Missa Maria, mãe
de Deus. Palavra de Deus: Números 6,22-27; Gálatas 4,4-7; Lucas 2,16-21.
Nada mais velho e desgastado do que
a frase “Ano novo, vida nova”. Por que é tão difícil ter ou experimentar uma
vida nova? Porque o “novo” não pode nascer fora de nós; ele só pode vir de
dentro; ele precisa ser desejado, cultivado, gestado dentro de nós. O “novo” é
uma tarefa que pede de nós determinação, constância, perseverança, dedicação,
persistência, e tudo isso dá trabalho. Além disso, nós, que desejamos tanto ter
uma vida nova, somos pessoas apegadas aos nossos velhos hábitos; somos pessoas
viciadas na maneira como vemos a nós mesmos e aos outros. E romper com hábitos,
vícios ou manias dá muito trabalho...
Sendo assim, nós escolhemos repetir
o erro de tentar costurar remendo novo numa roupa velha, e isso, segundo Jesus,
não funciona (cf. Mt 9,16). Ao invés de nos despirmos de atitudes e
comportamentos viciados, que não respondem mais aos desafios que a vida está
nos apresentando, nós corremos o tempo todo atrás de remendos. Colocamos
remendos nos nossos relacionamentos, em nossa vida profissional, no cuidado com
a nossa saúde, no lidar com o nosso pecado e até mesmo em nossa vida de fé, e,
no entanto, esses remendos não transformam aquilo que gostaríamos que fosse
transformado.
O adjetivo “novo” é a palavra que
mais se repete no livro do Apocalipse. O novo, como nos ensina este livro bíblico,
só pode vir de Deus, conforme Ele mesmo diz: “Eis que faço novas todas as coisas”
(Ap 21,5). O novo, para nascer em nós, exige que esvaziemos nossas gavetas,
onde guardamos nossas mágoas e nossos ressentimentos, e abramos espaço para que
Deus possa agir em nós. O novo exige silêncio, revisão de vida, exame de
consciência, confronto conosco mesmos. O novo exige que nos perguntemos: O que
está bom em mim e precisa ser mantido? O que não está bom em mim e precisa ser
modificado? Se eu tenho consciência de que há algo que precisa ser mudado em
mim, na minha vida, quais os passos que eu efetivamente preciso dar, quais as
atitudes que eu efetivamente preciso tomar, para que a mudança aconteça?
Maria sempre foi uma pessoa que teve
a coragem de refletir sobre a sua existência. Diante de cada acontecimento, ela
parava e questionava: o que esse acontecimento quer me dizer? O que eu devo
aprender, corrigir ou confirmar em minha vida, a partir daquilo que está
acontecendo? Se é verdade que o tempo não pára, nós precisamos aprender a
parar, fazer pequenas pausas diárias, refletir sobre aquilo que a
vida está nos dizendo e, se preciso for, rever e reorientar os nossos passos.
Precisamos ter a coragem de sair do piloto automático e assumir o trabalho de
escolher qual direção dar à nossa vida...
E por falar em direção, é importante
nos lembrar de um alerta da Palavra de Deus: “O Senhor desfaz os planos das
nações e os projetos que os povos se propõem. Mas os desígnios do Senhor são
para sempre, e os pensamentos que ele traz no coração, de geração em geração
vão perdurar” (Sl 33,10-11). Sejam quais forem os nossos sonhos ou projetos
para este novo ano, é importante colocá-los diante de Deus e pedir que Ele nos
guie, que Ele disponha nossos dias segundo a Sua vontade, que Ele intervenha e
modifique tudo aquilo que precisa modificar, em vista do Seu desígnio de nos
salvar. Enfim, que Deus seja o piloto e nós o co-piloto, jamais o contrário. Afinal,
Ele sabe melhor do que nós não somente qual é o destino da nossa viagem, mas
também qual percurso é o melhor, qual caminho deveremos percorrer este ano, em
vista do nosso crescimento, da nossa conversão e da nossa salvação.
Antes
que comece a agitação, a correria das nossas atividades, antes que comecemos a escrever
nas páginas em branco do livro deste novo ano, é importante pedir a bênção de
Deus (cf. Nm 6,24-26). Não se trata de pedir – e muito menos de esperar – que
Deus nos proteja da vida, mas que Ele nos dê forças para olhar a vida nos olhos
e enfrentar aquilo que temos que enfrentar. Não se trata de iniciar este ano
tendo o coração preenchido pelo medo e tomado pela preocupação, mas preenchido
pelo Espírito de Deus, tomado por Sua força, Sua coragem, Sua determinação.
Foi
por isso que o apóstolo Paulo contrapôs a figura do escravo à figura do filho.
O escravo vive preso ao medo; o filho lança-se com coragem diante da vida (cf.
Gl 4,7). Se há alguma mudança ou transformação que esperamos para este novo
ano, ela depende em muito da maneira como vamos escolher viver nossa vida: como
escravos, que usam como desculpa suas próprias correntes, para não fazer aquilo
que sabem que têm que fazer, ou como filhos, que se deixam conduzir pelo
Espírito que os anima a lutar e a criar condições para as mudanças ou
transformações aconteçam em sua vida.
O
dia 1º. de janeiro é o Dia Mundial da Paz. Há inúmeras situações sociais que
impossibilitam a paz entre nós: guerras, violência, injustiças, desemprego,
agressões, abusos, doenças etc. No entanto, assim como o novo só pode vir de
Deus, o mesmo se dá com a paz: “Quero ouvir o que o Senhor irá falar. É a paz
que ele vai anunciar, a paz para o seu povo e seus amigos, para os que voltam
ao Senhor seu coração” (Sl 85,9). Só um coração que diariamente se volta com
sinceridade para Deus pode experimentar a paz e se tornar portador de paz para
os outros. O contrário também é verdade: “Os ímpios são como um mar agitado que
não pode acalmar-se, cujas águas revolvem sargaço e lodo. ‘Para os ímpios não
há paz’, diz o meu Deus” (Is 57,21). Quem não se coloca diariamente na presença
de Deus e não descansa n’Ele, nunca encontra paz. Quem se deixa engolir pela
agitação do mundo e se permite ser arrastado como folha seca levada pela desorientação
da vida moderna ao invés de cultivar suas raízes em Deus, sentirá diariamente
sua vida como uma represa cheia de água suja, dentro da qual tudo está perdido
e confuso, sem nenhuma clareza.
Entreguemos
ao Senhor o ano que se inicia: “Senhor, ensinai-nos a contar os nossos dias e dai
ao nosso coração sabedoria... Saciai-nos a cada manhã com vosso amor e
exultaremos de alegria todos os dias. Alegrai-nos pelos dias que sofremos e
pelos anos em que passamos na dor. Que a vossa bondade esteja sobre nós e nos
conduza. Tornai fecundo o nosso trabalho e confirmai em cada um de nós a vossa obra de salvação. Por Cristo, nosso Senhor, Amém!” (cf. Sl 90,12.14-15.17).
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