quinta-feira, 30 de junho de 2022

JESUS REALMENTE QUIS UMA IGREJA?

 Missa de São Pedro e São Paulo. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 12,1-11; 2Timóteo 4,6-7.17-18; Mateus 16,13-19.

 

            “Tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja” (Mt 16,18). Nos últimos quarenta anos, muitos católicos se afastaram da nossa Igreja, de modo que se tornou muito comum a expressão “católico não praticante”. Pesquisas recentes também detectaram que entre os evangélicos, muitos se afastaram de suas igrejas, de modo que o número de “evangélicos não praticantes” não para de crescer. Portanto, seja do lado católico, seja do lado evangélico, a “religião” que mais cresce hoje no Brasil é a dos “sem igreja”, e o principal motivo é o desencanto. Além da falta de coerência de muitos líderes religiosos – não vivem aquilo que pregam –, muitos católicos sentem a Igreja distante de sua vida concreta, enquanto que muitos evangélicos se escandalizam com a manipulação do Evangelho em vista do enriquecimento pessoal dos seus líderes.

            É verdade que o individualismo e o relativismo atuais contribuem muito para a vivência de uma fé “self service” (sou cristão “do meu jeito”). No entanto, é inegável que os pecados da instituição Igreja tem uma séria parcela de responsabilidade no descrédito de muitas pessoas em relação ao próprio Deus ou ao Evangelho de Jesus Cristo. Sobretudo no âmbito católico, o outro lado da moeda dos “católicos não praticantes” é o fato de que a ação pastoral da nossa Igreja ainda é de “manutenção” e não de atuação missionária. Neste sentido, o Papa Francisco ainda é, infelizmente, uma voz solitária, que clama por uma “Igreja em saída”, uma Igreja que se faça presente junto aos dramas humanos das pessoas e das famílias. Por isso, a pergunta a ser feita não é: “Por que muitas pessoas não vêm à Igreja?”, mas “Por que a Igreja, na sua ação pastoral, insiste em se manter distante da vida concreta da maioria das pessoas?”.

            Seria muito cômodo para nós, católicos, nos excluirmos da pergunta acima, direcionando-a apenas para a instituição Igreja (seus líderes). No entanto, a Igreja que Jesus fundou sobre Pedro e os demais apóstolos é um Corpo, e nós somos membros desse Corpo (cf. 1Cor 12). Da mesma forma como Jesus sempre foi um “homem em saída”, uma pessoa que sempre tomou a iniciativa de se colocar junto dos outros, especialmente dos que sofrem, todos nós, católicos, temos a responsabilidade de sermos a presença viva de Jesus junto às pessoas do nosso tempo. A ausência da nossa Igreja junto às pessoas é a nossa ausência enquanto católicos junto delas! Se falta à nossa Igreja um rosto de Mãe junto a tantas pessoas, é também porque falta a nós uma postura de irmãos dessas pessoas.

Jesus quis a Igreja como uma casa onde todos se sintam em casa, um espaço onde os filhos de Deus dispersos podem se reunir e terem suas feridas curadas, suas forças restauradas, seus pecados perdoados e suas vidas fortalecidas. Da mesma forma como Jesus veio para salvar e não para condenar (cf. Jo 3,17), assim Ele quer sua Igreja. Da mesma forma como Ele veio procurar e salvar o que estava perdido (cf. Lc 19,10), assim Ele quer sua Igreja. Da mesma forma como Jesus viveu na comunhão com o amor do Pai, assim Ele quer que sua Igreja ajude cada pessoa a se sentir amada e cuidada pelo Pai. Da mesma forma como Jesus nunca se sentiu só (cf. Jo 16,30), Ele quer sua Igreja como uma família, no seio da qual ninguém se sinta só.    

Hoje celebramos os apóstolos São Pedro e São Paulo. A prisão de Pedro, narrada na primeira leitura, nos recorda que interessa ao mundo atual combater e desacreditar a Igreja, pois o Evangelho que ela anuncia denuncia a inversão de valores em que vive o nosso mundo. Silenciar a voz da Igreja é importante, para um mundo que cultua o dinheiro como seu verdadeiro deus, um deus que se alimenta do sacrifício de inúmeras vidas humanas – os pobres. Interessa ao mundo trancafiar a Igreja dentro da sua sacristia, para que ela não levante sua voz contra o desmatamento na Amazônia, o tráfico de órgãos, o aborto, a ideologia de gênero, a economia capitalista que gera violência, miséria e morte em todo lugar etc.

A força da Igreja não está na sua aliança com falsos messias políticos, mas na sua oração: “Enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja rezava continuamente a Deus por ele” (At 12,5). A força da Igreja não está no dinheiro, no poder e na influência sobre o mundo, mas unicamente na confiança em Deus e na fidelidade a Ele, que escolhe o que é fraco para confundir o que o mundo entende como forte; que escolhe o que não tem valor para confundir o que o mundo entende como valor (cf. 1Cor 1,27-28). A morte de Tiago e a prisão de Pedro nos recordam que uma Igreja que não sofre perseguição por parte dos poderosos, como Jesus e os apóstolos sofreram, é uma Igreja que deixou de ser presença profética na sociedade e que se tornou tão corrompida quanto o mundo (cf. Mt 5,11-12).

“Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé” (2Tm 4,7). Essas palavras resumem a vida cristã do apóstolo Paulo. Numa época em que muitos entendem a fé como blindagem contra problemas, Paulo nos lembra que a verdadeira fé é um combate: primeiro, um combate travado dentro de nós, contra o nosso pecado e contra os caprichos do nosso egoísmo; depois, um combate travado contra as mentiras do mundo e os seus valores invertidos. A fé cristã é um caminho, uma corrida que deve ser completada. Não importa quantos sejam os nossos tropeços e as nossas quedas: é preciso levantar-se e retomar o caminho, a corrida, até completá-la! Por fim, a fé deve ser guardada, defendida, mantida viva, para o encontro com o Senhor Jesus, que nos dará a coroa a justiça, símbolo da salvação definitiva.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

sexta-feira, 24 de junho de 2022

A INDECISÃO APRISIONA; A DECISÃO LIBERTA

 Missa do 13. dom. comum. Palavra de Deus: 1Reis 19,16b.19-21; Gálatas 5,1.13-18; Lucas 9,51-62

 

            Estava chegando a hora de Jesus enfrentar a sua cruz. “Então ele tomou a firme decisão de partir para Jerusalém” (Lc 9,51). Sempre que precisamos enfrentar uma situação difícil, a nossa tendência é adiar a decisão o máximo possível. O medo e a insegurança nos paralisam, e passamos a adiar a decisão até o último momento. O problema é que o custo emocional disso é muito alto. Nós gastamos mais energia emocional sofrendo com a nossa indecisão do que tomando a decisão de enfrentar aquilo que estamos sendo chamados a enfrentar. Se fôssemos firmes em nossas decisões, experimentaríamos a libertação do medo, da angústia e da ansiedade. A decisão firme sempre nos liberta, ao passo que a indecisão nos mantém aprisionados.

            Aquilo que mais nos atrapalha em sermos firmes em nossa decisão é o medo quanto ao futuro. Queremos garantias de que a decisão que vamos tomar será bem sucedida e não nos arrependeremos dela. No entanto, essas garantias não existem. A única coisa que nos ajuda na decisão é tomá-la baseando-nos no nosso “eu devo”, libertando-nos do nosso “eu gostaria” ou “eu quero”. Jesus não tomou a firme decisão de ir de encontro à sua cruz movido pelo desejo de sofrer, mas movido pelo seu dever de salvar a humanidade, ainda que tal salvação tivesse como preço a cruz.

            Muitas pessoas estão adoecendo emocional ou fisicamente por não terem a coragem de tomar as decisões que sabem ser necessárias para sua vida. Elas se deixam aprisionar no medo de perder suas falsas seguranças ou suas falsas compensações, e com isso acabam por perder tudo: dinheiro, saúde, paz, liberdade, alegria, qualidade de vida. Por não aceitarem pagar o preço das consequências de suas decisões, acabam por pagar um preço ainda maior, que é, em alguns casos, a destruição de si mesmas, de seus sonhos, de seu futuro.

            A decisão de Jesus de ir para Jerusalém esbarrou num primeiro obstáculo: alguns samaritanos não permitiram que ele passasse pela aldeia deles, pois judeus e samaritanos eram inimigos, naquela época. Tomando as dores de Jesus, Tiago e João se dispuseram a eliminar o obstáculo com violência destrutiva: mandar descer fogo do céu sobre os samaritanos!!! No entanto, Jesus rejeitou firmemente a proposta dos dois discípulos, mudou seu trajeto e prosseguiu sua viagem para Jerusalém.

            Não podemos nos iludir: ainda que nossa decisão seja firme, os caminhos não vão se abrir facilmente diante de nós. Se a decisão firme nos liberta interiormente de obstáculos como o medo e a insegurança, ela não elimina os obstáculos externos. Não é porque decidimos caminhar segundo a vontade de Deus que Ele mesmo eliminará todas as pedras do nosso caminho. Os obstáculos estarão ali exatamente para comprovar se, de fato, estamos firmes naquilo que decidimos fazer. Além disso, quem se decide por Deus, enfrentará muito mais obstáculos, pois o mundo sempre se oporá àqueles que desejam ser de Deus.  

