Missa do 27. dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 5,1-7; Filipenses 4,6-9; Mateus 21,33-43
“Não deixarei as nuvens derramar a
chuva sobre ela” (Is 5,6). Este ano estamos sentindo de maneira mais agressiva
os efeitos do aquecimento global: uma estiagem mais severa, a ausência de
chuvas, as temperaturas mais altas; até mesmo o Pantanal – a região mais úmida
do Planeta! – está queimando, o que antes era impossível; uma situação agravada
pela desmatamento da Amazônia, o qual aumentou gravemente a partir das ações do
Governo de enfraquecer o Ibama na sua função de fiscalizar e punir os que desmatam
e provocam incêndios; tudo isso em nome do lucro de pessoas gananciosas.
“Não
deixarei as nuvens derramar a chuva sobre ela” (Is 5,6). Por que Deus tomou
essa decisão tão drástica para com a sua vinha? Por que ela não aceitou mais
ser cuidada por Ele. Ora, se você perguntar a uma pessoa se ela gostaria de ser
cuidada por Deus, certamente lhe dirá que sim, mas quem é que hoje aceita ser
orientado pela Palavra de Deus? Quem aceita ouvir os profetas que falam em nome
de Deus? Quem aceita sofrer as podas, as correções, a colocação de limites
imposta por Deus, para o próprio bem do ser humano?
Quando
a humanidade decide livrar-se da dependência em relação a Deus para viver uma
vida livre de poda, de cerca, de muro, de torre de vigia, o resultado só pode
ser este: “Vou desmanchar a cerca, e ela será devastada; vou derrubar o muro, e
ela será pisoteada. Vou deixá-la inculta e selvagem: ela não terá poda nem
lavra, espinhos e sarças tomarão conta dela; não deixarei as nuvens derramar a
chuva sobre ela” (Is 5,5-6). Quantas pessoas você conhece que se parecem com
uma vinha devastada, pisoteada, tomada por espinhos e mato, secando e morrendo,
por falta de chuva? Essa situação não é provocada por Deus, mas escolhida pela
própria pessoa. Ela é consequência da nossa decisão em seguir pela vida movidos
pelos nossos interesses egoístas, mesmo sabendo que tais interesses produzem
destruição para nós mesmos, para os outros e para o Planeta.
Nossa
Igreja sempre levantou a voz para defender a Amazônia e o meio ambiente. Essa
mesma Igreja tem levantado a sua voz para denunciar o abuso de uma economia de
mercado que destrói o ser humano e o Planeta, mas essa voz tem sido atacada até
mesmo por católicos de dentro da nossa Igreja, católicos que agem exatamente
como os sumos sacerdotes e os anciãos agiam na época de Jesus, atacando os
profetas. Esse ataque não é físico; é o ataque da não escuta, da rejeição aos
nossos bispos, tachados que “comunistas” quando levantam a sua voz profética
para denunciar as injustiças sociais e a destruição do meio ambiente. As redes
sociais são o campo preferido desses católicos que querem os profetas “fora da
Igreja”.
“Então
agarraram o filho, jogaram-no para fora da vinha e o mataram” (Mt 21,39). Que o
mundo rejeite Deus e sua palavra profética é compreensível e esperado, mas que
pessoas cristãs combatam a profecia dentro da Igreja, isso revela a grave inversão
de valores que estamos permitindo que corrompa a nossa consciência e nos faça
defender aqueles que provocam a morte e atacar aqueles que defendem a vida. Não
é de admirar que Deus esteja decepcionado com muitos cristãos do nosso tempo: “Esperava
que ela produzisse uvas boas, mas produziu uvas selvagens... Eu esperava deles
frutos de justiça - e eis injustiça; esperava obras de bondade - e eis iniquidade”
(Is 5,2.7).
Os frutos são a imagem bíblica do
nosso comportamento, das nossas atitudes. Que atitudes podemos ter diante do
desmatamento? Quem de nós se dedica ao cultivo de uma árvore, à preservação do
meio ambiente à nossa volta? Quem de nós expressa o seu protesto diante das
políticas de desproteção do meio ambiente do atual Governo? O nosso egoísmo e o
nosso individualismo enquanto povo brasileiro está nos matando como filhos e
como irmãos, e nós não estamos nos dando conta de que a destruição do outro – incluindo
o meio ambiente – produz destruição para nós mesmos. Portanto, as mesmas mãos
que se levantam em oração para suplicar chuva também precisam agir em favor do
Planeta, também precisam lutar pela defesa da Amazônia, do Pantanal, do meio
ambiente.
Algumas palavras do Papa Francisco*
sobre o cuidado com a nossa “casa comum”:
1. Explorar
a criação: isso é pecado. Acreditamos que estamos no centro,
fingindo ocupar o lugar de Deus e, assim, arruinamos a harmonia da criação, a
harmonia do desígnio de Deus. Tornamo-nos predadores, esquecendo a nossa
vocação de guardiões da vida. É claro, podemos e devemos trabalhar a terra para
viver e nos desenvolver. Mas o trabalho não é sinônimo de exploração e vem
sempre acompanhado do cuidado: arar e proteger, trabalhar e cuidar... Essa
é a nossa missão (cf. Gn 2,15).
2. Não
podemos esperar continuar crescendo em nível material, sem cuidarmos da casa comum que nos acolhe. Os nossos irmãos mais
pobres e a nossa mãe terra gemem pelos danos e injustiças que provocamos e
exigem outra rota. Exigem de nós uma conversão, uma mudança de rumo: cuidar
também da terra, da criação. Portanto, é importante recuperar a dimensão
contemplativa, ou seja, olhar a terra, a criação como um dom, não como algo a ser explorado
pelo lucro. Quando contemplamos, descobrimos nos outros e na natureza algo
muito maior do que a sua utilidade.
3. Muitas
vezes, a nossa relação com a criação parece uma relação entre inimigos:
destruir a criação em meu benefício; explorar a criação em minha vantagem. Não
nos esqueçamos de que se paga caro por isso. Não esqueçamos daquele ditado: “Deus
perdoa sempre; nós perdoamos às vezes; a natureza não perdoa nunca”. Cada um de
nós pode e deve se tornar um “guardião da casa comum”, capaz de louvar a Deus
pelas suas criaturas, de contemplar as criaturas e de protegê-las.
* “Cuidado da casa
comum e atitude contemplativa”, a partir da leitura de Gênesis 2.8-9.15.
Eis,
portanto, a nossa súplica: “Voltai-vos para nós, Deus do universo! Olhai dos
altos céus e observai. Visitai a vossa vinha e protegei-a! Foi a vossa mão
direita que a plantou; protegei-a, e ao rebento que firmastes! E nunca mais vos
deixaremos, Senhor Deus! Dai-nos vida, e louvaremos vosso nome! Convertei-nos,
ó Senhor Deus do universo, e sobre nós iluminai a vossa face! Se voltardes para
nós, seremos salvos!” (Sl 80).
Pe. Paulo Cezar Mazzi