Missa
do 4. dom. do advento. Palavra de Deus: 2Samuel 7,1-5.8b-12.14a.16; Romanos
16,25-27; Lucas 1,26-38.
Uma das orações que nós, enquanto
Igreja, mais elevamos a Deus no tempo do advento é esta: “Céus, deixai cair orvalho
das alturas, e que as nuvens façam chover justiça; abra-se a terra e germine a
salvação; brote igualmente a justiça” (Is 45,8). O Evangelho de hoje nos traz a
resposta a essa súplica, o momento em que o céu se abre e desce à terra,
fecundando-a com a salvação que vem de Deus.
De todos os lugares que poderia fazer
brotar a salvação, Deus escolheu um insignificante, um vilarejo desconhecido até
mesmo pela Sagrada Escritura, nunca mencionado no Antigo Testamento, uma cidadezinha
mal vista pelos judeus, porque povoada de pessoas mestiças, isto é, por pessoas
que não tinham o sangue puro do judaísmo, a pequena Nazaré, desprezada, como se
vê nessa pergunta de Natanael: “De Nazaré pode vir algo de bom?” (Jo 1,46).
Nazaré
somos nós. Nazaré é a nossa vida cotidiana, uma vida ignorada pelo mundo que só
enxerga e valoriza o que é grande, forte, famoso e que se destaca, fugindo da
simplicidade. Nazaré é a nossa vida de pessoas comuns, que não ocupam o centro
das atenções, que passarão pela história humana sem ter sido notadas. Deus
escolheu Nazaré porque “os homens veem a aparência, mas Deus olha o coração”
(1Sm 16,7). Deus escolheu entrar no mundo não pela força, mas pela fraqueza;
não pelo espetáculo, mas pela discrição; não pelo barulho, mas pelo silêncio;
não por aquilo que o mundo considera importante, mas exatamente por aquilo que
ele despreza. Isso significa que, se quisermos nos encontrar com Deus, temos
que acolher e valorizar a Nazaré onde nos encontramos.
Para
fazer brotar na terra a salvação, Deus entra em diálogo com Maria, a qual, muito
provavelmente, se encontrava em oração em sua casa. Embora na oração nós muitas
vezes buscamos pedir coisas a Deus – e consideramos que nossa oração é bem
sucedida quando obtemos aquilo que havíamos pedido –, o diálogo entre Deus e
Maria nos revela uma face mais profunda da oração: ela é justamente o espaço que
damos a Deus para falar conosco, para intervir em nossa vida, e o nosso maior desafio
é permitir que Ele modifique os nossos planos, que Deus dê uma direção nova à
nossa história, uma direção que, a princípio, virará nossa vida do avesso, e
isso nos causará muito medo, mas é assim que Deus abrirá o horizonte da nossa
existência e nos fará compreender que cada um de nós tem uma palavra d’Ele a
pronunciar ao mundo com a nossa existência, que é única.
“Não
tenhas medo, Maria... Eis que conceberás e darás à luz um filho, a quem porás o
nome de Jesus” (Lc 1,30-31). Dentro de cada um de nós há um ventre vazio, uma
força adormecida, um sonho a ser despertado, uma tarefa que pede para ser
realizada. Normalmente, quando nos damos conta disso, sentimos medo. Mas Deus
nos encoraja, nos dizendo que é hora de conceber, é hora de gerar vida e
esperança, é hora de permitir que aquilo para o qual nascemos comece a ganhar
corpo, comece a vir à luz. As circunstâncias não são favoráveis; o momento não
parece propício; a realidade à nossa volta não nos aconselha a “engravidar” do
sonho de Deus para a humanidade, mas é exatamente nesse contexto, onde nada
parece favorável, que precisamos confiar, porque a obra é de Deus.
“O
Espírito virá sobre ti, e o poder do Altíssimo te cobrirá com sua sombra” (Lc
1,35). Sobre a terra árida e sem vida do nosso coração, Deus derrama a água
viva do seu Espírito. Essa água penetra no chão da nossa existência e nos torna
homens e mulheres fecundos de alegria, de fé, de esperança e de amor, fecundos
de força interior, de vida interior. O Espírito “vem em socorro da nossa fraqueza”
(Rm 8,26), não para cancelá-la da nossa vida, mas para, através dela,
manifestar a força de Deus. Sendo “poder do Altíssimo”, ele nos “cobrirá com
sua sombra”, isto é, nos revestirá da sua graça em nossa missão de gerar vida e
esperança no mundo. Deixar-se cobrir pelo Espírito Santo significa deixar-se
conduzir por ele; significa realizar a tarefa que Deus nos confia tendo no
coração suas próprias palavras: “Não pelo poder, não pela força, mas sim por meu
Espírito” (Zc 4,6).
