quarta-feira, 18 de setembro de 2019

QUANDO UM FILHO SE SUICIDA



            Até onde pode ir o controle dos pais sobre a vida dos filhos, isto é, sobre as escolhas que o filho decide fazer e as decisões que decide tomar? Não há dúvida de que pais que amam seus filhos fazem tudo – dão o sangue, a própria vida – pelo bem dos filhos. No entanto, os filhos aos poucos vão crescendo, ganhando certa independência e exigindo certa autonomia para fazerem suas próprias escolhas e tomarem suas próprias decisões. Nesse caso, o máximo que os pais podem fazer é confiar na educação que deram aos filhos e nos valores que lhes transmitiram, valores que formaram suas consciências e que os ajudarão na vida a escolher o bem e rejeitar o mal.
            A partir da adolescência, as mãos dos pais vão se sentindo pequenas demais para “conter” nelas o filho que foi gerado. São mãos que certamente estarão estendidas para ajudar o filho sempre que ele precisar, mas essas mesmas mãos não têm como funcionar na vida do filho como se fossem uma “redoma de vidro” capaz de reguardá-lo da vida e do mundo, mesmo porque o filho se sentiria sufocado dentro dessa redoma. Portanto, os pais precisam aceitar o fato de que naturalmente o filho saia de suas mãos, e comece a dar passos no caminho da sua própria vida, na construção de si mesmo como pessoa.
            Quando ocorre a tragédia do suicídio, inúmeras perguntam enchem a cabeça e o coração dos pais. Eles poderiam ter evitado que o filho se suicidasse? Eles falharam em alguma coisa em relação a ele? Na verdade, as perguntas que surgem e não param de gritar dentro do coração dos pais são uma tentativa de encontrar uma explicação para o suicídio do filho, uma explicação às vezes muito perigosa e destrutiva, porque pode encher o coração dos pais do veneno de uma culpa e de uma responsabilidade que eles não têm perante as escolhas e as decisões do filho.
            Nenhum filho é resultado daquilo que recebe dos pais, seja positivamente, seja negativamente. Todo filho é resultado daquilo que escolhe fazer com aquilo que recebe dos pais. Isso fica claro quando, de dois filhos, um cai nas drogas, o outro não; um vai para a criminalidade, o outro não; um suporta levar pancadas e não se quebra facilmente, o outro se quebra diante de qualquer abalo que sofre... Cada filho tem sua própria personalidade, sua liberdade e sua consciência...
            Por falar em consciência, eis aí um lugar onde ninguém pode entrar: somente a própria pessoa. Por mais que os pais orientem seus filhos, há em cada filho um espaço sagrado chamado consciência. Ali nós estamos sozinhos, mas ali também ouvimos duas vozes falarem conosco: a voz de Deus e a voz do mau espírito. Enquanto a voz de Deus sempre vai nos sugerir atitudes que favoreçam a vida para nós e para o mundo à nossa volta, a voz do maligno vai nos sugerir o contrário. A decisão final sempre será nossa porque, como afirmou Victor Frankl, “tudo pode ser tirado de uma pessoa, exceto uma coisa: a liberdade de escolher sua atitude em qualquer circunstância da vida”.
            No entanto, existe algo que pode comprometer a liberdade da pessoa: seu estado de saúde mental. O suicídio não é simplesmente um problema de falta de fé, de falta de Deus, mas um problema de saúde mental. Quando uma pessoa está com algum comprometimento na sua saúde mental, sua liberdade de escolha fica afetada, e ela não tem como ser totalmente responsabilizada por seus atos. Como alguém disse: a pessoa que se suicida quer acabar com a dor psicológica que está sentindo, não com a própria vida.
            Pais que tiveram que lidar com essa tragédia do suicídio de um filho precisam lembrar-se dessa palavra de Jesus: As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem. Eu dou-lhes a vida eterna e elas jamais se perderão. E ninguém vai arrancá-las de minha mão. Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai” (Jo 10,27-29). As mãos dos pais nunca terão poder suficiente para impedir um filho de se suicidar, mas os pais cristãos podem confiar a vida de cada filho às mãos de Deus e de seu Filho Jesus, pois ninguém, nem mesmo o mal do suicídio, pode arrancar o filho dessas mãos, mãos que foram crucificadas, mãos que experimentaram a morte, mãos que ressuscitaram, mãos que têm consigo as chaves da morte, mãos às quais cada um de nós é chamado a se confiar diariamente.

Pe. Paulo Cezar Mazzi


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