Missa do 22º. dom. comum. Palavra de Deus: Deuteronômio
4,1-2.6-8; Tiago 1,17-18.21b-22.27; Mc 7,1-8.14-15.21-23.
“Nas favelas, no Senado, sujeira pra todo lado. Ninguém
respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação. Que país é
esse?” (Legião Urbana, Que país é esse?).
Sujeira pra todo lado: no Executivo, no Legislativo e no Judiciário; nos
Ministérios, nas Secretarias, nos Estados e nos Municípios; no Mercado e na
Bolsa de Valores, nos Países do Oriente e do Ocidente; nas igrejas cristãs e
nas demais religiões... Ninguém está totalmente limpo. Ninguém está totalmente puro.
Todos nós precisamos de limpeza e de purificação.
Mas, de onde vem a
sujeira que nos torna “impuros”? Para os fariseus da época de Jesus e de hoje,
ela vem dos outros: do contato com quem não é da minha igreja ou da minha
religião; do contato com quem não tem a cor da minha pele, que não mora no meu condomínio
ou no meu bairro, que não pertence à minha classe social etc. Para os países da
Europa, a “sujeira” vem dos imigrantes que todos os dias chegam pelo mar – os
que sobrevivem à viagem –, fugindo da fome, da guerra e da perseguição
religiosa que estão destruindo seus países de origem. Para o Estado Islâmico, o
perigo da impureza vem dos cristãos, que precisam ser exterminados...
E para você? Existe essa preocupação em não se contaminar
com aquilo que é “impuro”? Com exceção de uma possível preocupação com os
alimentos – se estão contaminados com agrotóxicos, se fazem subir o nível de colosterol
e triglicerides, se são transgênicos ou se ativam as células cancerígenas –
essa discussão entre puro e impuro não faz parte do nosso cotidiano. Muito pelo
contrário; nós temos a tendência a nos adaptar e a aderir facilmente a costumes
que, mesmo não estando de acordo com a Palavra de Deus, fazem parte da moda e –
o que é o mais importante – nos garantem um lugar na sociedade da aparência, da
futilidade e da inversão de valores.
Para recolocar corretamente a questão da contaminação,
Jesus esclarece que aquilo que torna uma pessoa impura não é o contato com uma
realidade externa – o que eu como ou bebo, com quem eu convivo ou o quê eu vejo
pelos meios de comunicação –, mas com quê intenção eu faço essas coisas. Já o
apóstolo Paulo dizia: “Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra
coisa, fazei tudo para a glória de Deus” (1Cor 10,31). Essa é a questão
principal: buscar a glória de Deus. Quando eu deixo de fazer isso e passo a
buscar a minha glória pessoal, o meu coração perde o foco e se desvia da sua
própria verdade.
Jesus aproveita essa discussão em torno do “impuro” para fazer
um questionamento a todas as igrejas: “Este povo me honra com os lábios, mas
seu coração está longe de mim” (Mc 7,6). Onde está o seu coração enquanto você
faz sua oração, ou lê/escuta a Palavra de Deus, ou canta uma música religiosa?
Onde está o seu coração quando você se encontra dentro de uma igreja, ou comunga
o corpo de Cristo?
O coração humano é o lugar onde fazemos as nossas
escolhas e tomanos as nossas decisões, e somente a Palavra de Deus pode
devolver-lhe discernimento, ajudando-o a readquirir clareza, liberdade e
objetividade diante da realidade externa que nos afeta e dos impulsos que
reagem dentro de nós. Por isso, o apóstolo Tiago nos aconselha: “Recebei com
humildade a palavra... que é capaz de salvar as vossas almas... Sede
praticantes da palavra e não meros ouvintes... A religião pura e sem mancha
diante de Deus Pai é esta: socorrer os necessitados em suas aflições e não se
deixar contaminar pelo mundo” (Tg 1,21b-22.27).
Se a tendência atual é cada um
fechar-se em si mesmo e viver sua fé de maneira individualista, o apóstolo
Tiago deixa claro que o que Deus espera de nós é exatamente o contrário:
“contaminar-se”, envolver-se com a aflição do nosso semelhante. Neste sentido,
o Papa Francisco afirmou, há tempos atrás: “Não se
pode fazer o bem sem aproximar-se... Tantas vezes penso que seja, não digo
impossível, mas muito difícil fazer o bem sem sujar as mãos. Estou disposto a
‘sujar’ as minhas mãos, se for preciso, para me tornar próximo de quem precisa
de mim?”, pergunta Francisco.
Que o Senhor Jesus, que conhece cada um de nós por
dentro (cf. Jo 2,25), nos purifique interiormente, conceda discernimento ao
nosso coração e lave nossos olhos com a água do Espírito Santo, para que
enxerguemos cada ser humano não como uma ameaça de contaminação, mas como uma
possibilidade de purificar a nossa compreensão acerca da vida, de nós mesmos e
do próprio Deus.
Pe. Paulo Cezar Mazzi