            Jesus deseja nos tornar pessoas verdadeiramente livres (cf. Gl 5,1), mas nós nem sempre queremos essa liberdade, pois, para experimentá-la, temos que tomar a decisão de nos orientar na vida pela voz do Espírito de Deus, e não pela voz do nosso ego (carne). Enquanto o nosso ego entende a liberdade como “fazer o que quer, o que deseja, o que é do seu interesse”, o Espírito de Deus entende a liberdade como “fazer o que fomos chamados a fazer, a partir da nossa vocação”. Justamente porque somos interiormente livres, cabe a nós decidir a quem dar ouvidos: se à voz do Espírito de Deus ou se à voz do nosso ego (carne). Ainda que muitos costumam abrir mão da responsabilidade por suas escolhas e decisões, alegando que “a carne” é mais forte do que elas, essa falsa justificativa não convence, pois “tudo pode ser tirado de uma pessoa, menos uma coisa: a liberdade de escolher sua atitude em qualquer circunstância da vida” (Victor Frankl).

            Diante da circunstância negativa – a proibição de passar pela aldeia dos samaritanos – Jesus usou sua liberdade e escolheu a atitude de mudar de rota, sem desviar-se da sua meta, que era chegar a Jerusalém. Ele não usou a circunstância negativa como desculpa para si mesmo ou para o Pai, alegando que tentou encarar sua cruz, mas foi “impedido” pelas circunstâncias... Só quem é interiormente livre e leva a sério sua própria existência pode ser firme diante de suas próprias desculpas em não agir como deve, como a vida está lhe pedindo que aja, naquele momento.   

            Enquanto estava caminhando para Jerusalém com seus discípulos, Jesus se deparou com três pessoas. A primeira se dispôs a segui-lo livre e incondicionalmente, mas ele a alertou: “Não espere de mim segurança, bem-estar e vida fácil!”. À segunda pessoa, que condicionou o seu seguimento ao “enterro” do seu pai, Jesus lançou o desafio de abraçar a tarefa de cuidar da vida, não da morte. À terceira pessoa, que também condicionou seu seguimento à despedida da sua família, Jesus foi claro em dizer que não se caminha para o futuro mantendo-se agarrado ao passado.   

            No diálogo de Jesus com essas três pessoas, entra novamente a questão da liberdade e da decisão. Quem se move na vida pelo desejo de garantir seu bem-estar não toma a decisão que precisa, justamente porque o preço dela é a perda do bem-estar. Além disso, quem fica chorando aquilo que vai perder, ao tomar a decisão que precisa tomar, escolhe morrer e não viver. Por incrível que pareça, essa escolha é a mais comum! Muitos preferem morrer aprisionados ao seu pecado, ao seu vício, do que experimentar uma vida verdadeira, porém privada dos efeitos “compensatórios” do veneno que os estava matando. Enfim, quem sonha com um futuro diferente, mas não tem a coragem de romper definitivamente com aquilo que precisa deixar para trás, condena sua vida a uma rotina insuportável, sem horizonte, sem futuro, sem sentido.

            Que tenhamos a coragem de reconhecer qual decisão precisamos encarar e efetivar, para que nossa vida se torne a vida que Deus deseja para nós.

 

            Pe. Paulo Cezar Mazzi

sexta-feira, 17 de junho de 2022

QUEM TEM UMA RAZÃO PARA VIVER SUPORTA QUALQUER CRUZ

 Missa do 12º dom. comum. Palavra de Deus: Zacarias 12,10-11;13,1; Gálatas 3,26-29; Lucas 9,18-24.

 

O ser humano sempre busca remédio para suas dores e resposta para suas perguntas. Quando surge uma dor ou uma pergunta, queremos nos livrar delas o quanto antes. Assim, nós procuramos por Deus porque cremos que Ele tem a cura para todas as nossas doenças, o remédio para todas as nossas dores, a resposta para todas as nossas perguntas. Mas, de vez em quando, Deus frustra nossas expectativas, e ao invés de nos irar daquela situação difícil, fecha as saídas de fuga e nos diz: “Está na hora de você enfrentar isso!”. Eis, portanto, a profecia que Ele nos faz na primeira leitura: “Derramarei sobre a casa de Davi e sobre os habitantes de Jerusalém um espírito de graça e de oração; eles olharão para mim. Ao que eles feriram de morte, hão de chorá-lo, como se chora a perda de um filho único, e hão de sentir por ele a dor que se sente pela morte de um primogênito” (Zc 12,10).  

“Eles olharão para mim”, isto é, “ao que feriram de morte”! Deus se identifica com as pessoas que sofrem e que são mortas por defenderem a vida, a verdade, a justiça, os pobres, os injustiçados, o meio ambiente... Deus entende que os nossos olhos, que muitas vezes só enxergam os nossos próprios interesses, precisam ser lavados, banhados nas lágrimas de algum tipo de dor, para que enxerguemos a realidade que está à nossa volta e que pede a nossa colaboração para ser transformada, humanizada. Foi por isso que Deus disse aos habitantes de Jerusalém: “... haverá um grande pranto... haverá uma fonte acessível... para ablução (ato de lavar) e purificação” (Zc 12,11; 13,1).

