Missa de São Pedro e São Paulo. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 12,1-11; 2Timóteo 4,6-7.17-18; Mateus 16,13-19.
“Tu és Pedro, e sobre esta pedra
construirei a minha Igreja” (Mt 16,18). Nos últimos quarenta anos, muitos católicos
se afastaram da nossa Igreja, de modo que se tornou muito comum a expressão “católico
não praticante”. Pesquisas recentes também detectaram que entre os evangélicos,
muitos se afastaram de suas igrejas, de modo que o número de “evangélicos não praticantes”
não para de crescer. Portanto, seja do lado católico, seja do lado evangélico,
a “religião” que mais cresce hoje no Brasil é a dos “sem igreja”, e o principal
motivo é o desencanto. Além da falta de coerência de muitos líderes religiosos –
não vivem aquilo que pregam –, muitos católicos sentem a Igreja distante de sua
vida concreta, enquanto que muitos evangélicos se escandalizam com a
manipulação do Evangelho em vista do enriquecimento pessoal dos seus líderes.
É verdade que o individualismo e o
relativismo atuais contribuem muito para a vivência de uma fé “self service” (sou
cristão “do meu jeito”). No entanto, é inegável que os pecados da instituição Igreja
tem uma séria parcela de responsabilidade no descrédito de muitas pessoas em
relação ao próprio Deus ou ao Evangelho de Jesus Cristo. Sobretudo no âmbito
católico, o outro lado da moeda dos “católicos não praticantes” é o fato de que
a ação pastoral da nossa Igreja ainda é de “manutenção” e não de atuação
missionária. Neste sentido, o Papa Francisco ainda é, infelizmente, uma voz solitária,
que clama por uma “Igreja em saída”, uma Igreja que se faça presente junto aos
dramas humanos das pessoas e das famílias. Por isso, a pergunta a ser feita não
é: “Por que muitas pessoas não vêm à Igreja?”, mas “Por que a Igreja, na sua
ação pastoral, insiste em se manter distante da vida concreta da maioria das
pessoas?”.
Seria muito cômodo para nós,
católicos, nos excluirmos da pergunta acima, direcionando-a apenas para a
instituição Igreja (seus líderes). No entanto, a Igreja que Jesus fundou sobre
Pedro e os demais apóstolos é um Corpo, e nós somos membros desse Corpo (cf.
1Cor 12). Da mesma forma como Jesus sempre foi um “homem em saída”, uma pessoa
que sempre tomou a iniciativa de se colocar junto dos outros, especialmente dos
que sofrem, todos nós, católicos, temos a responsabilidade de sermos a presença
viva de Jesus junto às pessoas do nosso tempo. A ausência da nossa Igreja junto
às pessoas é a nossa ausência enquanto católicos junto delas! Se falta à nossa
Igreja um rosto de Mãe junto a tantas pessoas, é também porque falta a nós uma
postura de irmãos dessas pessoas.
Jesus
quis a Igreja como uma casa onde todos se sintam em casa, um espaço onde os
filhos de Deus dispersos podem se reunir e terem suas feridas curadas, suas
forças restauradas, seus pecados perdoados e suas vidas fortalecidas. Da mesma
forma como Jesus veio para salvar e não para condenar (cf. Jo 3,17), assim Ele
quer sua Igreja. Da mesma forma como Ele veio procurar e salvar o que estava
perdido (cf. Lc 19,10), assim Ele quer sua Igreja. Da mesma forma como Jesus
viveu na comunhão com o amor do Pai, assim Ele quer que sua Igreja ajude cada
pessoa a se sentir amada e cuidada pelo Pai. Da mesma forma como Jesus nunca se
sentiu só (cf. Jo 16,30), Ele quer sua Igreja como uma família, no seio da qual
ninguém se sinta só.
Hoje
celebramos os apóstolos São Pedro e São Paulo. A prisão de Pedro, narrada na
primeira leitura, nos recorda que interessa ao mundo atual combater e desacreditar
a Igreja, pois o Evangelho que ela anuncia denuncia a inversão de valores em
que vive o nosso mundo. Silenciar a voz da Igreja é importante, para um mundo que
cultua o dinheiro como seu verdadeiro deus, um deus que se alimenta do
sacrifício de inúmeras vidas humanas – os pobres. Interessa ao mundo trancafiar
a Igreja dentro da sua sacristia, para que ela não levante sua voz contra o
desmatamento na Amazônia, o tráfico de órgãos, o aborto, a ideologia de gênero,
a economia capitalista que gera violência, miséria e morte em todo lugar etc.
A
força da Igreja não está na sua aliança com falsos messias políticos, mas na
sua oração: “Enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja rezava
continuamente a Deus por ele” (At 12,5). A força da Igreja não está no
dinheiro, no poder e na influência sobre o mundo, mas unicamente na confiança
em Deus e na fidelidade a Ele, que escolhe o que é fraco para confundir o que o
mundo entende como forte; que escolhe o que não tem valor para confundir o que
o mundo entende como valor (cf. 1Cor 1,27-28). A morte de Tiago e a prisão de
Pedro nos recordam que uma Igreja que não sofre perseguição por parte dos poderosos,
como Jesus e os apóstolos sofreram, é uma Igreja que deixou de ser presença
profética na sociedade e que se tornou tão corrompida quanto o mundo (cf. Mt
5,11-12).
“Combati
o bom combate, completei a corrida, guardei a fé” (2Tm 4,7). Essas palavras
resumem a vida cristã do apóstolo Paulo. Numa época em que muitos entendem a fé
como blindagem contra problemas, Paulo nos lembra que a verdadeira fé é um
combate: primeiro, um combate travado dentro de nós, contra o nosso pecado e
contra os caprichos do nosso egoísmo; depois, um combate travado contra as
mentiras do mundo e os seus valores invertidos. A fé cristã é um caminho, uma
corrida que deve ser completada. Não importa quantos sejam os nossos tropeços e
as nossas quedas: é preciso levantar-se e retomar o caminho, a corrida, até completá-la!
Por fim, a fé deve ser guardada, defendida, mantida viva, para o encontro com o
Senhor Jesus, que nos dará a coroa a justiça, símbolo da salvação definitiva.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi