quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

QUEM DESEJA ESQUECER 2020 RECUSA-SE A APRENDER O QUE ELE VEIO ENSINAR

 Missa Maria, mãe de Deus. Dia mundial da paz. Palavra de Deus: Números 6,22-27; Gálatas 4,4-7; Lucas 2,16-21.

 

            A celebração de hoje marca a passagem de um ano para outro. O que fazer com o ano de 2020, que termina? “Devolvê-lo”, porque “veio com vírus”? Muitos dizem que 2020 é um ano para ser esquecido. No entanto, quando o povo de Israel chegou ao fim da caminhada pelo deserto e estava às portas da Terra Prometida, Deus ordenou a Moisés dizer ao povo: “Não se esqueça de todo o caminho que o Senhor seu Deus fez você percorrer no deserto” (Dt 8,2); “Não se esqueça do Senhor seu Deus (de como Ele sustentou você na travessia do deserto)” (Dt 8,11); “Se você se esquecer do Senhor seu Deus, morrerá na Terra em que está para entrar” (Dt 8,19).

            A nossa tendência, enquanto seres humanos, é apagar da nossa lembrança os sofrimentos que passamos. Como o ano de 2020 foi marcado por muito sofrimento, especialmente devido ao coronavírus e suas consequências – morte, luto, perda, enfraquecimento da economia, desemprego, isolamento, distanciamento etc. – a grande maioria das pessoas deseja que este ano seja esquecido. Mas Deus nos ensina que quem quer se esquecer rapidamente do sofrimento que enfrentou não aprendeu nada com ele, e quem se recusa a aprender com o sofrimento continuará a errar pela vida e precisará sofrer dores ainda maiores, até que aprenda aquilo que tem que aprender, para modificar suas atitudes.

            2020 não é um ano para ser esquecido, mas para ser lembrado como o ano em que a humanidade foi forçada a parar e a rever suas atitudes, especialmente sua relação com o meio ambiente. Este ano que termina nos jogou numa profunda crise, e crise significa oportunidade de mudança, de crescimento, de purificação, de amadurecimento. Enquanto muitos terminam esse ano melhores, mais sábios, mais humildes, mais conscientes, mais responsáveis, outros o terminam piores: mais ignorantes, mais estúpidos, mais irresponsáveis, mais cínicos, mais desumanos. A crise é assim mesmo: ela faz vir para fora aquilo que temos dentro de nós. Quem tem abertura para o crescimento, aprende, amadurece e se torna melhor depois de passar pelo sofrimento; quem não tem essa abertura, quem não aceita aprender com a vida, sai do sofrimento pior, responsabilizando os outros pelo seu fracasso como pessoa.

            Sem dúvida que a maioria das pessoas deseja que 2021 seja um ano melhor. Mas quem está disposto a se tornar uma pessoa melhor? Quem de nós, que hoje celebra a passagem do ano diante de Deus, está disposto a se tornar um cristão melhor? Todos querem que Deus os abençoe no novo ano que nasce (Salmo 66, que acabamos de rezar), mas quem está disposto a viver o novo ano na obediência à vontade de Deus? Aqui mais uma vez é preciso lembrar: todos querem que Deus esteja em seu caminho de vida, abençoando seus projetos, mas poucos se sujeitam a caminhar na vida segundo a vontade de Deus. Todos suplicam: “Que o Senhor faça brilhar sobre nós a sua face e se compadeça de nós. Que o Senhor volte para nós o seu rosto e nos dê a paz” (citação livre de Nm 6,25-26), mas quantos, na prática, viverão a maior parte dos seus dias neste novo ano de costas para Deus, sem tempo para cultivar sua vida de oração, seu relacionamento com Ele?

            Nesta noite, em que celebramos Maria, Mãe de Deus Filho, a Escritura nos recorda que “Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, (...) para que todos recebêssemos a filiação adotiva... Assim já não és mais escravo, mas filho” (Gl 4,4-5.7). Deus não quer que vivamos o ano novo escravos da ignorância, escravos da tecnologia, escravos do pecado, escravos da mentira – da ilusão de ganhar na mega sena. Deus nos convida a viver o novo ano como filhos; filhos que estão abertos a aprender com o Pai e com nosso irmão mais velho, Jesus; filhos que desejam se deixar conduzir pelo Espírito Santo, que clama em nós a palavra “Abá, Papai!” (Gl 4,6). O Espírito Santo é o Espírito da Verdade. Ele deseja nos tirar do espírito da ignorância em relação à ciência, aos apelos do meio ambiente, aos apelos da própria vida, para que modifiquemos as atitudes que estão nos destruindo enquanto humanidade.  

            Oito dias após o Natal, o Evangelho nos coloca diante de Maria, que sempre procurou guardar e meditar em seu coração os acontecimentos que afetavam sua existência neste mundo. Mais uma vez é preciso dizer que os acontecimentos que nos afetaram em 2020 precisam ser guardados e meditados em nosso coração, não esquecidos. Guardar e meditar no coração aquilo que nos acontece significa nos lembrar de que “o Senhor desfaz os planos das nações e os projetos que os povos se propõem, mas os desígnios do Senhor são para sempre, e os pensamentos que Ele traz no coração de geração em geração vão perdurar” (Sl 33,10-11). Por isso, nos fará bem começar este ano novo pedindo que Deus disponha da nossa vida e faça prevalecer em nossa história pessoal e social não os nossos projetos, normalmente infectados pelo vírus do nosso egoísmo, mas sim os Seus desígnios, desígnios que visam nos dar um futuro e uma esperança.   

“Quando se completaram os oito dias para a circuncisão do menino, deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo antes de ser concebido” (Lc 2,21). Nosso ano novo começa diante do nome de Jesus, o único nome que nos foi dado debaixo do céu pelo qual possamos ser salvos (cf. At 4,12). O nome de Jesus não é mágico; o nome representa a sua pessoa. A nossa salvação depende do nosso relacionamento com a pessoa de Jesus Cristo, especialmente procurando viver como Ele viveu, nos comportar como Ele se comportou. É nisso que consiste a nossa salvação.

Enfim, neste Dia Mundial da Paz, o Papa Francisco nos lembra que a paz nasce do cuidado. Sem a cultura ou a atitude do cuidado, não há paz. O primeiro cuidado é com a pessoa humana, o que significa respeito pela sua dignidade e solidariedade perante suas necessidades. Depois, vem o cuidado com o bem comum, o que envolve nossas atitudes perante a sociedade: cuidar do espaço em que vivemos, humanizando nossas cidades. Por fim, o cuidado com a criação, com o meio ambiente, com a Amazônia, com o Planeta.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

 

3 comentários:

  1. Boa noite Padre,me encanto com suas reflexões.Sou tia do padre Sebastião e acompanho todas reflexões muito rica e valorosa.Maria Araújo Louzada Diocese de Lto de N Sra Bahia.

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  2. Bom dia, querida Maria! Muito obrigado! Louvado seja Deus se posso ajudá-la em seu caminho de fé. Deus a abençoe junto da sua família e lhes conceda um ano novo vivido na serenidade e na força do Espírito Santo!!!

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  3. Como sempre, vc Pe. Paulo sempre traz a homilia para a esfera da consciência e do comprometimento dos cristãos de forma abrangente, parabéns. Desejo que Deus conceda a vocês essa disposição de evangelizar através dessa "conversa" de todo domingo. Abraço

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