quinta-feira, 31 de março de 2016

PRECISAMOS REENCONTRAR AS NOSSAS MÃOS

Missa do 2º. dom. da Páscoa. Palavra de Deus: Atos 5,12-16; Apocalipse 1,9-11a.12-13.17-19; João 20,19-31.  

A leitura dos Atos dos Apóstolos nos mostrou que a presença de Jesus ressuscitado no meio da sua Igreja fez com que Pedro e os demais apóstolos se tornassem uma presença de cura e de ressurreição junto ao povo. Essa presença de cura nos faz lembrar de uma constatação nada positiva de uma senhora, a respeito de alguns médicos atuais. Ela dizia: “Os médicos perderam as mãos”. Em que sentido? No sentido de que alguns médicos, durante a consulta, não chegam sequer a tocar no paciente (alguns, inclusive, nem olham para o rosto do paciente), seja porque não querem, seja porque estão com pressa – há uma fila enorme de pessoas esperando ser atendida. Portanto, o diagnóstico é dado pelo ouvir e, às vezes, olhar o paciente sem, contudo, tocá-lo.  
Se isso é verdade, tal verdade infelizmente não se aplica somente a alguns médicos. Quantos de nós também perdemos as mãos e não nos demos conta disso? Quando foi a última vez que sua mão tocou em alguém? Em quem? Com qual intenção? Sejamos sinceros! Nossas mãos deslizam frequentemente e com facilidade na tela do nosso celular, mas não encontram jeito para tocar na pessoa que está ao nosso lado, principalmente se a pessoa em questão não tem beleza, não é da nossa cor, nem do nosso sangue, ou está em dificuldade, doente, depressiva, enlutada...
 No domingo de Páscoa, Jesus ressuscitado encontra a sua Igreja de portas fechadas, por medo dos judeus. Seja por medo, seja por individualismo ou por comodismo, nossas portas estão cada vez mais fechadas para o outro. O bom é que essas portas fechadas não impedem Jesus de entrar. Ele entra para nos trazer a sua paz, a alegria da sua vitória sobre a morte. Mas, porque seu corpo está agora glorificado, ele precisa nos mostrar as mãos e o lado, marcados pela cruz, para que possamos reconhecê-lo.
            Jesus foi um homem que nunca perdeu as mãos. Suas mãos perdoaram, curaram, ensinaram, levantaram, encontraram, fortaleceram, redimiram, salvaram. Mesmo agora, após a ressurreição, ele mostra as suas mãos chagadas, feridas, e diz a cada um de nós: “Não tenha medo... Estive morto, mas agora estou vivo para sempre. Eu tenho a chave da morte e da região dos mortos” (Ap 1,17.18). Se temos nos fechado atrás da porta do medo, da indiferença, do desânimo ou da tristeza, Jesus tem a chave para abri tais portas e nos fazer sair para reencontrar a coragem, a solidariedade, o ânimo e a alegria.  
            “(...) Caí como morto a seus pés, mas ele colocou sobre mim a sua mão direita” (Ap 1,17). Quantas pessoas estão caídas à sua volta, sentindo-se mortas na fé e na esperança? Você tem colocado sua mão sobre elas, para que voltem a se sentir vivas? As mãos de Jesus ressuscitado são mãos chagadas, que carregam as marcas de quem se feriu para salvar, de quem foi ferido porque amou até o fim. Só quem se deixa “machucar” pelas exigências do Evangelho pode ser uma presença de cura e de ressurreição junto a quem está ferido ou sentindo-se morto.  
             “Como o Pai me enviou, também eu vos envio” (Jo 20,21). Jesus ressuscitado nos envia para as portas fechadas, para encontrar aqueles que estão atrás dessas portas e precisam recobrar o sentido de viver. Jesus ressuscitado também nos envia para os “Tomés” de hoje, para as pessoas que estão descrentes em relação à Igreja, à Justiça, à Política, e até mesmo em relação à Humanidade. Precisamos nos aproximar com humildade das pessoas que estão feridas em sua fé. Muitas delas deixaram de crer porque nós, cristãos, também perdemos as nossas mãos: elas estão frequentemente limpas, hidratadas e perfumadas, e sempre mais distantes da dor alheia. Não é de admirar que, quando falamos de Jesus Cristo, não sejamos levados a sério e nossa pregação não reconduza para a fé tantos “Tomés” de hoje.
            O Evangelho de hoje termina dizendo: “... estes (sinais) foram escritos para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome” (Jo 20,31). A fé não nasce do ver, nem do tocar, mas do ouvir o anúncio sobre Jesus Cristo (cf. Rm 10,17), o rosto visível da misericórdia do Pai. A nossa missão é justamente esta: ser uma presença viva do Evangelho junto àqueles que não creem ou cuja fé está desfalecida. Na medida em que reencontrarmos as nossas mãos e as reabilitarmos para tocar nas chagas dos crucificados de hoje, nossa presença será como a dos apóstolos no início da Igreja: uma presença de cura e de ressurreição.

                                                           Pe. Paulo Cezar Mazzi

3 comentários:

  1. Gostei da reflexão...sempre eu estou lendo as homilias dominicais.

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  2. E meio a tanta descrença no homem, na governança, na política fica cada vez mais difícil não ser Tomé. Só mesmo olhando para Filho amado de Deus para termos esperança é paz
    Só a Palavra nos põe a caminhar sem medos

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