Influenciados pela “ditadura da felicidade”, nós gostaríamos de desviar o olhar daquilo que nos causa sofrimento; gostaríamos de não ter que chorar, mas Deus nos convida a encarar a dor e a chorar as feridas que estão à nossa volta, como se dissesse: “Não salte por cima da dor; escute-a e tome posição diante dela. Não ignore a sua pergunta; deixe-se inquietar por ela”.

Jesus sempre foi uma pessoa alegre, feliz, mas sua vida nunca foi uma fuga calculada para manter-se distante de todo tipo de dor. Muito pelo contrário: ele deixou-se afetar pela dor dos que sofrem. Além disso, como todo ser humano, Jesus também tinha suas dores e suas perguntas. Onde ele buscava respostas para as suas perguntas e as suas dores? Na oração: “Jesus estava rezando num lugar retirado, e os discípulos estavam com ele” (Lc 9,18). Como foi que Jesus saiu da sua oração? Ele saiu consciente de que devia sofrer muito, ser rejeitado, morrer e ressuscitar ao terceiro dia (cf. Lc 9,22)!

Há uma palavra no Evangelho segundo São Lucas que percorre a vida de Jesus, marcando sua identidade: “devo”. Essa palavra diz que existem sofrimentos que não são opcionais, mas fazem parte do caminho da vida. Se eu quiser salvar meu casamento, recuperar meu filho, crescer como pessoa, me libertar, me santificar, se eu quiser me salvar, “devo” lidar com uma determinada cruz, “devo” enfrentar uma determinada dor. Enquanto uma pessoa imatura procura orientar sua vida desviando-se do “eu devo” e buscando apenas o “eu gosto”, a pessoa madura sabe reconhecer qual é o momento em que precisa enfrentar o seu “devo”, porque ali está a sua oportunidade de ser fiel aos valores que sustentam a sua vida e que dão sentido à sua existência.   

Assim como aconteceu com Jesus, toda experiência de cruz nos coloca em crise, joga por terra as nossas certezas e nos faz questionar não só a nós mesmos, mas o próprio Deus. Nem mesmo Jesus foi poupado disso. Nem tudo era claro para Jesus, assim como não o é para nós. Há experiências de sofrimento que nos levam a questionar até mesmo se vale à pena continuar vivendo, se vale à pena continuar na missão que abraçamos, na fé que professamos, na função que desempenhamos. E assim como fez Jesus, nós precisamos aprender a fazer: nos colocar diante do Pai, na oração, e deixar que Ele nos torne conscientes a respeito da Sua vontade para a nossa vida.

A oração de Jesus nos ensina que Deus não aceita assumir o papel de anestésico em nossa vida, eliminando toda e qualquer possibilidade de dor. Quanto mais a nossa espiritualidade se reduz a uma espiritualidade de autoajuda, mais nos afastamos do verdadeiro Deus. A verdade é que ninguém chega a Deus desviando-se da sua cruz; ninguém experimenta a ressurreição ao terceiro dia sem antes de tido que lidar de uma maneira livre e responsável com o sofrimento, a rejeição por parte do mundo e a própria morte.  

            “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me. Pois quem quiser salvar sua vida, vai perdê-la...” (Lc 9,23-24). Quem quiser eliminar a dor e a pergunta que são próprias da vida vai esvaziar sua vida de sentido. Quem ceder à tentação sempre atual de eliminar o sofrimento, de cancelar a cruz, não se tornará uma pessoa madura, mas seguirá pela vida como uma pessoa infantilizada, frouxa, que espana com qualquer apertão que leva da vida.

Eis, portanto, o convite de Jesus a cada ser humano: não fuja de si mesmo; vá de encontro à sua verdade; não se faça de vítima, esperando que as pessoas sintam pena de você; não viva reclamando, achando que isso fará a vida “pegar mais leve” com você; acolha a vida com tudo o que ela tem de alegria e tristeza, vitória e derrota, luz e sombra, perda e ganho, altos e baixos; não se desvie da dor ou da cruz que cabe somente a você enfrentar, porque aquilo diz respeito ao seu crescimento, ao seu amadurecimento, à sua redenção e à sua libertação. Não busque Deus como um potente anestésico que faça você não sentir a dor da sua cruz; busque-O como força para lidar com a sua cruz.            

 

            Pe. Paulo Cezar Mazzi        

terça-feira, 14 de junho de 2022

QUEM COMUNGA O CORPO DE CRISTO DEVE "VIVER PARA"

 Missa do Corpo e Sangue do Senhor. Palavra de Deus: Gênesis 14,18-20; 1Coríntios 11,23-26; Lucas 9,11b-17.

 

Antes de falarmos da Eucaristia como sacramento, devemos falar dela como alimento. Ela é o sinal mais claro de que Deus não apenas criou o ser humano, mas que também lhe deu os meios de sobrevivência, através do alimento. “Em Ti esperam os olhos de todos e no tempo certo Tu lhes dás o alimento: abres a Tua mão e sacias todo ser vivo com fartura” (Sl 145,15-16).

O Evangelho nos mostra que Jesus nunca ignorou a necessidade das pessoas que procuravam por Ele: “Acolheu as multidões, falava-lhes sobre o Reino de Deus e curava todos os que precisavam”. Os discípulos, por sua vez, quiseram se livrar do problema da fome das multidões: “Despede a multidão, para que possa ir aos povoados e campos vizinhos procurar hospedagem e comida, pois estamos num lugar deserto”. Mas Jesus disse: “Dai-lhes vós mesmos de comer”. A fome não é apenas um problema econômico, político ou social, mas também religioso. Ela não é “natural”, mas “produzida”, “fabricada”. Ela nasce da ganância do coração de alguns: "Na terra há o suficiente para satisfazer as necessidades de todos, mas não para satisfazer a ganância de alguns" (Ghandi).

Enquanto cristãos, não podemos celebrar a Eucaristia sem levar em conta a fome que está à nossa volta. Hoje, no Brasil, apenas quatro entre dez famílias tem acesso pleno à alimentação. 33 milhões de brasileiros estão com fome diariamente! Essa fome não é acidental, mas fruto de uma política econômica que favorece quem tem muito e prejudica quem tem pouco ou quase nada. O que nós, cristãos, temos a ver com isso? A resposta está em Atos 4,32.34: “Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles (os primeiros cristãos) era comum... Não havia entre eles necessitado algum”.  A nossa postura diante da fome à nossa volta revela o que a Eucaristia significa para nós; revela se nós nos recordamos que Aquele que comungamos é o mesmo que nos dirá no julgamento: “Vinde, benditos de Deus Pai, (...) porque tive fome e me destes de comer...”, ou então “Afastai-vos de mim, malditos, (...) porque tive fome e não me destes de comer” (Mt 25,34.35.41.42).

Quando os discípulos quiseram fugir da responsabilidade de lidar com a fome da multidão, Jesus lhes disse: “Dai-lhes vós mesmos de comer”. Eles responderam: “Só temos cinco pães e dois peixes”. Quando estamos diante de situações difíceis, costumamos nos desesperar ou desanimar, dizendo: “Não temos”, “isto é pouco”, “despede-os”, “que vão eles próprios comprar”. Diante de qualquer imprevisto, olhamos para nós mesmos, medimos nossas próprias forças e nos angustiamos, ao invés de olharmos para o Pai do céu, que é a fonte inesgotável de todo dom.

Ao tomar os pães e os peixes em suas mãos, Jesus elevou os olhos ao céu, para orientar o nosso olhar para o Pai, de quem tudo recebemos. A seguir, pronunciou a bênção, para devolver aquele alimento à sua verdadeira natureza, que é o de circular, dividir-se, gerar vida, energia, convivialidade. A carência foi vencida pela generosidade e pela gratuidade. O olhar de Jesus para o céu nos lembra que “o pouco com Deus é muito, e o muito sem Deus é nada”.

Consideremos agora a Eucaristia como sacramento. O apóstolo Paulo nos fala de Jesus como “corpo doado” e “sangue derramado”. Antes de ser entregue por Judas (cf. Jo 13,11), Jesus tomou a iniciativa de ele mesmo se entregar a nós, no pão e no vinho, para que todas as vezes que comermos desse pão e bebermos desse cálice possamos proclamar que ele morreu porque nos amou até o fim. Uma vez que sua morte foi uma Páscoa, a passagem dele deste mundo para o Pai, em cada Eucaristia proclamamos a morte e a ressurreição de Jesus “até que ele venha” (1Cor 11,26) para nos fazer assentar com ele à mesa do banquete no Reino de Deus. 

Hoje, em nossas igrejas, não são poucas as pessoas que não comungam. Isso nos preocupa? O apóstolo Paulo afirma que a decisão de comungar ou não deve partir da consciência da pessoa (cf. 1Cor 11,28-29). A nós, Igreja, cabe formar bem a consciência das pessoas quanto ao significado do Corpo e do Sangue do Senhor. São corajosas e questionadoras essas palavras do Papa Francisco: “A Eucaristia... não é um prêmio para os perfeitos, mas um remédio generoso e um alimento para os fracos” (A Alegria do Evangelho, n.47). Na última ceia, Jesus se entregou como “remédio generoso” e como “alimento para os fracos” também a Judas e a Pedro, mesmo sabendo que, após a ceia, o primeiro iria traí-lo e o segundo iria negá-lo...

Sendo “corpo doado” e “sangue derramado”, Jesus sempre entendeu sua vida como vida doada aos outros, uma vida que se inclinou sobre as feridas e sobre os sofrimentos dos outros. Assim devemos fazer se queremos ser reconhecidos como discípulos de Jesus Cristo. Muitos de nós comungamos o Corpo e Sangue d’Aquele que veio para servir, mas não nos dispomos a assumir nenhum tipo de serviço em favor do Evangelho e do bem comum da sociedade. Devemos reconhecer que somos pessoas que comungam do sacrifício de Cristo, mas que às vezes achamos que não vale a pena nos sacrificar pela sociedade humana, pela verdade e pela justiça.

