Missa
da Epifania do Senhor. Isaías 60,1-6; Efésios 3,2-3a.5-6; Mateus 2,1-12.
“Eis
que está a terra envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem os povos” (Is
60,2). Apesar de todas as luzes artificiais que o mundo acende para nos manter
distraídos, iludidos, a verdade é que a humanidade vive momentos de grande
escuridão – as guerras, a violência nas cidades, as doenças, o desemprego, a
fome, o aquecimento global, a desestruturação das famílias etc. Essa escuridão
atinge até mesmo a nossa fé. Hoje fala-se de um “eclipse de Deus”, uma espécie
de sentimento de “ausência de Deus”, de um grande silêncio por parte de Deus,
um silêncio que leva muitos ao abandono da fé e à desistência em buscá-Lo. Não
são poucas as pessoas em cujo coração se apagou a luz da fé.
Mas
o nascimento de Jesus foi o cumprimento da profecia de Isaías: “O povo que
andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam nas sombras da
morte, uma luz resplandeceu” (Is 9,6). De fato, no dia de Natal ouvimos o
Evangelho afirmar que Jesus é “a luz da verdade que, vindo ao mundo, ilumina
todo ser humano” (Jo 1,9), e, no entanto, essa luz ainda não chegou a todas as
pessoas, além do fato de que muitos a rejeitam, por terem se habituado a viver
na escuridão.
A
festa que celebramos hoje fala da manifestação de Jesus a todos os povos como
“luz do mundo”. Se é verdade que “a terra está envolvida em trevas, e nuvens
escuras cobrem os povos”, também é verdade que àqueles que acolhem a verdade do
Evangelho são referidas essas palavras: “sobre ti apareceu o Senhor, e sua
glória já se manifesta sobre ti” (Is 60,2). Se ao longo do seu ministério Jesus
foi rejeitado por muitos do seu povo (os judeus), Ele foi reconhecido e
acolhido como Salvador por muitos pagãos, aqui representados pelos magos do
Oriente.
“Onde está o rei dos judeus, que acaba de
nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (Mt 2,2). Esses
magos são a imagem de cada um de nós, quando perguntamos por Deus, quando nos
sentimos mergulhados numa noite escura que parece nunca terminar, e, de
repente, no meio da noite escura surge uma pequena luz, um pequeno sinal de que
Deus está conosco e nos convida a caminhar, a buscar, a nos mover. Esses magos
nos ensinam que as perguntas são muito importantes, pois somente quem leva a
sério as perguntas da sua alma se coloca na busca da verdade; somente quem está
insatisfeito com a escuridão sai em busca da luz.
Mas,
onde encontrar Deus? Onde encontrar Aquele que é a verdadeira luz? “Eis que
habitavas dentro de mim e eu te procurava do lado de fora! Estavas comigo, mas
eu não estava contigo. Tu me chamaste, e teu grito rompeu a minha surdez. Fulguraste
e brilhaste e tua luz afugentou a minha cegueira” (Santo Agostinho). O caminho
para encontrar Aquele que é a luz da verdade passa pela escuridão da nossa
própria alma. Assim como Jacó, somente quando ficamos sozinhos conosco mesmos,
somente quando paramos de fugir de nós mesmos e das nossas perguntas, e
travamos uma sofrida luta com Deus no meio da nossa noite escura, é que
finalmente encontramos a verdade que nos liberta (cf. Gn 32,23-33).
Os
magos só encontraram Jesus porque foram persistentes em sua busca, foram fiéis
ao caminho indicado pela estrela. Essa mesma estrela serve de questionamento
para nós. Como podemos nos tornar um sinal de fé para inúmeras crianças e
adolescentes, hipnotizados pela luz da tela do próprio celular, cuja vida
espiritual está atrofiada por falta de cultivo? Como podemos ser luz para tantas
pessoas que convivem conosco e se mostram avessas à nossa Igreja ou ao próprio
cristianismo? A luz dessa estrela nos ensina que a luz do nosso testemunho
cristão precisa sair de dentro das nossas igrejas e chegar àqueles que estão
nas periferias existenciais, àqueles que se encontram doentes, desempregados,
às famílias em conflito, às crianças expostas à violência e a abusos, aos
adolescentes e jovens dependentes químicos etc.
O Evangelho de hoje nos convida,
como Igreja, a prestar atenção às perguntas das pessoas, a ouvir suas
inquietações, sua insatisfação, sua angústia. Alguns teólogos já afirmaram que
nós, enquanto Igreja, estamos dando respostas a perguntas que as pessoas não
nos fazem, ao mesmo tempo em que não queremos ouvir, não queremos nos deixar
questionar por suas perguntas. Jesus nos provoca a sair debaixo da luz
artificial das nossas falsas seguranças religiosas e a ir com Ele aonde quer
que exista alguém na escuridão da sua desorientação, alguém que esteja lutando
com Deus na noite escura da sua fé, alguém que teve a coragem de levar a sério
a inquietação da sua alma, a insatisfação do seu coração. Se não fizermos isso
enquanto Igreja, teremos perdido o sentido da nossa própria missão.
Finalmente,
quando encontraram Jesus, os magos tiveram duas
atitudes: o adoraram e lhe ofereceram presentes. Adorar significa, antes de
tudo, respeitar Deus, colocar-se humildemente diante da Sua presença
misteriosa, não apropriar-se d’Ele como se fosse um objeto sagrado que
pudéssemos usar a nosso favor. Adorar significa dar menos espaço às palavras e
mais ao silêncio, em nossa oração; significa desarmar-se, substituindo o medo
pela confiança, permitindo que Deus possa tomar posse de nós e nos inundar com
a Sua graça, que tudo transforma.
Depois de adorar Jesus, os magos “abriram seus
cofres e lhe ofereceram presentes” (Mt 2,11). Segundo Pe. Silvano Fausti, o ouro, riqueza visível, representa aquilo que temos; o incenso, invisível
como Deus, representa aquilo que
desejamos; a mirra, bálsamo que cura as feridas e preserva da corrupção,
representa aquilo que somos, pessoas
expostas à dor e à morte. Que ao oferecer a Deus diariamente aquilo que temos,
desejamos e somos como pessoa, nós possamos nos tornar um presente para a
humanidade, convidando cada pessoa a oferecer a Deus o presente do seu tempo para a oração diária, o
presente do seu esforço em viver na justiça e na santidade; o presente da sua
renúncia a tudo aquilo que desagrada a Deus e do seu sacrifício em viver
segundo o Evangelho de Seu Filho Jesus.
Oração: Ó luz do Senhor, que vem sobre a terra, inunda meu ser, permanece em
nós! Senhor Deus, sobre todos os povos que vivem na escuridão da violência, da
fome, das doenças e das injustiças sociais fazei brilhar a luz da vossa face!
Visitai-nos nas noites escuras da nossa fé, e devolvei-nos o sentido da vossa
presença. Voltai a vossa face para nós e salvai-nos!
Ó luz do Senhor, que vem sobre a terra, inunda meu
ser, permanece em nós! Senhor Jesus Cristo, sois a luz da verdade que ilumina
todo ser humano. Dissipai as trevas da nossa cegueira espiritual e iluminai-nos
com a verdade do vosso Evangelho. Fazei de nós uma luz para aqueles que
convivem conosco, sobretudo para aqueles de quem precisamos nos tornar próximos
e ajudá-los a saírem da escuridão em que se encontram.
Ó luz do Senhor, que vem sobre a terra, inunda meu
ser, permanece em nós! Espírito Santo, vós sois a Luz que vem do Alto. Sem a
vossa luz, tudo em nós é escuridão. Iluminai o nosso caminho, fazei irradiar a
vossa luz em nossas casas, escolas, locais de trabalho, igrejas e comunidades.
Ensinai-nos a doar o melhor daquilo que temos, desejamos e somos, para o bem e
a salvação da humanidade e para a glória de Deus, nosso Pai. Em nome de Jesus,
amém!
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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