sexta-feira, 20 de setembro de 2019

LIBERTOS, NÃO "POSSUÍDOS"

Missa do 25º. dom. comum. Palavra de Deus: Amós 8,4-7; 1Timóteo 2,1-8; Lucas 16,1-13.

As três maiores religiões do mundo atual são o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. As três têm em comum a crença num único Deus. Além delas, existem muitas outras religiões que não daria para nomear aqui. O que importa ressaltar é que, apesar da diversidade religiosa dos nossos tempos atuais, e apesar daqueles que não professam fé alguma, isto é, não praticam nenhuma religião, existe uma “religião” que se impõe sobre todos os habitantes da terra: a religião do Mercado, cujo “deus” é o dinheiro. Esse ídolo que tomou o lugar de Deus na consciência e nas atitudes de muitas pessoas é visto como tão essencial que tê-lo significa de certa forma estar “garantido”; não tê-lo significa estar literalmente “perdido”.
No entanto, a Sagrada Escritura nos alerta para as consequências desastrosas do culto ao “deus dinheiro”. Vamos lembrar aqui apenas um desses alertas: “Os que desejam enriquecer, caem em tentação e armadilhas, em muitos desejos loucos e perniciosos que afundam os homens na perdição e na ruína. A raiz de todos os males é a cobiça do dinheiro. Por se terem deixado levar por ela, muitos se extraviaram da fé e se atormentam a si mesmos com muitos sofrimentos” (1Tm 6,9-10). Eis, portanto, algumas consequências na vida de pessoas que têm uma dependência excessiva e doentia em relação aos bens materiais: ansiedade, insônia, depressão, suicídio, separação de casais, terceirização dos filhos, distanciamento dos pais em relação aos filhos, perda de valores como honestidade, fidelidade; inversão de valores (o bem aparente torna-se mais importante que o bem real), corrupção; enfim, a consciência é posta à venda, ou mesmo jogada no lixo.
Jesus quer que nos identifiquemos com o “administrador” que aparece na parábola que acaba de nos contar. Cada um de nós é administrador da própria vida, e embora vivamos num mundo marcado por um forte individualismo, Jesus nos convida a administrar os bens materiais no sentido de ajudar a diminuir as injustiças sociais. Para Jesus, tudo aquilo que acumulamos é fruto de injustiça. Quando entramos na dinâmica de ganhar sempre mais e de viver sempre melhor, o dinheiro termina substituindo Deus em nossa vida e exigindo de nós uma submissão absoluta. Com isso, deixamos de lado a solidariedade e passamos a dar prioridade aos nossos interesses particulares.
Mas, de onde vem essa “necessidade” de possuir mais? Ela nasce da nossa insegurança: queremos nos garantir na vida; queremos assegurar o nosso futuro. Mas cometemos um grave erro: quanto mais coisas possuímos, tanto mais cresce nossa preocupação. Na verdade, nós acabamos nos tornando pessoas “possuídas” pelo medo de perder o que ganhamos ou conquistamos. Então, para nos livrar dessa “possessão”, Jesus nos coloca diante de palavras que nos remetem para o Juízo Final: “Presta contas da tua administração” (Lc 16,2). “Todos nós compareceremos perante o tribunal de Deus” (Rm 14,10), quando, então, Ele nos perguntará como administramos a nossa vida terrena. Portanto, o destino do nosso futuro começa a ser construído agora, na maneira como estamos administrando a nossa vida presente.
Embora muitos desejem garantir seu futuro por meio do acúmulo de bens materiais, Jesus entende o futuro como sendo a nossa salvação. Se é verdade que nenhum homem pode salvar-se a si mesmo, pode, certamente, fazer algo em vista da sua salvação. É no momento presente que precisamos procurar pela nossa salvação futura, quando a morte nos fará passar da administração dos que Deus nos concedeu temporariamente para o bem verdadeiro, que é a Vida eterna, Vida que aparece simbolizada na parábola por uma casa. Quando tivermos deixado nossa casa terrena, necessitaremos ser acolhidos na casa celeste que, segundo Jesus, é a casa daquelas pessoas que nós ajudamos na terra.
Jesus quer que sejamos “espertos” em relação à nossa salvação. Neste sentido, ele nos faz uma provocação: “os filhos deste mundo são mais espertos em seus negócios do que os filhos da luz” (Lc 16,8). Para ganhar dinheiro, algumas pessoas não medem esforços e sacrifícios, enquanto que nós, cristãos, para ganharmos a Vida eterna, parecemos não ter a mesma disposição em nos esforçar e nos sacrificar... Além disso, uma vez que todos nós vivemos num mundo onde o dinheiro é o motor principal da sobrevivência, Jesus nos lança um desafio: “Usem o dinheiro injusto para fazer amigos, pois, quando ele acabar, eles receberão vocês nas moradas eternas” (Lc 16,9). Segundo Jesus, o dinheiro é “injusto” não quando conseguido de maneira ilícita, mas simplesmente por se tratar de dinheiro! Portanto, até para as pessoas honestas o dinheiro é um ídolo: ele prende o homem a seus bens materiais e alimenta seu egoísmo ou seu instinto de dominação. A única maneira de nos livrarmos do perigo das riquezas em relação à salvação é destiná-las às obras de caridade, socorrendo os necessitados.  
Eis, portanto, o alerta de Jesus para nós, que vivemos neste mundo profundamente materialista: todo dinheiro é “injusto” porque convida à posse e ao acúmulo, contrários à vontade do Pai. Assim como acumular nos torna inimigos de Deus e dos irmãos, a redistribuição nos faz amigos de Deus e dos irmãos. Toda pessoa que se dispõe a seguir Jesus não pode fazer qualquer coisa com o dinheiro: há um modo de ganhar dinheiro, de gastá-lo e de desfrutá-lo que é injusto, porque esquece os mais pobres! Lembremos, enfim, dessa verdade anunciada por São Basílio de Cesareia há séculos atrás: “Se cada um tirasse para si o que lhe é necessário e entregasse aos indigentes o que sobra, ninguém seria rico, ninguém seria pobre”.

ORAÇÃO:

Deus Pai, teu Filho Jesus nos ensinou a confiar em Ti, pois o pai sabe aquilo que o filho precisa. Vivendo neste mundo materialista, competitivo, desigual e injusto, quero te pedir principalmente duas coisas: afasta de mim a falsidade e a mentira; não te peço nem riqueza, nem pobreza, mas apenas que me concedas o meu pão de cada dia. Que eu não me torne uma pessoa materialmente tão rica que ache que não precisa de Ti; ao mesmo tempo, que eu não me torne alguém tão pobre e miserável que precise roubar para sobreviver.

Entrego em tuas mãos minhas necessidades materiais, emocionais e espirituais. Livra meu coração do apego exagerado e doentio ao dinheiro. Quero ser como teu Filho Jesus: uma pessoa atenta às necessidades dos pobres, dedicada a fazer a minha parte para que este mundo se torne menos desigual e menos injusto. Enfim, que eu jamais descuide da minha salvação, administrando minha breve vida neste mundo com o meu coração e minha consciência diariamente voltados para Ti e para a tua vontade. Amém!


Pe. Paulo Cezar Mazzi

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