A existência de Jesus foi uma “existência para”. Nós, que comungamos o seu Corpo e Sangue na Eucaristia, somos chamados a “viver para”. O sentido da nossa vida não está em viver para nós mesmos, mas para aquela realidade ou para aquelas pessoas que precisam de nós.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 9 de junho de 2022

O FOGO DO AMOR NOS FOI DADO PARA COMBATER O FRIO QUE VEM DE DENTRO

 Missa da Santíssima Trindade. Palavra de Deus: Provérbios 8,22-31; Romanos 5,1-5; João 16,12-15.

 

            Existe uma história chamada “O frio que vem de dentro”. Conta-se que seis homens ficaram presos numa caverna por causa de uma avalanche de neve. Teriam que esperar até o amanhecer para receber socorro. Cada um deles trazia um pouco de lenha e havia uma pequena fogueira, ao redor da qual eles se aqueciam. Eles sabiam que, se o fogo apagasse, todos morreriam de frio, antes que o dia clareasse. Chegou a hora de cada um colocar sua lenha na fogueira. Era a única maneira de poderem sobreviver. O primeiro homem era racista. Ele olhou demoradamente para os outros cinco e descobriu que um deles tinha a pele escura. Então raciocinou consigo mesmo: “Aquele negro! Jamais darei minha lenha para aquecer um negro!”. E guardou-a, protegendo-a dos olhares dos demais. O segundo homem era um rico avarento. Ele olhou ao redor e viu um homem da montanha que trazia sua pobreza no aspecto rude do semblante e nas roupas velhas e remendadas. Ele calculava o valor da sua lenha e pensou: “Eu, dar a minha lenha para aquecer um preguiçoso, nem pensar!”. O terceiro homem era negro. Seus olhos faiscavam de ira e ressentimento. Não havia qualquer sinal de perdão ou de resignação que o sofrimento ensina. Seu pensamento era muito prático: “É bem provável que eu precise desta lenha para me defender. Além disso, eu jamais daria da minha lenha para salvar aqueles que me oprimem!”. E guardou sua lenha com cuidado. O quarto homem era um pobre da montanha. Ele conhecia mais do que os outros os caminhos, os perigos e os segredos da neve. Esse pensou: “Esta nevasca pode durar vários dias. Vou guardar minha lenha”. O quinto homem parecia alheio a tudo. Olhando fixamente para as brasas, nem lhe passou pela cabeça oferecer a lenha que carregava. Ele estava preocupado demais com seus próprios pensamentos para dar-se conta de que poderia ser útil. O último homem trazia nos vincos da testa e nas palmas calosas das mãos os sinais de uma vida de trabalho. Seu raciocínio era curto e rápido: “Esta lenha é minha. Custou o meu trabalho. Não darei a ninguém, nem mesmo o menor dos gravetos!”. Com estes pensamentos, os seis homens permaneceram imóveis. A última brasa da fogueira se cobriu de cinzas e, finalmente apagou. No alvorecer do dia, quando os homens do socorro chegaram à caverna encontraram seis cadáveres congelados, cada qual segurando um feixe de lenha. Olhando para aquele triste quadro, o chefe da equipe de socorro disse: “O frio que os matou não foi o frio de fora, mas o frio de dentro”.

Essa história retrata o nosso tempo atual, marcado por um forte individualismo, pela falta de vontade de doar-se ao outro, pela indiferença para com o próximo e pela solidão que adoece cada vez mais pessoas. Diferente dessa história, o Pai, o Filho e o Espírito Santo jamais “morreriam” de frio, porque a lenha que os três possuem consigo se chama Amor. O Pai e o Filho se amam e se aquecem mutuamente nesse amor, amor que se chama Espírito Santo. Segundo o apóstolo São Paulo, “o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5). A questão é saber se estamos deixando nos conduzir por esse amor, que é o Espírito do Pai e do Filho em nós.

O Deus em quem nós cremos nunca foi só e nunca esteve só. “No princípio”, o Filho estava com o Pai: “Tudo foi feito por meio dele e sem ele nada foi feito” (Jo 1,1.3). Essa presença escondida de Jesus junto ao Pai aparece no livro dos Provérbios como sendo a Sabedoria: “Desde a eternidade fui constituída, desde o princípio, antes das origens da terra... Eu estava ao seu lado como mestre-de-obras; eu era seu encanto, dia após dia, brincando, todo o tempo, em sua presença, brincando na superfície da terra, e alegrando-me em estar com os filhos dos homens".” (Pr 8,23.30-31). Tudo o que o Pai criou foi a partir do Filho e em vista do Filho. O Filho é o encanto do Pai e sua alegria, enquanto Filho, é estar junto aos seres humanos, seus irmãos.

