sexta-feira, 11 de março de 2016

IRMÃOS E NÃO JUÍZES

Missa do 5º. dom. da quaresma. Palavra de Deus: Isaías 43,16-21; Filipenses 3,8-14; João 8,1-11.

Por meio do profeta Ezequiel, Deus havia feito uma promessa: “tirarei do vosso peito o coração de pedra e vos darei coração de carne” (Ez 36,26). O coração de pedra simboliza uma pessoa rígida, sempre pronta a julgar e condenar; uma pessoa indiferente para com a miséria do outro. Já o coração de carne simboliza uma pessoa humana; firme, mas não rígida; uma pessoa que toma muito cuidado ao julgar; uma pessoa que não joga fora o bebê junto com a água do banho. O coração de carne é a pessoa capaz de misericórdia, isto é, capaz de sentir a miséria do outro.
Talvez a pergunta aqui não seja: seu coração é de pedra ou de carne? Talvez a pergunta mais correta seja: o que em seu coração ainda é carne e o que nele já se tornou pedra? O contato diário com a violência, a injustiça, a impunidade, a corrupção tem nos tornado cada vez mais rígidos e intolerantes. A rapidez com que julgamos e condenamos as pessoas é a mesma com que excluímos pessoas dos nossos contatos nas redes sociais. Não dá pra negar que uma boa área do nosso coração já se encontra endurecida como pedra...  
Sim. Nós estamos com as mãos cheias de pedras, prontos para atirá-las no primeiro que errar. A ironia é que, enquanto atiramos pedras naquele que julgamos ser o “diabo”, nos esquecemos de que ele também habita dentro de nós. Justamente por isso, Jesus nos faz este alerta: “Quem dentre vós não tiver pecado seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra” (Jo 8,7). É muito bom que você proteste contra a corrupção, mas também é importante que você pare de se corromper nas atitudes do dia a dia. É muito bom que você fique indignado com a pedofilia, mas também é importante que você pare de ver pornografia na internet... É bom nós tomarmos cuidado com as pedras que temos nas mãos, prontas para serem atiradas nos outros. Talvez nós mesmos sejamos o alvo dessas pedras.  
Muitas vezes, nós somos “moles” conosco e “duros” com os outros. Além disso, a rigidez do nosso julgamento às vezes nada mais é do que uma inveja disfarçada ou não reconhecida: a pessoa que pecou teve mais coragem do que nós, de fazer algo que é errado, mas que também gostaríamos de ter feito. Sejamos sinceros! Quantos pecados nós não cometemos não por convicção de que não devemos fazê-lo, mas por falta de coragem em fazê-lo?          Jesus é o único Justo. Somente ele tem autoridade moral para nos julgar e nos condenar. No entanto, ele deixou claro que veio ao mundo não para julgar e condenar, mas para salvar (cf. Jo 3,17). Foi por isso que ele disse àquela mulher, pega em flagrante adultério: “Eu também não te condeno. Podes ir e, de agora em diante, não peques mais” (Jo 8,11). ‘Entendo que você deu uma resposta errada aos seus afetos. Procure compreender melhor aquilo que o seu coração busca. Vire a página. Siga com a sua vida e não peque mais’.  
O que Jesus nos ensina é que ninguém pode ser reduzido aos seus erros. A nossa história de vida não é escrita somente com erros, mas também com acertos e com tentativas de. Porque estamos mais próximos da Páscoa, Deus nos faz esta promessa: “Eis que farei coisas novas... Abrirei uma estrada no deserto e farei correr rios na terra seca” (Is 43,19). E nós, como o salmista, Lhe pedimos: “Mudai a nossa sorte, ó Senhor, como torrentes no deserto” (Sl 126,4). ‘Mudai o nosso coração de pedra em coração de carne. Ajudai-nos a abrir as nossas mãos fechadas e a nos livrar das pedras que ainda carregamos conosco’.     
Sim. Precisamos ter as nossas mãos livres para ajudar a se levantar quem caiu, para ajudar a se encontrar com a salvação de Jesus quem se sente condenado. Neste final de quaresma, todos nós somos convidados a aprofundar o nosso conhecimento de Jesus, da sua misericórdia, a experimentar a força da sua ressurreição. No entanto, todos nós também somos desafiados a ficar em comunhão com os seus sofrimentos, tornando-nos semelhantes a ele na morte, para podermos alcançar a ressurreição dos mortos (cf. Fl 3,10-11).
A presença de Jesus junto daquela mulher, condenada à morte, fez com que ela pudesse voltar a viver. Que assim seja também a nossa presença junto às pessoas que, como nós, também erram, tropeçam, caem e pecam. Todos nós pecamos. Todos nós precisamos do perdão de Deus. Aliás, todos nós já fomos alcançados por este perdão na cruz de Cristo. Que a energia emocional que desperdiçamos em julgar e condenar os outros seja direcionada no sentido de corrermos todos juntos para a meta, rumo ao prêmio que, do alto, Deus nos chama a receber em Cristo Jesus (cf. Fl 3,14).

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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