Missa do 4. dom. advento. Palavra de Deus: Miqueias 5,1-4a; Hebreus 10,5-10; Lucas 1,39-45.
O Evangelho deste último domingo do
advento nos fala da “visita” de Maria a Isabel. Nos tempos atuais, as visitas se
tornaram escassas, muito raras. Primeiro, porque não temos mais tempo de
visitar nossos parentes e amigos. Segundo, porque a própria pandemia nos
obrigou a evitar fazer visitas justamente por causa do risco de contaminação do
coronavírus. Mas essa “visita” de Maria a Isabel nos oferece a oportunidade de
meditar sobre as inúmeras visitas que Deus fez ao seu povo na Sagrada
Escritura.
Para
falar da cura da esterilidade de Sara, mulher de Abraão, a Escritura diz que “o
Senhor visitou Sara, como dissera, e fez por ela como prometera. Sara
concebeu e deu à luz um filho...” (Gn 21,1-2). Para anunciar o nascimento de
Jesus, nosso Salvador, Zacarias disse: “Bendito seja o Senhor, Deus de Israel,
porque visitou e redimiu seu povo... Graças ao misericordioso coração de
Deus, o sol nascente nos veio visitar, para iluminar os que se encontram
nas trevas e na sombra da morte estão sentados” (Lc 1,68.78-79). Depois que
Jesus ressuscitou o filho da viúva de Naim, o povo louvou a Deus reconhecendo:
“Deus visitou o seu povo” (Lc 7,16).
Quantas
vezes Deus visitou você, sem que você percebesse? Jesus chorou sobre Jerusalém,
lamentando o seu fechamento à salvação, com essas palavras: “Você não
reconheceu o tempo em que foi visitada!” (Lc 19,44). Essa é a tragédia de
algumas pessoas, cidades ou países: não reconhecerem a visita do Deus que pode
lhes trazer a paz, que pode salvá-los da destruição que eles mesmos estão
provocando em suas vidas. Por que nem sempre reconhecemos o momento em que Deus
nos visita? Porque estamos desligados da nossa própria consciência; porque,
ainda que sintamos que Deus está falando conosco por meio de uma situação, não
paramos para ouvi-Lo, porque temos que continuar em frente, sem nos dar conta
de que estamos indo na direção de um abismo.
Nós
também precisamos considerar que a visita de Deus é um momento difícil para
nós, porque é o momento de nos confrontar com a verdade: “No dia da minha visita,
eu punirei o pecado deles” (Ex 32,34). A visita de Deus também significa o
fim da injustiça, da impunidade, o acerto de contas do ser humano com a sua
consciência, a hora de Deus retribuir a cada um de acordo com a sua conduta. Por
isso, muitas pessoas preferem fugir da visita de Deus; preferem adiar o quanto
for possível essa visita, o que é lamentável, porque seria a chance de elas se
converterem, de mudarem de comportamento e serem salvas.
O salmo
que hoje meditamos também menciona a visita de Deus: “Despertai vosso poder, ó
nosso Deus, e vinde logo nos trazer a salvação! (...) Visitai a vossa vinha
e protegei-a!” (Sl 80,3.15). Ser visitado por Deus significa ser protegido
por Ele, ser defendido contra aquele que ameaça com a destruição. Também o salmo
106,4 pede a visita de Deus: “Lembra-te de mim, Senhor, (...) visita-me com
a tua salvação”. Quantas pessoas idosas e enfermas estão esquecidas em suas
casas? De quantas pessoas não mais nos lembramos? Visitá-las seria
devolver-lhes alegria, vida, esperança, conforto...
A
visita de Maria fez com que a criança pulasse de alegria no ventre de Isabel e
ela ficasse cheia do Espírito Santo (cf. Lc 1,41). Precisamos visitar nossos
familiares, pessoas amigas e, sobretudo, pessoas que vivem sozinhas... Visitar
significa romper o silêncio, diminuir a distância, derrubar o muro de
separação, desfazer o ressentimento, experimentar o milagre da reconciliação. Quando
essa visita acontece, algo que parecia estar morto ganha vida dentro de nós, e
dentro da pessoa que visitamos!