O Pai entregou ao Filho a tarefa de restaurar a criação, ferida e adoecida pelo pecado. Essa restauração recebeu o nome de “justificação”. “Diante de ti, nenhum ser vivente é justo” (Sl 143,2). O Filho nos deu na sua cruz a graça da justificação. Não somos pessoas justas, impecáveis; somos pessoas justificadas, perdoadas na cruz do Filho. Portanto, se recebemos do Filho a graça da justificação, podemos estar em paz com o Pai. A graça da justificação iniciou um processo em nós: estamos destinados a participar da glória, da comunhão de vida e de amor do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

Justamente porque sabemos que estamos destinados à comunhão com o Pai, o Filho e o Espírito Santo, podemos lidar com as tribulações da vida presente com alegria e esperança, “sabendo que a tribulação gera a constância, a constância leva a uma virtude provada, a virtude provada desabrocha em esperança” (Rm 5,3-4). A tribulação não existe para nos fazer desanimar, mas para treinar em nós a constância, a capacidade da resistência, da “suportação”, como diz o Papa Francisco. Não nascemos capazes de constância, mas nos tornamos capazes dela treinando, exercitando a nossa fé. A constância supõe entender a vida como um processo que pede de nós perseverança, e não como algo que podemos mudar à força e de maneira imediata.

A constância deve gerar em nós “uma virtude comprovada”, ou seja, uma vontade firme em nos tornarmos a pessoa que o Pai nos chamou a ser: pessoas configuradas ao seu Filho. A virtude provada ou comprovada é como o arco e flecha: o arco tensiona a corda para ter força suficiente de lançar a flecha e atingir o alvo. E qual é o alvo? Ele se chama esperança – a força que nos faz transcender, ultrapassar, enxergar a vida além do aqui e do agora. Essa esperança não é humana, no sentido de que não nasce das nossas capacidades, mas sim de uma certeza: o amor do Pai e do Filho foi derramado em nossos corações. Ele se chama Espírito Santo, força do alto. Por isso, essa esperança jamais nos decepciona, porque o Espírito Santo é a garantia da nossa redenção (cf. Ef 1,13-14; 4,30).

Celebrar a nossa fé no Pai, no Filho e no Espírito Santo é também abraçar a nossa tarefa de sermos uma presença de comunhão onde há solidão, uma presença de amor onde há ódio ou indiferença, uma presença de relação onde há isolamento; numa palavra a tarefa de sermos presença onde há ausência. Há muito frio à nossa volta ameaçando matar congelados ambientes, pessoas, famílias, relacionamentos, comunidades, igrejas, cidades... Ofereçamos a lenha que a Santíssima Trindade nos deu, em vista de aquecermos com o fogo do amor tudo aquilo que está se esfriando no coração das pessoas à nossa volta.  

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 2 de junho de 2022

O SOPRO DA VIDA

 Missa de Pentecostes. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 2,1-11; Romanos 8,8-17; João 20,19-23.

 

            Jesus “soprou sobre eles e disse: ‘Recebei o Espírito Santo’” (Jo 20,22). O sopro do Ressuscitado transmite vida. No filme “As crônicas de Nárnia”, este sopro de Jesus é representado pelo Leão (Aslam), que sopra sobre todas as criaturas que a rainha do gelo havia congelado, e eles ganham vida novamente. Este sopro de Jesus nos lembra que o Espírito Santo é tão necessário para a nossa vida quanto o ar que respiramos. Sem o Espírito Santo, sem o sopro de Deus, tudo morre: “Se tirais o seu respiro, elas perecem e voltam para o pó de onde vieram. Enviais o vosso espírito e renascem e da terra toda a face renovais” (Sl 104,29-30).

            Antes de soprar sobre os discípulos, comunicando-lhes o Espírito Santo, Jesus já havia dito a Nicodemos que o Espírito Santo é como o vento (cf. Jo 3,8). No dia de Pentecostes, “veio do céu um barulho como se fosse uma forte ventania, que encheu a casa onde eles (os discípulos) se encontravam” (At 2,2). O vento traz frescor e coloca as coisas em movimento. Mas, para que possamos sentir a sua ação em nós, precisamos abrir as portas e as janelas da nossa casa, do nosso ambiente de trabalho, da nossa própria vida. Foi isso que fez o Papa São João XXIII, em 1962, ao convocar o Concílio Vaticano II: abriu as portas e janelas da Igreja para que o Espírito Santo pudesse entrar e renová-la a partir de dentro.

