, não basta nem mesmo a
Eucaristia porque, apesar de tudo isso, não sentimos Jesus vivo em nós...
Não é errado desejar ter um encontro
íntimo com o Senhor, mas é muito perigoso quando nos fechamos nos nossos
caprichos de fé e exigimos sinais ou revelações particulares para só então
crermos. Eis porque Jesus disse a Tomé: “Acreditaste, porque me viste?
Bem-aventurados os que creram sem terem visto!” (Jo 20,29). Nós imaginamos que
os apóstolos que viram o Senhor Ressuscitado eram mais felizes que nós! Mas
isso é puro engano. Jesus garantiu que felicidade maior têm aqueles que, não o
vendo, creem nele, creem na verdade da sua ressurreição, creem na pregação dos
apóstolos, transmitida pela Igreja ao longo dos séculos, creem nas palavras da
Escritura que testemunham a sua ressurreição e prometem a nossa futura
ressurreição! Felizes os que, diante do Evangelho que a Igreja proclama a cada
dia, entendem que tudo o que está escrito nele o foi “para que acrediteis que
Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu
nome” (Jo 20,31).
O que se pede de nós, cristãos do
século XXI, é que resgatemos a atitude da perseverança, à semelhança dos
primeiros cristãos: eles “eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos
apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão e nas orações” (At 2,42). O
que se pede de nós é que vivamos na alegria do Ressuscitado “embora seja
necessário que agora fiqueis por algum tempo aflitos, por causa de várias
provações. Deste modo, a vossa fé será provada como sendo verdadeira...” (1Pd
1,7).
São Pedro nos deixa conscientes de
que a nossa fé no Cristo Ressuscitado sempre será uma fé provada, combatida,
questionada por um mundo que só crê naquilo que vê, que pode comprovar. Mas nós
continuamos a manter no coração as palavras de Jesus: ‘Felizes os que creem em
mim mesmo não me vendo! Felizes os que não reduzem sua fé ao que veem,
comprovam ou experimentam em sua emoção! Felizes os que me reconhecem as minhas
chagas (feridas) em todos aqueles que estão chagados (feridos) à sua volta!’.
Se a nossa fé se tornar assim, madura, profunda, perseverante, “isso será para
vós fonte de alegria indizível e gloriosa, pois obtereis aquilo em que
acreditais: a vossa salvação” (1Pd 1,9).
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
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