Uma
palavra a respeito do nosso corpo. Ao visitar Isabel, que está grávida há seis
meses, Maria também está grávida. No corpo de uma mulher idosa e estéril, assim
como no corpo de uma mulher virgem, dois outros corpos estão sendo gerados: o
corpo de João Batista e o corpo de Jesus. Uma criança sente a outra: João
Batista pula de alegria no ventre de sua mãe, ao sentir a presença de Jesus no
ventre de Maria. Como as mulheres grávidas cuidam do seu próprio corpo? O que
os filhos que estão sendo gerados sentem? Acolhida ou rejeição? O que eles
recebem: alimentação saudável ou tóxica? Cerca de 30% das crianças em idade
escolar estão comprometidas em sua capacidade de aprendizado, porque foram
geradas em ventres contaminados pelas drogas que a mãe consumiu durante a
gravidez.
A
carta aos Hebreus nos traz uma palavra de Jesus dirigida ao Pai: “Tu não
quiseste vítima nem oferenda, mas formaste-me um corpo... Eu vim, ó
Deus, para fazer a tua vontade” (Hb 10,5.7). Jesus sempre viveu sua
espiritualidade a partir do seu corpo e da sua sexualidade. Ele nunca aceitou a
distorção – tão comum hoje – de que a alma presta, mas o corpo não presta. Deus
nos deu um corpo, e esse corpo é chamado a ser integrado em nossa
espiritualidade. Para algumas pessoas, é necessário reconciliar-se com o
próprio corpo. Para outras, é preciso compreender e dialogar com sua
sexualidade, com seus desejos, e dialogar com aquilo que sente, de modo que
seja a consciência a dar a direção ao corpo, e não o contrário – o cavaleiro
cavalga montado sobre o cavalo, e não o contrário!
Jesus
fez algo belíssimo com o seu corpo: transformou-o numa oferenda a Deus! Ele não
teve medo de expor o próprio corpo ao sofrimento, à dor, sempre que isso foi
necessário para viver segundo a vontade de Deus. Seu corpo, gerado no ventre de
Maria, foi ofertado em sacrifício no altar da cruz: “É graças a esta vontade
que somos santificados pela oferenda do corpo de Jesus Cristo, realizada uma
vez por todas” (Hb 10,10). O corpo de Jesus, assim como o nosso, tinha as
suas vontades, os seus desejos, os quais nem sempre coincidiam com a vontade de
Deus. Mas Jesus submeteu à vontade de Deus o que o seu corpo sentia. Para isso,
é preciso treinar a nossa vontade, torná-la forte, educá-la, de modo que o
nosso corpo não nos traia e não nos afaste de Deus.
A
hóstia é a “oferenda do corpo de Jesus Cristo” (Hb 10,10). Quando comungamos,
nosso corpo entra em comunhão com o corpo crucificado e ressuscitado de Jesus;
recebemos em nosso corpo o Corpo que conheceu a dor, a tentação, a fraqueza, a
fome, a agressão, a violência, o desprezo do mundo, o Corpo que se sujou com a
sujeira da humanidade, o Corpo que lutou para submeter-se à vontade de Deus. Aquele
que nos visita tem um Corpo e precisa visitar também o nosso corpo: libertá-lo,
curá-lo, ordenar os seus afetos e desejos, torná-lo uma oferenda agradável a
Deus...
Oração:
“Lembra-te de mim, Senhor, (...) visita-me com a tua salvação” (Sl 106,4).
Lembra-te desta pessoa por quem eu oro neste momento, Senhor, ela que se
encontra necessitada, numa situação de sofrimento: visita-a com a tua salvação!
Lembra-te das famílias, dos que trabalham, dos que estão desempregados, dos
doentes, dos idosos solitários em suas casas: visita-os com a tua salvação! Lembra-te
dos que estão presos, dos praticam violência e dos que são atingidos por ela,
dos que passam fome, dos que estão com seus corpos escravizados pelo vício das
drogas: visita-os com a tua salvação! Tu me formaste um corpo. Eu entrego a Ti os
meus afetos, os meus desejos, a minha sexualidade. Santifica-me, Senhor. Quero
fazer do meu corpo uma oferenda agradável a Ti, sacrificando-me para viver
segundo a Tua vontade e também para fazer o bem que for possível a toda pessoa cujo
corpo encontra-se atingido por algum sofrimento. Em nome de Jesus, na graça do
Espírito Santo. Amém.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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