            O vento vem de fora. Isso significa que a nossa escuta à voz do Espírito Santo exige nos abrir à realidade. Escutar o Espírito Santo exige de nós humildade e coragem, pois ele “sopra onde quer” (Jo 3,8). Uma Igreja aberta ao Espírito Santo é uma Igreja que se deixa questionar pela realidade do mundo atual, e não uma Igreja que vive fechada em seus próprios dogmas. Não somos nós quem dizemos ao Espírito Santo onde Ele deve soprar; a nós cabe receber o vento do Espírito e nos deixar conduzir para onde Ele quer nos levar: “Todos aqueles que se deixam conduzir pelo Espírito de Deus são filhos de Deus” (Rm 8,14). Deixar-se conduzir pelo Espírito Santo é ir aonde devemos ir, e não aonde gostaríamos de ir (cf. At 20,22).

            Se o vento simboliza a presença invisível do Espírito Santo no discípulo de Jesus, sua imagem visível, no dia de Pentecostes, foram as línguas como que de fogo: “Então apareceram línguas como de fogo que se repartiram e pousaram sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito os inspirava” (At 2,3-4). O sopro emite calor. O sopro do Ressuscitado transmitiu o calor da vida nova ao coração dos discípulos. Nossas palavras nascem do sopro que sai de dentro de nós, passam pelas nossas cordas vocais e emitem sons. As palavras que o Espírito Santo transmite comunicam diálogo, entendimento, comunhão, unidade. Todo cristão que com suas palavras alimenta discursos de ódio que favorecem a polarização dentro da Igreja não é movido pelo Espírito Santo, mas pelo espírito do mal, cuja finalidade é causar divisão, discórdia e separação.

            No dia de Pentecostes, o Espírito Santo capacitou os discípulos a anunciarem as maravilhas de Deus na língua que cada pessoa podia entender (cf. At 2,11). Sem o Espírito Santo, o anúncio do Evangelho às novas gerações é totalmente ineficaz. Só o Espírito Santo pode nos dar uma linguagem adequada para anunciar Jesus Cristo às pessoas do nosso tempo, de modo que o coração delas se sinta tocado, como aconteceu com os discípulos de Emaús: “Não ardia o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, quando nos explicava as Escrituras?” (Lc 24,32).

            O Senhor Ressuscitado comunicou o Espírito Santo aos discípulos em vista de uma missão: “Como o Pai me enviou, também eu vos envio” (Jo 20,21). O Espírito Santo não é uma força de autoajuda para a nossa vida particular. Ele nos é dado em vista de uma tarefa, de uma missão: “Disse-lhes o Espírito Santo: ‘Separem para mim Barnabé e Saulo, para a obra à qual os destinei’” (At 13,2). A nossa existência é única e, por meio dela, há uma palavra única de Deus que o Espírito Santo deseja dizer à humanidade. Assim como Jesus foi ungido pelo Espírito Santo e passou por este mundo fazendo o bem (cf. At 10,38), assim a unção do Espírito Santo em nós será comprovada através do bem que pudermos fazer ao mundo no qual nos encontramos.

            Enfim, o apóstolo Paulo nos recorda de que existem duas vozes em nós: a voz do Espírito Santo e a voz da nossa carne (egoísmo). Cabe a nós escolhermos a partir de qual voz orientar as nossas atitudes (cf. Rm 8,8-9). Quem escolher viver segundo seu egoísmo, morrerá – perderá o sentido da vida –, mas quem escolher viver segundo o Espírito Santo terá sua vida plena de sentido. Além disso, quem se deixar ser conduzido pelo Espírito Santo não será dominado pelo medo, nem se sentirá sozinho neste mundo, mas terá em seu coração a certeza de pertencer a Deus como um filho amado.

            Segundo o apóstolo, o Espírito Santo garante, certifica, comprova que somos filhos de Deus, exprimindo em nós um clamor: “Abá - ó Pai!” (Rm 8,15). Esse clamor sempre esteve no coração e dos lábios de Jesus, dando-lhe a certeza de que o Pai sempre esteve presente em sua vida. Da mesma forma, o Espírito Santo afasta de nós o sentimento de solidão e de orfandade, fazendo-nos sentir amados e cuidados pelo Pai. Além disso, o Espírito Santo nos faz experimentar Jesus não como uma memória do passado, mas como uma presença atual, viva, dentro de nós, garantindo que, sofrendo com Cristo, nós também seremos glorificados com Ele junto do Pai.

            Especialmente neste dia de Pentecostes, clamemos ao Espírito Santo: “Espírito de Deus, enviai dos céus um raio de luz!  Vinde, Pai dos pobres, dai aos corações vossos sete dons. Consolo que acalma, hóspede da alma, doce alívio, vinde! No labor descanso, na aflição remanso, no calor aragem. Enchei, luz bendita, chama que crepita, o íntimo de nós! Sem a luz que acode, nada o homem pode, nenhum bem há nele. Ao sujo lavai, ao seco regai, curai o doente. Dobrai o que é duro, guiai no escuro, o frio aquecei. Dai à vossa Igreja, que espera e deseja, vossos sete dons. Dai em prêmio ao forte uma santa morte, alegria eterna. Amém” (Sequência de Pentecostes).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi