Missa da Santíssima
Trindade. Palavra de Deus: Provérbios 8,22-31; Romanos 5,1-5; João 16,12-15.
O que nós, seres humanos, temos
construído mais: muros ou pontes? Nós construímos muros quando nos sentimos
ameaçados, quando queremos nos proteger, nos distanciar, nos isolar, não sermos
incomodados, perturbados etc. Nós construímos pontes quando queremos nos
aproximar, criar laços, conviver, estar com os outros, nos envolver com o que
acontece à nossa volta. Se pararmos para observar o mundo em que vivemos, o
mundo que estamos ajudando a construir, vamos perceber que nele há muito mais
muros do que pontes: há muito mais medo do que confiança, muito mais separação
e isolamento do que convivência e comunhão, muitos mais ódio do que tolerância,
muito mais inimizade do que amizade, muito mais indiferença do que compaixão
para com quem sofre...
Onde estão esses muros? Eles estão,
em primeiro lugar, dentro das casas, no seio das famílias: pessoas que habitam
sob o mesmo teto, mas não dialogam, não partilham seus sentimentos, não se dão
conta do que se passa com o outro, cada um com o olhar hipnotizado na tela de
um celular, computador, smartfone etc. Além disso, esses muros estão em nosso
ambiente de trabalho, onde tentamos sobreviver em meio a antipatias,
inimizades, armadilhas, trapaças etc. Esses muros estão em nossa própria
comunidade de fé, onde não nos importamos em saber quem é e como está a pessoa
que se sentou ao nosso lado. Esses muros estão até mesmo nas redes sociais, lugar
onde expressamos nosso ódio e nossa intolerância em relação àqueles que pensam
diferente de nós.
Embora muitas pessoas estejam
convencidas de que, para sobreviver no mundo de hoje, muros são muito mais necessários
do que pontes, profissionais da saúde (médicos, psiquiatras, psicólogos etc) e
pessoas que lidam com o espiritual (padres, pastores etc) constatam que nunca como
hoje as pessoas estiveram tão doentes: depressivas, ansiosas, com distúrbios
mentais, sem esperança e sem sentido para a vida. Em outras palavras, os muros
favorecem o surgimento de doenças em nós, ao passo que as pontes podem nos
trazer cura.
Os textos bíblicos que ouvimos hoje
nos falam da “casa” de Deus, uma casa onde habitam três Pessoas; o Pai, o Filho
e o Espírito Santo. Nesta “casa” não existem muros, nem fora, muito menos
dentro dela; pelo contrário, nela só existem pontes. Em primeiro lugar, há uma
ponte eterna que sempre ligou o Pai ao Filho e o Filho ao Pai: uma ponte
chamada Espírito Santo. O Pai ama o Filho; o Filho ama o Pai, e o amor que os
une, que os mantém em comunhão, é o próprio Espírito Santo, amor que, como afirma
hoje o apóstolo Paulo, foi derramado em nossos corações! (cf. Rm 5,5).
Deus nunca foi muro; Ele sempre foi
ponte. Deus nunca foi só; Ele sempre foi Pai que nos criou, Filho que nos
salvou e Espírito Santo que nos sustentou. Justamente por isso, ao criar o ser
humano, Deus disse: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança” (Gn 1,26), e
não “Faço... à minha imagem...” (Ele usou o plural, não o singular). Além disso,
Deus disse: “Não é bom que o homem esteja só” (Gn 2,18). Não é bom quando
deixamos de construir pontes e passamos a construir muros. Não é bom quando nos
isolamos, nos mantemos distantes das pessoas, nos fechamos em nosso quarto, em
nossa casa, em nosso mundo virtual, como se não fizéssemos parte da humanidade
e como se estivéssemos totalmente protegidos do que acontece lá fora.
Justamente pelo fato de Deus ser
ponte e não muro, Ele enviou seu Filho ao mundo, para procurar e salvar todo
ser humano que estava perdido. O Filho, por sua vez, após ter concluído a obra
da redenção do ser humano, voltou para o seio do Pai e de lá nos enviou o
Espírito Santo, para ser o nosso Consolador, Aquele que nos sustenta com Sua
força, até que possamos concluir o nosso caminho na terra, atravessar a ponte e
chegar à “casa” celeste, onde habitam o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Portanto,
segundo o apóstolo Paulo, essa é a nossa condição atual: apesar das tantas
tribulações que temos neste mundo, “estamos em paz com Deus, pela mediação do
Senhor nosso, Jesus Cristo” (Rm 5,1). Por isso, podemos entender essas
tribulações como um processo de amadurecimento espiritual, “sabendo que a tribulação
gera a constância, a constância leva a uma virtude provada, a virtude provada
desabrocha em esperança; e a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi
derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,3-5).
Assim como a Sagrada Escritura nos
revelou que Deus é Pai, Filho e Espírito Santo, ela também nos revelou que a
história da salvação, na qual estamos incluídos, é feita de três etapas ou três
tempos: no Antigo Testamento encontramos a revelação do Pai, o tempo em que o
Pai fala com a humanidade a partir do povo de Israel; no Novo Testamento encontramos
a revelação do Filho, o tempo em que o Filho forma a Igreja a partir dos
apóstolos, para dar continuidade à Sua obra de redenção em favor da humanidade.
Por fim, ainda no Novo Testamento, após a volta de Jesus ao Pai (Ascensão),
temos a revelação do Espírito Santo e o início do tempo em que Ele atua na Igreja
e no mundo, para completar a obra que o Pai e o Filho começaram em cada um de
nós. É neste sentido que Jesus afirma que o Espírito Santo nos “conduzirá à plena
verdade” (Jo 16,13). Nós já conhecemos a verdade do Evangelho, mas a “plena”
verdade daquilo que somos chamados a ser só nos será revelada quando pudermos
contemplar a face do Pai, do Filho e do Espírito Santo na eternidade (cf. 1Cor 13,12).
Ao
final desta reflexão sobre a Santíssima Trindade, contemplemos esta
representação simbólica dela e procuremos nos perceber no seio da mesma:
A Trindade Misericordiosa envolve a criatura humana
por todos os lados. O sentimento do Pai é de ternura e cuidado, seu
rosto se aproxima e beija o rosto inerte da pessoa ferida. Ele revela seu amor
misericordioso no calor do abraço, que acolhe e regenera o ser humano. O Filho revela
o Deus Amor-serviço, que se põe aos pés da humanidade decaída para restaurá-la,
e revela o caminho do serviço como caminhada para a vida. Em Jesus, Deus se
abaixa para estar mais perto da miséria do ser humano. O Espírito Santo,
figura que desce do alto e se aproxima do ferido, tanto pode ser a figura de
uma pomba, de chamas ou de mãos que trazem vida. Beija a pessoa e lhe transmite
o Sopro de vida. A Pomba de fogo voa sobre o ser humano caído e o aquece.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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