Para
comprovar que vale a pena nos abrir à tarefa que Deus quer nos confiar, o anjo
Gabriel, interlocutor entre Deus e Maria, afirma: “Também Isabel, tua parenta, concebeu
um filho na velhice. Este já é o sexto mês daquela que era considerada estéril,
porque para Deus nada é impossível” (Lc 1,36-37). Quantos de nós se sentem “velhos”?
Quantos, por já terem uma certa idade, não contam mais para o mercado e para a
cultura moderna, que despreza e descarta tudo o que é velho? A gravidez de
Isabel, idosa e estéril, deve lembrar Maria e cada um de nós que Deus não
descarta pessoas; Deus faz, sim, novas todas as coisas, mas o faz revitalizando
o que é velho, gerando vida exatamente naquilo que consideramos definitivamente
morto em nós.
E
assim se conclui a oração de Maria, o seu diálogo com Deus: “Eis aqui a serva
do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1,38). Estamos diante de
uma oração “bem sucedida”, uma oração que alcançou o seu objetivo, não porque
Deus fez aquilo que lhe havíamos pedido, mas porque saímos dela dispostos a
fazer o que Ele nos pediu: “Faça-se”. Quantas orações estão travadas, por falta
desse “faça-se”? Muitos ventres continuam vazios e muitos horizontes continuam
fechados, sem alegria e sem esperança, porque as pessoas não têm coragem de
dizer a Deus: “Faça-se”, “Eu permito que a tua Palavra, que a tua vontade se faça
em minha vida”; “Eu me disponho a abraçar a vontade de Deus, ainda que isso me
custe renunciar aos meus planos, aos meus desejos egoístas”.
O Natal se aproxima. O céu visita a
terra, desejoso de derramar sobre ela o orvalho da justiça, a bênção da chuva
da salvação. Mas ele espera que a terra se abra, que o coração do ser humano dê
o seu “faça-se”, que cada um de nós se deixe conduzir pelo Espírito Santo e
possa pronunciar, com a sua existência, a Palavra que se fez pessoa humana no
ventre de Maria. Sempre que entramos em diálogo com Deus e ouvimos com fé sua
Palavra, ela precisa permanecer em nós até que se cumpra, até que se faça.
Saibamos respeitar o tempo de gestação da Palavra em nós, até que aquilo que
era impossível em nossa vida deixe de sê-lo, porque permitimos que Deus agisse
e nos tornasse grávidos da mudança que Ele deseja provocar em nós e no coração
da humanidade.
Enquanto muitos desejam por uma
intervenção “bombástica” de Deus, acolhamos essa intervenção calma, serena e
silenciosa como orvalho que cai do céu e fecunda a terra, lembrando que a
Encarnação de Jesus Cristo “não se realizou de modo estridente, mas com
infinita discrição, na ‘sombra’ do Espírito Santo. À intervenção divina deve
corresponder a nossa discreta disponibilidade: ‘Abra-se a terra’. E a terra
abriu-se, quando a Virgem de Nazaré deu o seu ‘sim’: ‘Eis a serva do Senhor;
faça-se em mim segundo a tua palavra’ (Lc 1,38) – Liturgia Dehonianos.
ORAÇÃO: Senhor Jesus, derrama sobre a
terra árida da minha vida o orvalho da tua graça. Fecunda-me! Que a sombra do
Espírito Santo me cubra e desperte em mim a força espiritual necessária para
que eu realize a tarefa que a vida me pede neste momento, em vista da salvação
da humanidade. Afasta de mim o medo, a covardia e todo tipo de desânimo ou pessimismo.
Quero viver segundo o teu Evangelho principalmente em meio às circunstâncias
que não são favoráveis, confiando que para Deus nada é impossível. Quem em cada
dia da minha vida eu possa alimentar-me da tua Palavra e obedecer ao que ela me
diz, respondendo conscientemente o meu “faça-se”. Amém!
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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