Missa
do 24. dom. comum. Palavra de Deus: Eclesiástico 27,33 – 28,9; Romanos 14,7-9;
Mateus 18,21-35.
“A
maldade crescerá a tal ponto no mundo que o amor se esfriará no coração de
muitas pessoas. Mas aquele que perseverar até o fim, esse será salvo” (Mt 24,12-13).
Essas palavras de Jesus, além de retratarem muito bem a época em que estamos
vivendo, nos alertam para o perigo de nos tornarmos duros de coração, ou seja,
pessoas que não apenas desistiram de amar, de crer na bondade do ser humano,
mas também desistiram de perdoar, pois parece que a única coisa que o perdão faz
é alimentar a sensação de impunidade.
Ao
falar sobre a necessidade do perdão, Jesus não está defendendo de forma alguma
a impunidade, mas nos tornando conscientes de que, na história de todos nós, o
perdão foi, é e sempre será necessário. Não há ser humano que nunca cometa
algum erro, ou que, ao longo da vida, nunca prejudique ou machuque alguém, intencionalmente
ou não. Portanto, não há ser humano que não necessite ser perdoado. Essa é a
consciência do salmista, quando ora a Deus: “Se levardes em conta as nossas faltas,
quem haverá de subsistir? Mas em vós se encontra o perdão” (Sl 130,3-4). Justamente
porque em Deus se encontra o perdão, nós também nos unimos ao salmista para bendizê-Lo
– dizer o bem que o Seu perdão nos faz!: “Pois ele te perdoa toda culpa, e cura
toda a tua enfermidade; da sepultura ele salva a tua vida e te cerca de carinho
e compaixão” (Sl 103,3-4).
O
perdão que recebemos de Deus na cruz de seu Filho (cf. Ef 1,7; Cl 1,20) nos fez
um imenso bem: curou as nossas feridas. Mas, enquanto o perdão cura, a falta de
perdão adoece, como nos ensina o Eclesiástico: “Se alguém guarda raiva contra o
outro, como poderá pedir a Deus a cura?” (28,3). Aqui é importante nos darmos
conta de que o autor bíblico não afirmou que quando sentimos raiva,
adoecemos; nós adoecemos quando guardamos raiva, ou seja, quando, todos
os dias, alimentamos sentimento de raiva em relação à pessoa que nos prejudicou
ou nos ofendeu. É impossível não sentirmos raiva de alguém que peca contra nós.
A raiva é uma defesa natural, instintiva nossa, para nos proteger da pessoa que
nos agride. Porém, quando decidimos prender a pessoa na nossa raiva, ela não
sai mais de nós, e aquela presença venenosa nos adoece. Como se diz: “Guardar
ressentimento é como tomar veneno e esperar que a outra pessoa morra” (autor
desconhecido).
“Perdoa
a injustiça cometida por teu próximo: assim, quando orares, teus pecados serão
perdoados” (Eclo 28,2). Se nós necessitamos ser perdoados por Deus é porque
somos falhos. Aliás, se o próprio Jesus colocou na oração do Pai nosso o pedido
de perdão – “perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos
tem ofendido” (Mt 6,12) – lembrando que é nessa mesma oração que pedimos ao Pai
“o pão nosso de cada dia”, isso significa que o perdão é algo que deve fazer
parte do nosso cotidiano. Diariamente nós podemos cometer algum erro, assim
como diariamente alguém pode “pisar na bola” conosco. Daí a necessidade diária do
perdão.
Ainda
a respeito do perdão, o Eclesiástico nos aconselha: “Lembra-te do teu fim e
deixa de odiar” (28,6). Nossa vida terrena é muito curta para ser estragada pelo
ressentimento da raiva, da mágoa ou do ódio. Essa importância exagerada que
damos à ferida que o outro abriu em nós é totalmente desproporcional à duração
da nossa vida neste mundo. A vida é curta demais para vivermos em função de
mágoas em relação ao passado. Por isso, o melhor que temos a fazer é perdoar,
para que nossa vida volte a fluir, para que possamos dormir melhor e termos
saúde física, psíquica e espiritual.
Para
nos mostrar o quanto a nossa decisão em não perdoar a pessoa que nos feriu é
insensata, Jesus faz a comparação entre dois tipos de dívidas ou de prejuízos:
uma enorme e outra insignificante. O homem que devia uma quantia enorme teve
sua dívida perdoada, justamente porque não tinha como pagá-la! No entanto, esse
mesmo homem decidiu não perdoar a dívida insignificante que seu amigo tinha
para com ele, jogando-o na prisão “até que pagasse o que devia” (Mt 18,30). A dívida
impagável são os nossos pecados, perdoados por Deus; a dívida insignificante são
as ofensas do nosso próximo, ofensas que nos recusamos a perdoar. Para quem
acha que tem toda razão em não perdoar, o Evangelho faz um alerta: essa pessoa
será entregue aos torturadores, até que pague toda a sua dívida (Mt 18,34). Portanto,
quando eu decido não perdoar, entrego-me aos torturadores: sou torturado diariamente
pelo ódio, pela mágoa, pelo ressentimento, pelo rancor, pela não aceitação do
que me aconteceu.
Jesus
conclui o Evangelho de hoje nos tornando cientes disso: “É assim que o meu Pai
que está nos céus fará convosco, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão”
(Mt 18,35). “A decisão em não perdoar nos exclui do Pai, porque destrói em nós
o nosso ser filhos. Na medida em que decidimos não perdoar, fazemos morrer em nós
o perdão que recebemos de Deus. Perdoar é uma questão de coração. É não recordar,
não manter no coração o mal que o irmão cometeu, mas recordar o amor que o Pai
tem por mim e por ele” (Pe. Pagola).
Senhor
Jesus Cristo, Tu me convidas a permitir que a minha vida destrave e volte a fluir,
por meio do perdão. Liberta-me da prisão do ressentimento. Que eu saiba me defender
das pessoas sem tornar-me uma pessoa desumana. Que eu combata o mal que há no
mundo perseverando na força do Teu amor e confiando no perdão como remédio
poderoso para curar os males dos desencontros humanos. Amém.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
Nenhum comentário:
Postar um comentário