Missa da
quarta-feira de cinzas. Palavra de Deus: Joel 2,12-18; 2Coríntios 5,20 – 6,2;
Mateus 6,1-6.16-18.
Algo pode nos ajudar a compreender o
sentido do tempo que estamos começando a viver hoje em nossa Igreja, o tempo da
quaresma. É a pregação de Jonas à cidade de Nínive: “Dentro de quarenta dias
Nínive será destruída” (Jn 3,4). Na verdade, dentro de quarenta dias nós vamos solenemente
fazer memória da Páscoa de Jesus, a Sua vitória sobre o nosso pecado e a nossa
morte. Mas a quaresma quer justamente nos lembrar que não existe vitória sem
luta. Nós só podemos experimentar a força da Páscoa em nossa vida na medida em
que nos damos conta dos estragos que o pecado tem feito em nossa vida pessoal e
social, estragos que nos conduzem individual e comunitariamente para a morte.
Justamente por isso, na celebração
de hoje vamos receber as cinzas sobre a nossa cabeça, recordando o que o Senhor
Deus disse a Adão, após o pecado: “Você é pó e ao pó voltará” (Gn 3,19). A
quaresma quer nos ajudar a recuperar a consciência de que todo pecado nos leva
para a morte (cf. Rm 6,23). Mas não só isso. Quanto mais estivermos conscientes
de que vamos morrer, mais podemos compreender o quanto é inútil a nossa
arrogância, a nossa soberba, o nosso orgulho; o quanto é mentirosa essa cultura
em que vivemos mergulhados, especialmente por causa das redes sociais: a
cultura da vaidade, onde só nos sentimos vivos se aparecemos, se somos vistos e
“curtidos” pelos outros.
O tempo da quaresma, que iniciamos
hoje, é verdadeiramente “o momento favorável” para a nossa cura, a nossa
conversão, a nossa purificação, a nossa restauração. Por isso, precisamos viver
este tempo voltando-nos para o nosso Deus com todo o nosso coração, isto é, com
todo o nosso ser e não apenas com uma parte de nós. Trata-se de nos deixar
reconciliar com Deus, de permitir que a verdade do seu Espírito remova a
mentira da máscara que usamos no dia a dia e nos reconcilie com a nossa
verdade, de modo que possamos acolher a nossa fraqueza como o lugar onde a
força de Deus pode se manifestar e nos transformar.
Se o tempo da quaresma existe em
função da Páscoa, e se a Páscoa é a festa da libertação, nós somos chamados a
reconhecer tudo aquilo que nos prende, nos aprisiona e nos escraviza sob o
poder do mal. Jesus, como veremos no próximo domingo, permaneceu quarenta dias
no deserto, confrontando-se com o mal, antes de iniciar a sua missão de nos
salvar. Ele nos lembra as três “armas” que podemos usar para nos libertar das
mentiras do maligno: a esmola, a oração e o jejum.
A
esmola nos liberta do nosso egoísmo e nos levar a sair de nós mesmos, para
irmos ao encontro de toda pessoa que precisa de nós. Dar esmola significa
perguntar-se: o que eu posso fazer para tornar essa sociedade menos injusta? O
jejum, por sua vez, é uma atitude de desintoxicação. Precisamos nos
desintoxicar de pensamentos, de imagens, de palavras, de sentimentos, de
atitudes que, além de nos afastar de Deus, fazem mal a nós mesmos e aos outros.
Jejuar significa perguntar-se: como eu posso recuperar a liberdade interior
diante de tudo aquilo que o mundo me oferece? Como eu posso purificar o meu
olhar de modo a voltar a enxergar Deus em minha vida e o meu próximo como
verdadeiro irmão? Enfim, a oração tem por objetivo recolocar-nos numa posição
correta diante de Deus: estamos ali para ouvi-Lo e para obedecê-Lo, procurando
conformar nossa vida à Sua vontade, que é a nossa comunhão com seu Filho Jesus
Cristo e com a sua salvação.
Durante
a quaresma deste ano, a Campanha da Fraternidade nos falará especificamente dos
Biomas brasileiros e da defesa da vida. Bioma é o conjunto dos seres vivos de
uma área. Mais uma vez, somos convidados a cuidar da criação, da qual fazemos
parte, procurando proteger, preservar e cuidar da vida não só animal e vegetal,
mas também humana, sobretudo dos pobres. Eis a oração da CF que nos inspirará
ao longo da quaresma: Deus, nosso Pai e
Senhor, nós vos louvamos e bendizemos, por vossa infinita bondade. Criastes o
universo com sabedoria e o entregastes em nossas frágeis mãos para que dele
cuidemos com carinho e amor. Ajudai-nos a ser responsáveis e zelosos pela Casa
Comum. Cresça, em nosso imenso Brasil, o desejo e o empenho de cuidar mais e
mais da vida das pessoas, e da beleza e riqueza da criação, alimentando o sonho
do novo céu e da nova terra que prometestes. Amém!
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