sexta-feira, 24 de junho de 2022

A INDECISÃO APRISIONA; A DECISÃO LIBERTA

 Missa do 13. dom. comum. Palavra de Deus: 1Reis 19,16b.19-21; Gálatas 5,1.13-18; Lucas 9,51-62

 

            Estava chegando a hora de Jesus enfrentar a sua cruz. “Então ele tomou a firme decisão de partir para Jerusalém” (Lc 9,51). Sempre que precisamos enfrentar uma situação difícil, a nossa tendência é adiar a decisão o máximo possível. O medo e a insegurança nos paralisam, e passamos a adiar a decisão até o último momento. O problema é que o custo emocional disso é muito alto. Nós gastamos mais energia emocional sofrendo com a nossa indecisão do que tomando a decisão de enfrentar aquilo que estamos sendo chamados a enfrentar. Se fôssemos firmes em nossas decisões, experimentaríamos a libertação do medo, da angústia e da ansiedade. A decisão firme sempre nos liberta, ao passo que a indecisão nos mantém aprisionados.

            Aquilo que mais nos atrapalha em sermos firmes em nossa decisão é o medo quanto ao futuro. Queremos garantias de que a decisão que vamos tomar será bem sucedida e não nos arrependeremos dela. No entanto, essas garantias não existem. A única coisa que nos ajuda na decisão é tomá-la baseando-nos no nosso “eu devo”, libertando-nos do nosso “eu gostaria” ou “eu quero”. Jesus não tomou a firme decisão de ir de encontro à sua cruz movido pelo desejo de sofrer, mas movido pelo seu dever de salvar a humanidade, ainda que tal salvação tivesse como preço a cruz.

            Muitas pessoas estão adoecendo emocional ou fisicamente por não terem a coragem de tomar as decisões que sabem ser necessárias para sua vida. Elas se deixam aprisionar no medo de perder suas falsas seguranças ou suas falsas compensações, e com isso acabam por perder tudo: dinheiro, saúde, paz, liberdade, alegria, qualidade de vida. Por não aceitarem pagar o preço das consequências de suas decisões, acabam por pagar um preço ainda maior, que é, em alguns casos, a destruição de si mesmas, de seus sonhos, de seu futuro.

            A decisão de Jesus de ir para Jerusalém esbarrou num primeiro obstáculo: alguns samaritanos não permitiram que ele passasse pela aldeia deles, pois judeus e samaritanos eram inimigos, naquela época. Tomando as dores de Jesus, Tiago e João se dispuseram a eliminar o obstáculo com violência destrutiva: mandar descer fogo do céu sobre os samaritanos!!! No entanto, Jesus rejeitou firmemente a proposta dos dois discípulos, mudou seu trajeto e prosseguiu sua viagem para Jerusalém.

            Não podemos nos iludir: ainda que nossa decisão seja firme, os caminhos não vão se abrir facilmente diante de nós. Se a decisão firme nos liberta interiormente de obstáculos como o medo e a insegurança, ela não elimina os obstáculos externos. Não é porque decidimos caminhar segundo a vontade de Deus que Ele mesmo eliminará todas as pedras do nosso caminho. Os obstáculos estarão ali exatamente para comprovar se, de fato, estamos firmes naquilo que decidimos fazer. Além disso, quem se decide por Deus, enfrentará muito mais obstáculos, pois o mundo sempre se oporá àqueles que desejam ser de Deus.  

            Jesus deseja nos tornar pessoas verdadeiramente livres (cf. Gl 5,1), mas nós nem sempre queremos essa liberdade, pois, para experimentá-la, temos que tomar a decisão de nos orientar na vida pela voz do Espírito de Deus, e não pela voz do nosso ego (carne). Enquanto o nosso ego entende a liberdade como “fazer o que quer, o que deseja, o que é do seu interesse”, o Espírito de Deus entende a liberdade como “fazer o que fomos chamados a fazer, a partir da nossa vocação”. Justamente porque somos interiormente livres, cabe a nós decidir a quem dar ouvidos: se à voz do Espírito de Deus ou se à voz do nosso ego (carne). Ainda que muitos costumam abrir mão da responsabilidade por suas escolhas e decisões, alegando que “a carne” é mais forte do que elas, essa falsa justificativa não convence, pois “tudo pode ser tirado de uma pessoa, menos uma coisa: a liberdade de escolher sua atitude em qualquer circunstância da vida” (Victor Frankl).

            Diante da circunstância negativa – a proibição de passar pela aldeia dos samaritanos – Jesus usou sua liberdade e escolheu a atitude de mudar de rota, sem desviar-se da sua meta, que era chegar a Jerusalém. Ele não usou a circunstância negativa como desculpa para si mesmo ou para o Pai, alegando que tentou encarar sua cruz, mas foi “impedido” pelas circunstâncias... Só quem é interiormente livre e leva a sério sua própria existência pode ser firme diante de suas próprias desculpas em não agir como deve, como a vida está lhe pedindo que aja, naquele momento.   

            Enquanto estava caminhando para Jerusalém com seus discípulos, Jesus se deparou com três pessoas. A primeira se dispôs a segui-lo livre e incondicionalmente, mas ele a alertou: “Não espere de mim segurança, bem-estar e vida fácil!”. À segunda pessoa, que condicionou o seu seguimento ao “enterro” do seu pai, Jesus lançou o desafio de abraçar a tarefa de cuidar da vida, não da morte. À terceira pessoa, que também condicionou seu seguimento à despedida da sua família, Jesus foi claro em dizer que não se caminha para o futuro mantendo-se agarrado ao passado.   

            No diálogo de Jesus com essas três pessoas, entra novamente a questão da liberdade e da decisão. Quem se move na vida pelo desejo de garantir seu bem-estar não toma a decisão que precisa, justamente porque o preço dela é a perda do bem-estar. Além disso, quem fica chorando aquilo que vai perder, ao tomar a decisão que precisa tomar, escolhe morrer e não viver. Por incrível que pareça, essa escolha é a mais comum! Muitos preferem morrer aprisionados ao seu pecado, ao seu vício, do que experimentar uma vida verdadeira, porém privada dos efeitos “compensatórios” do veneno que os estava matando. Enfim, quem sonha com um futuro diferente, mas não tem a coragem de romper definitivamente com aquilo que precisa deixar para trás, condena sua vida a uma rotina insuportável, sem horizonte, sem futuro, sem sentido.

            Que tenhamos a coragem de reconhecer qual decisão precisamos encarar e efetivar, para que nossa vida se torne a vida que Deus deseja para nós.

 

            Pe. Paulo Cezar Mazzi

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