Missa
do 5º. dom. da quaresma. Palavra de Deus: Jeremias 31,31-34; Hebreus 5,7-9;
João 12,20-33.
Como
saber se a vida valeu a pena? Ter viajado e conhecido muitos lugares? Ter
comido e bebido em abundância? Ter amado (entenda-se também: feito sexo com) muitas
pessoas? Ter realizado uma brilhante carreira profissional? Ter se enriquecido?
Ter alcançado o maior ou um alto grau na hierarquia do poder? Ter sido
reconhecido e aplaudido pelo mundo? Para Jesus, só existe uma coisa que mostra
que a vida valeu a pena, isto é, que a nossa vida teve sentido: é o fato de
termos aprendido a morrer. Em que sentido? No sentido de que nós dedicamos a
nossa vida a fazer os outros viverem; no sentido de que nós aceitamos ser
configurados ao grão de trigo que, caindo na terra e morrendo, produz muito
fruto.
Da
mesma forma como Jesus usou a imagem do grão de trigo para nos ensinar que o
sentido da nossa vida está em fazer dela uma “vida para” o bem da humanidade, o
Papa Francisco nos presenteou com uma belíssima e profunda reflexão: “Os rios
não bebem sua própria água; as árvores não comem seus próprios frutos. O sol
não brilha para si mesmo; e as flores não espalham sua fragrância para si.
Viver para os outros é uma regra da natureza. A vida é boa quando você está
feliz; mas a vida é muito melhor quando os outros estão felizes por sua causa”.
Esta
é a chave para entendermos o ensinamento de Jesus nesta última semana da
quaresma: “Viver para os outros é uma regra da natureza”. O sentido da vida não
está em sermos felizes de maneira egoísta, sem nos importar com o sofrimento
que atinge os outros. O sentido da vida está em que as pessoas que convivem
conosco se sintam melhores porque nós passamos pela vida delas e nos
doamos/sacrificamos pelo bem delas. Pensemos na hóstia que comungamos: se o
grão de trigo não aceitasse ser enterrado e “morrer” debaixo da terra, não
produziria trigo, e se os grãos de trigo não aceitassem ser triturados, não
teríamos pão. A hóstia que comungamos é um pão sem fermento porque Jesus foi um
homem sem o fermento do egoísmo e da autopreservação. Quem comunga o Corpo de Cristo
é chamado a viver não mais em função de si mesmo, mas a fazer da sua vida uma “vida
para” o bem da humanidade.
A
imagem do grão de trigo que morre para produzir fruto nos ensina que viver dói.
Viver comporta dor. Doar-se para o bem dos outros é sinônimo de sofrimento,
embora nos encha de uma profunda alegria. No Evangelho que acabamos de ouvir, Jesus
deixou transparecer a verdade da sua dor ao fazer da sua vida um serviço para a
salvação da humanidade: “Agora sinto-me angustiado. E que direi? ‘Pai, livra-me
desta hora!’? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim” (Jo 12,27-28).
Quando nos preocupamos com o bem dos outros, quando nos deixamos atingir pela
dor que atinge inúmeras pessoas à nossa volta, nós sentimos a mesma angústia
que Jesus sentiu. E essa angústia nos incomoda tanto que somos tentados a pedir
ao Pai: “Livra-nos, Senhor! Livra-nos de sofrer! Livra-nos de sentir esta dor!
Livra-nos desta hora!”
Na
vida de toda pessoa que busca ser fiel, honesta e decente; na vida de toda
pessoa que faz o propósito de amar até o fim e de se sacrificar por aqueles que
ama; na vida de toda pessoa que responde ‘sim’ ao chamado de Deus sempre chega
a hora da cruz, a hora da angústia, a hora em que a dor se mostra em toda a sua
dureza e crueldade. E aí temos duas saídas: ou rompemos com o compromisso que
havíamos assumido, ou enfrentamos aquela dor com o mesmo realismo com que Jesus
enfrentou, ao dizer: “(...) foi precisamente para esta hora que eu vim”. Assim,
com Jesus nós aprendemos a dizer: ‘Eu não nasci para sofrer, mas sei que a dor
faz parte da vida de todo e qualquer ser humano. Se o sofrimento atinge a vida
de todas as pessoas, por que eu teria a pretensão de passar pelo mundo sem
sofrer? Foi para esta hora que eu vim: a hora de doar-me pelo bem da
humanidade, a hora de sacrificar-me para que o mundo se torne um lugar melhor.
Eu aceito e abraço a minha “hora” porque tenha consciência de que essa
experiência de cruz diz respeito a mim e não a outra pessoa’.
Marcel More, um crítico do cristianismo moderno, escreveu: “Os cristãos encontraram uma maneira de sentar-se, não se sabe como, de modo confortável na cruz”. Em outras palavras, muitos de nós, cristãos, comungamos da mesma aversão que o mundo tem da cruz. Sim: cruz é cruz; dor é dor; morrer é morrer. Jesus nunca mascarou a sua dor diante do Pai e nunca encarou a cruz como uma poltrona suave sobre a qual se sentar. Como vimos na carta aos Hebreus, ele chegou a dirigir “preces e súplicas, com forte clamor e lágrimas, àquele que era capaz de salvá-lo da morte. E foi atendido, por causa de sua entrega a Deus. Mesmo sendo Filho, aprendeu o que significa a obediência a Deus por aquilo que ele sofreu” (Hb 5,7-8). A palavra-chave aqui é “entrega”. Essa foi a forma como Jesus lidou com a sua angústia e com a repulsa que todo ser humano tem diante da morte: entrega. ‘Eu não nego a repulsa que sinto diante do fato de ter que morrer para fazer o bem aos outros, mas eu entrego esse sentimento de repulsa ao Pai e lhe peço a graça de amar até o fim, de ser fiel até o fim, de não me desviar dessa “hora de cruz” que cabe a mim enfrentar’.
Marcel More, um crítico do cristianismo moderno, escreveu: “Os cristãos encontraram uma maneira de sentar-se, não se sabe como, de modo confortável na cruz”. Em outras palavras, muitos de nós, cristãos, comungamos da mesma aversão que o mundo tem da cruz. Sim: cruz é cruz; dor é dor; morrer é morrer. Jesus nunca mascarou a sua dor diante do Pai e nunca encarou a cruz como uma poltrona suave sobre a qual se sentar. Como vimos na carta aos Hebreus, ele chegou a dirigir “preces e súplicas, com forte clamor e lágrimas, àquele que era capaz de salvá-lo da morte. E foi atendido, por causa de sua entrega a Deus. Mesmo sendo Filho, aprendeu o que significa a obediência a Deus por aquilo que ele sofreu” (Hb 5,7-8). A palavra-chave aqui é “entrega”. Essa foi a forma como Jesus lidou com a sua angústia e com a repulsa que todo ser humano tem diante da morte: entrega. ‘Eu não nego a repulsa que sinto diante do fato de ter que morrer para fazer o bem aos outros, mas eu entrego esse sentimento de repulsa ao Pai e lhe peço a graça de amar até o fim, de ser fiel até o fim, de não me desviar dessa “hora de cruz” que cabe a mim enfrentar’.
Estando
às portas da Semana Santa, queremos acolher este ensinamento de Jesus: toda
obediência a Deus comporta algum tipo de sofrimento da nossa parte, mas o
sofrimento do grão de trigo, que se dispõe a morrer para produzir muito fruto,
é um sofrimento pleno de sentido. A nossa fecundidade só se revela na hora em
que aceitamos fazer da nossa vida uma “vida para”, como foi a vida de Jesus. E
como ele mesmo disse: “(...) quando for elevado da terra, atrairei todos a mim”
(Jo 12,32). Deixemo-nos atrair pela força redentora da cruz de Cristo, e que a
doação da nossa vida ajude a humanidade a elevar-se acima da injustiça, da
violência e da morte, produzidas por um mundo que decidiu riscar do seu
dicionário a palavra “doação”.
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