Missa de todos os Santos. Palavra de Deus: Apocalipse 7,2-4.9-14; 1 João 3,1-3; Mateus 5,1-12a.
Existe a pessoa que somos agora: imperfeita,
falha, pecadora, movida pelos interesses do próprio ego; mas existe também a
pessoa que somos a chamados a nos tornar: a nossa configuração a Jesus Cristo, “o
Santo de Deus” (Jo 6,69), o Filho obediente ao Pai, Aquele que escolheu se
deixar conduzir pelo Espírito Santo. Todos somos chamados a ser santos, porque
o nosso Deus é Santo.
Segundo o livro do Apocalipse, as pessoas
santas trazem consigo “a marca do Deus vivo” (Ap 7,2). Diferente de uma
tatuagem, essa marca não pode ser vista, porque ela se encontra na consciência
da pessoa. É uma marca de pertença. Ela é dada à pessoa que tem a convicção de
que nenhum bem pode ser encontrado fora de Deus (cf. Sl 16,2-3). Ainda segundo
o livro do Apocalipse, os santos “vieram da grande tribulação. Lavaram e
alvejaram suas vestes no sangue do Cordeiro” (Ap 7,14). A nossa santificação se
dá na terra, em meio a muitas tribulações. É em meio a uma sociedade de valores
invertidos que cada cristão é chamado a ter mãos puras, um coração marcado pela
inocência e uma mente não dirigida para o mal (cf. Sl 24,4).
É verdade que algumas das tribulações que
passamos na vida são resultado da nossa obstinação em caminhar fora da vontade
de Deus. Contudo, quando procuramos caminhar na fidelidade a Deus, vamos
experimentar muitas tribulações, nas quais a nossa vida será mergulhada no
sangue do Cordeiro, isto é, no sofrimento de Cristo na cruz pela sua fidelidade
ao Pai: “Embora sendo Filho, aprendeu o que significa a obediência Deus por
aquilo que sofreu” (Hb 5,8). Sempre que escolhemos obedecer a Deus, vamos
experimentar algum tipo de sofrimento, principalmente de frustração para o
nosso ego. Se é verdade que o mundo não reconhece os filhos de Deus (cf. 1Jo 3,1),
devemos estar cientes de que precisamos aprender a suportar não apenas sermos
ignorados ou tratados com indiferença pelo mundo, mas também sermos criticados,
ridicularizados e perseguidos pelo mesmo.
Jesus, no Evangelho, nos propõe um caminho de
santificação: as bem-aventuranças. Elas são atitudes de vida. A proposta de
Jesus é que vivamos diariamente a nossa santificação por meio dessas atitudes:
ser pobre em espírito, isto é, viver
na absoluta dependência de Deus e na confiança em seu amor; ser aflito, no sentido de deixar-se afetar
pelo sofrimento alheio; ser manso, tendo
paciência consigo mesmo e com os outros; ter
fome e sede de justiça, no sentido de não desistir de ser uma pessoa justa
e de trabalhar em favor daquilo que é justo; agir com misericórdia para consigo mesmo e para com os outros; ser puro de coração, tendo reta intenção e enxergando
o bem que habita em cada pessoa; promover
a paz, evitando discórdias desnecessárias e mantendo o foco naquilo que
aproxima e reconcilia as pessoas; suportar ser perseguido ou criticado por ser uma pessoa justa, isto é, que
procura viver segundo a vontade de Deus; enfim, suportar ser perseguido ou criticado por servir a Jesus e à causa do
Evangelho.
Segundo o apóstolo João, a
santificação é um processo que dura a vida toda e só vai ter a sua conclusão no
momento da nossa ressurreição, do nosso encontro com o Senhor Jesus. Partimos
daquilo que somos e caminhamos na direção daquilo que somos chamados a ser. O
que nós somos como pessoa não é algo definitivo. Estamos em processo, em
transformação: a santificação tem por objetivo nos configurar a Jesus, de forma
que as pessoas O vejam e O experimentem em nossas atitudes. Eis alguns exemplos
concretos de santidade: o neto que decidiu morar com os avós, que estão
bastante idosos e com Alzheimer, para cuidar deles ao invés de colocá-los num
asilo; a mulher que passou casada a vida toda com um marido infiel, e agora que
ele se encontra doente, decidiu cuidar dele; a pessoa que carregou consigo,
durante anos, uma doença ou uma ferida e nunca reclamou disso com ninguém...
Uma última palavra. Na sua Exortação
Apostólica sobre a Santidade, o Papa Francisco afirma que “todos somos chamados
a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações
de cada dia, onde cada um se encontra” (GE, n.14). É na rotina de cada dia, nas
ocupações diárias, que cada um de nós é chamado a santificar-se e a santificar
o mundo. Na prática, isso significa não nos conformar com o mundo (cf. Rm
12,1), isto é, não permitir que o mundo nos deforme, mas procurar distinguir
qual é a vontade de Deus diante de cada escolha que fazemos, de cada decisão
que tomamos e de cada situação que vivemos.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi