Missa do 2º. dom. da Páscoa. Palavra de
Deus: Atos 5,12-16; Apocalipse 1,9-11a.12-13.17-19; João 20,19-31.
A leitura dos Atos dos Apóstolos nos
mostrou que a presença de Jesus ressuscitado no meio da sua Igreja fez com que Pedro
e os demais apóstolos se tornassem uma presença de cura e de ressurreição junto
ao povo. Essa presença de cura nos faz lembrar de uma constatação nada positiva
de uma senhora, a respeito de alguns médicos atuais. Ela dizia: “Os médicos
perderam as mãos”. Em que sentido? No sentido de que alguns médicos, durante a
consulta, não chegam sequer a tocar no paciente (alguns, inclusive, nem olham
para o rosto do paciente), seja porque não querem, seja porque estão com pressa
– há uma fila enorme de pessoas esperando ser atendida. Portanto, o diagnóstico
é dado pelo ouvir e, às vezes, olhar o paciente sem, contudo, tocá-lo.
Se isso é verdade, tal verdade
infelizmente não se aplica somente a alguns médicos. Quantos de nós também
perdemos as mãos e não nos demos conta disso? Quando foi a última vez que sua
mão tocou em alguém? Em quem? Com qual intenção? Sejamos sinceros! Nossas mãos
deslizam frequentemente e com facilidade na tela do nosso celular, mas não
encontram jeito para tocar na pessoa que está ao nosso lado, principalmente se
a pessoa em questão não tem beleza, não é da nossa cor, nem do nosso sangue, ou
está em dificuldade, doente, depressiva, enlutada...
No
domingo de Páscoa, Jesus ressuscitado encontra a sua Igreja de portas fechadas,
por medo dos judeus. Seja por medo, seja por individualismo ou por comodismo,
nossas portas estão cada vez mais fechadas para o outro. O bom é que essas
portas fechadas não impedem Jesus de entrar. Ele entra para nos trazer a sua
paz, a alegria da sua vitória sobre a morte. Mas, porque seu corpo está agora
glorificado, ele precisa nos mostrar as mãos e o lado, marcados pela cruz, para
que possamos reconhecê-lo.
Jesus foi um homem que nunca perdeu
as mãos. Suas mãos perdoaram, curaram, ensinaram, levantaram, encontraram, fortaleceram,
redimiram, salvaram. Mesmo agora, após a ressurreição, ele mostra as suas mãos
chagadas, feridas, e diz a cada um de nós: “Não tenha medo... Estive morto, mas
agora estou vivo para sempre. Eu tenho a chave da morte e da região dos mortos”
(Ap 1,17.18). Se temos nos fechado atrás da porta do medo, da indiferença, do
desânimo ou da tristeza, Jesus tem a chave para abri tais portas e nos fazer
sair para reencontrar a coragem, a solidariedade, o ânimo e a alegria.
“(...) Caí como morto a seus pés,
mas ele colocou sobre mim a sua mão direita” (Ap 1,17). Quantas pessoas estão
caídas à sua volta, sentindo-se mortas na fé e na esperança? Você tem colocado
sua mão sobre elas, para que voltem a se sentir vivas? As mãos de Jesus
ressuscitado são mãos chagadas, que carregam as marcas de quem se feriu para
salvar, de quem foi ferido porque amou até o fim. Só quem se deixa “machucar”
pelas exigências do Evangelho pode ser uma presença de cura e de ressurreição junto
a quem está ferido ou sentindo-se morto.
“Como o Pai me enviou, também eu vos envio”
(Jo 20,21). Jesus ressuscitado nos envia para as portas fechadas, para
encontrar aqueles que estão atrás dessas portas e precisam recobrar o sentido
de viver. Jesus ressuscitado também nos envia para os “Tomés” de hoje, para as
pessoas que estão descrentes em relação à Igreja, à Justiça, à Política, e até
mesmo em relação à Humanidade. Precisamos nos aproximar com humildade das
pessoas que estão feridas em sua fé. Muitas delas deixaram de crer porque nós,
cristãos, também perdemos as nossas mãos: elas estão frequentemente limpas,
hidratadas e perfumadas, e sempre mais distantes da dor alheia. Não é de
admirar que, quando falamos de Jesus Cristo, não sejamos levados a sério e
nossa pregação não reconduza para a fé tantos “Tomés” de hoje.
O Evangelho de hoje termina dizendo:
“... estes (sinais) foram escritos para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o
Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome” (Jo 20,31). A fé
não nasce do ver, nem do tocar, mas do ouvir o anúncio sobre Jesus Cristo (cf.
Rm 10,17), o rosto visível da misericórdia do Pai. A nossa missão é justamente
esta: ser uma presença viva do Evangelho junto àqueles que não creem ou cuja fé
está desfalecida. Na medida em que reencontrarmos as nossas mãos e as
reabilitarmos para tocar nas chagas dos crucificados de hoje, nossa presença
será como a dos apóstolos no início da Igreja: uma presença de cura e de
ressurreição.