quinta-feira, 27 de junho de 2019

RECONSTRUIR A IGREJA DE CRISTO OU PULAR FORA DESTE BARCO?

Missa de São Pedro e São Paulo. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 12,1-11; 2Timóteo 4,6-8.17-18; Mateus 16,13-19.

            Hoje, festa dos apóstolos São Pedro e São Paulo, é um dia muito oportuno para refletirmos sobre aquilo que professamos em nossa fé: “Creio na santa Igreja católica”. Muitas pessoas hoje se recusam a afirmar que a Igreja católica é “santa”, justamente por causa dos muitos escândalos que são noticiados, ora com relação à conduta moral de alguns de seus representantes, ora com relação às acusações de desvio de dinheiro e enriquecimento pessoal dos mesmos. Como afirma muito bem o Pe. José Pagola, nós vivemos hoje uma inversão de papéis: de uma Igreja que julga (e, muitas vezes, condena) o mundo, passamos a um mundo que julga (e, muitas vezes, condena) a Igreja.
            Por que nós, católicos, ainda afirmamos que cremos “na santa Igreja católica”? Porque “Cristo amou a Igreja e se entregou por ela, a fim de purificá-la com o banho da água e santificá-la pela Palavra, para apresentar a si mesmo a Igreja, gloriosa, sem mancha nem ruga, ou coisa semelhante, mas santa e irrepreensível” (Ef 5,25-27). A santidade da nossa Igreja não vem dela mesma, isto é, não vem do fato de que nós, católicos, sejamos pessoas isentas de erros e de pecados, mas do fato do único sacrifício de Cristo na cruz em favor da humanidade e da sua própria Igreja: “somos santificados pela oferenda do corpo de Jesus Cristo, realizada uma vez por todas” (Hb 10,10).
            Voltemos, então, para esta afirmação: de uma Igreja que julga e condena o mundo, passamos para um mundo que julga e condena a Igreja. Mas aqui também podemos afirmar outra mudança: de uma Igreja que julgava estar acima do bem e do mal, passamos a uma Igreja que hoje está tendo que reconhecer seus erros, suas doenças e, sobretudo, a omissão e a conivência de alguns de seus líderes em relação a padres e bispos que, apesar de terem um dia sido consagrados a Deus, se portam dentro da Igreja como padres e bispos mundanos. Neste sentido, precisamos lembrar as sábias palavras de Santo Agostinho: “Há pessoas que estão dentro (da Igreja), mas vivem como se estivessem fora; há pessoas que estão fora (da Igreja), mas vivem como se estivessem dentro”.
            Em matéria de escândalos, não há como tapar o sol com a peneira, mas também é preciso lembrar o que Jesus disse justamente à sua Igreja: “É necessário que haja escândalos, mas ai do homem pelo qual o escândalo vem!” (Mt 18,7). Quando Jesus afirma “é necessário” está dizendo que “é impossível” que não haja escândalos, quando se trata do ser humano. Ou seja, todos nós somos passíveis de erro, de pecado e de provocar escândalos, lembrando que, para Jesus, escândalo é toda atitude nossa que leve uma pessoa a perder a fé (cf. Mt 18,6).
Ora, cada vez que o mundo divulga a notícia de um “escândalo” em nossa Igreja, nós, católicos, precisamos analisar como reagimos a isso: somos capazes de distinguir entre a Igreja e a pessoa que erra, ou temos o hábito de jogar fora o bebê junto com a água do banho? Além disso, precisamos estar atentos a outra verdade: o mundo, enquanto pessoas que têm interesses e condutas totalmente opostos ao Evangelho, tem a clara intenção de desacreditar a Igreja, justamente porque ela, enquanto presença profética, denuncia tudo aquilo que nas sociedades atuais fere a vida e a dignidade do ser humano, colabora para a destruição do meio ambiente, para a inversão de valores, para a desestruturação das famílias etc.   
            O Evangelho de hoje nos convida a olhar para as raízes da nossa Igreja: ela não nasceu da vontade de um homem; não nasceu da decisão que uma pessoa tomou de “abrir”, de “fundar” uma igreja ou de “criar” uma religião; ela nasceu da escolha que Jesus fez de Pedro e dos demais apóstolos: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la” (Mt 16,18). O apóstolo Paulo, por sua vez, nos ensina que a nossa Igreja nasceu da vontade do Pai, do sacrifício do Filho e da ação do Espírito Santo, ao aconselhar os presbíteros de Éfeso: “Cuidem de vocês mesmos e de todo o rebanho: nele o Espírito Santo constituiu vocês como guardiães, para apascentarem a Igreja de Deus, que ele adquiriu para si pelo sangue do seu próprio Filho” (At 20,28). Portanto, nossa Igreja nasceu da cruz, do sacrifício do Filho, do fato de o Pai permitir que Jesus morresse na cruz “para congregar na unidade todos os filhos de Deus dispersos” (Jo 11,52).
            Portanto, quem somos nós, católicos? Segundo o apóstolo Paulo, nós somos membros da família de Deus. Estamos edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, do qual é Cristo Jesus a pedra principal. A meta é que todos nos tornemos habitação de Deus, por meio do Espírito Santo (cf. Ef 2,19-22). Individualmente, cada um de nós é chamado a combater o bom combate da fé, a terminar o caminho que iniciamos, de seguimento de Jesus Cristo, e a guardar, isto é, a manter viva e firme a nossa fé (cf. 2Tm 4,7). No entanto, enquanto Igreja, nós temos duas missões: uma interna e outra externa. A missão interna é nos reconhecer como membros do Corpo de Cristo, no sentido de que, “se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele” (1Cor 12,26); se um membro se afasta e corre o risco de esfriar na fé, devemos ir em busca dele (cf. Mt 18,12), pois não é da vontade do Pai que nenhuma dessas pessoas, cuja fé está fragilizada, se perca (cf. Mt 18,14).
            Por fim, enquanto católicos, temos uma missão externa. A razão de ser da nossa Igreja não é ela mesma, mas a salvação da humanidade. Jesus não fundou a nossa Igreja sobre os apóstolos para que ela fosse reverenciada pelo mundo, mas para ser sacramento de salvação para uma humanidade ferida e desorientada como a nossa hoje em dia. Justamente por isso, o Papa Francisco insiste que a nossa Igreja deve ser sempre uma “Igreja em saída”: “A Igreja é chamada a ser sempre a casa aberta do Pai” (EG 47)... Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (EG 49). Cabe a cada um de nós, católicos, fazer da nossa Igreja “um hospital de campanha após a batalha” (Papa Francisco, setembro de 2013), uma Igreja dedicada em cuidar das feridas de seus fiéis e sempre disposta a sair para encontrar os que foram machucados, excluídos ou que se afastaram. Se nós, católicos, não estamos dispostos a ser uma presença de cura, um Evangelho vivo para aqueles que estão fora da nossa Igreja, não há razão alguma para continuarmos a nos identificar como católicos.   
            Uma palavra final, para aqueles que estão decididos a abandonar a Igreja católica por causa dos escândalos de alguns de seus líderes: Jesus, ao falar com São Francisco de Assis por meio da imagem do Crucificado, no século XII, disse-lhe: “Reconstrua a minha Igreja, pois ela está em ruínas”. É o que hoje Ele está dizendo a mim e a você...

Pe. Paulo Cezar Mazzi

Um comentário:

  1. Meu coração se entristece ao saber e ver o comportamento daqueles que deveriam nós guiar na fé. Deus tende piedade deles
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