Missa do 4. dom. Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 2,14a.36-41; 1Pedro 2,20b-25; João 10,1-10
A figura do pastor é muito forte no mundo bíblico,
pelo fato de o povo de Israel ser (antigamente) bastante habituado com essa
realidade do pastor cuidando das suas ovelhas. Para nós, no mundo atual, a
figura bíblica do pastor pode ser traduzida como a do cuidador ou do orientador:
todo cuidador, todo orientador é um “pastor”, e toda pessoa que necessita ser
cuidada ou orientada é uma “ovelha”. Políticos, empresários, líderes de setores
de trabalho, pais, professores, líderes religiosos, médicos, psicólogos etc.,
são “pastores”. Cidadãos, trabalhadores, pessoas lideradas, filhos, seguidores
de uma igreja ou religião, pacientes etc., são “ovelhas”.
Jesus, o autêntico “pastor segundo o
coração de Deus” (cf. Jr 3,15; Ez 34,15-16), apresenta-se como “porta”, tanto
para as pessoas que têm a função de pastorear, cuidar, orientar, quanto para as
pessoas que necessitam de cuidado, proteção e orientação. “Quem não entra no redil das ovelhas pela porta, mas sobe por outro lugar, é ladrão e assaltante” (Jo 10,1). “Eu sou a
porta” (Jo 10,9). Toda pessoa que tem a responsabilidade de cuidar de alguém
precisa se inspirar em Jesus. Ele nunca buscou seus próprios interesses, mas sempre
o bem e a salvação das pessoas. Em vista disso, disse “não” e confrontou a
pessoa com sua própria verdade, quando era necessário fazê-lo; foi
misericordioso e compassivo, colocando o bem da pessoa acima de qualquer lei
(civil ou religiosa); jamais se deixou instrumentalizar ou se esgotar, quando
queriam abusar da sua bondade; deu prioridade aos que mais sofriam e
necessitavam ser resgatados; “amou até o fim” (cf. Jo 13,1).
Toda pessoa que cuida, lidera,
orienta alguém, sem ter Jesus como modelo, corre o risco de se tornar “ladrão e
assaltante”: usa sua posição de líder para lucrar com a vida dos outros;
corrompe-se; deixa o poder “subir à cabeça” e se torna arrogante; busca seus
próprios interesses e não o bem daqueles que estão sob seus cuidados. Além
disso, existem “pastores” que se deixam sugar por suas ovelhas: são incapazes
de dizer “não”, de colocar limites, de confrontarem os seus liderados com a
verdade; carregam as ovelhas no colo quando estas podem caminhar com suas
próprias pernas – o resultado é a sobrecarga, o esgotamento e o adoecimento do
pastor.
Além de ser a porta – no sentido de modelo,
de inspiração – para todo pastor, cuidador, orientador, Jesus é também a porta
para toda ovelha que necessita “entrar, sair e encontrar pastagem” (cf. Jo 10,9).
“Entrar” – somente por meio de Jesus podemos ter acesso ao Pai: “por meio dele,
todos nós, num só Espírito, temos acesso ao Pai” (Ef 2,18). “Sair” – sinônimo de
libertação: “Se o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres” (Jo 8,36).
“Pastagem” – alimento, condição essencial para se ter vida: “Eu sou o pão da
vida. Quem vem a mim, nunca mais terá fome, e o que crê em mim nunca mais terá
sede” (Jo 6,35). Todo ser humano busca, ainda que inconscientemente, encontrar
o Pai; necessita ser liberto de algo que o aprisiona ou ameaça; busca não
somente sobreviver, mas viver uma vida com sentido. Tudo isso só pode ser
encontrado na pessoa de Jesus Cristo.
Ele nos recorda que aquilo que
vincula a ovelha ao pastor é o reconhecimento da sua voz: “As ovelhas escutam a sua voz; ele chama as
ovelhas pelo nome
e as conduz para fora... As ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. Mas não seguem um estranho, antes fogem
dele,
porque não conhecem a voz dos estranhos” (Jo
10,3-5). A voz do pastor é sinônimo de orientação. A humanidade tem se sentido
profundamente desorientada. Há uma forte desorientação quanto à vida profissional,
ao lidar com os problemas, ao construir um relacionamento, ao conduzir uma
família, ao compreender a própria sexualidade, ao escolher uma igreja ou
religião etc. Toda essa desorientação é agravada pelas fake news e por sites
que têm como objetivo principal a falsificação da realidade.
Voz é sinônimo de orientação. Com quem você
tem se orientado quanto à sua vida afetiva, sexual, familiar, profissional, financeira,
espiritual? Enquanto existe uma rejeição a toda voz “institucional” – Estado (política),
Igreja, Família, Escola – existe uma procura desesperada na Internet por gurus,
coachings (treinadores, instrutores, motivadores), psicólogos,
filósofos, influenciadores (influencers), padres, pastores e outros
líderes espirituais que forneçam uma resposta rápida de prática à angústia que
a pessoa está vivenciando. Quantos desses “orientadores” são cegos guiando
outros cegos (cf. Lc 6,39)?
Jesus termina o Evangelho de hoje contrapondo-se ao
ladrão, que se disfarça de “orientador” da pessoa, visando unicamente roubá-la,
matá-la e destruí-la: “O ladrão só vem para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). Mais
do que nunca, cada um de nós precisa se perguntar pelo quê ou por quem está se
orientando na vida. Quantas pessoas – ou, quem sabe, quantos de nós – estão
seguindo orientações mentirosas, doentias, perversas, e não admitem reconhecer
que estão sendo roubadas, mortas e destruídas? Quantos de nós estamos escolhendo
entrar em portas erradas, justamente porque são largas e atrativas, ao invés de
entrarmos pela porta que é Jesus, uma porta estreita, sim, exigente, sim, mas a
única porta que nos conduz à verdadeira Vida?
ORAÇÃO: Senhor Jesus, “eu me desvio como ovelha
perdida: vem procurar o teu servo!” (Sl 119,176). Ensina-me a cuidar daqueles
que a vida confiou aos meus cuidados, inspirando-me em Ti. Quero aprender
contigo a buscar o verdadeiro bem daqueles que me foram confiados, sem,
contudo, me deixar manipular ou esgotar por eles. Liberta-me da necessidade
doentia de ser aceito(a) e amado(a) pelos outros. Que a minha liderança seja
pautada unicamente pelo amor à justiça e à verdade.
Intercede ao Pai por esse imenso rebanho que é a
humanidade, cuja maioria se encontra desorientada, adoecida, incapaz de
distinguir a voz do pastor da voz do ladrão. Concede-nos sabedoria para não nos
deixarmos enganar por sites criados para roubar, matar e destruir a
verdade dos fatos históricos, procurando nos enganar por meio de um “Brasil Paralelo”.
Sobretudo, Senhor Jesus, livra nossas crianças, nossos adolescentes e jovens dos
inúmeros ladrões e assaltantes que inundam a Internet com jogos, vídeos, fotos
e mensagens cujo principal objetivo é roubar, matar e destruir suas vidas.
Amém!
Pe. Paulo Cezar Mazzi