sexta-feira, 17 de março de 2017

ESCUTE SUA SEDE MAIS PROFUNDA

Missa do 3º. dom. da quaresma. Palavra de Deus: Êxodo 17,3-7; Romanos 5,1-2.5-8; João 4,5-42.  

            Todos nós passamos por períodos de aridez. É quando parece que secamos por dentro: nossos afetos, nossas ideias, nossas forças e até mesmo nossos desejos estão como que apagados, enfraquecidos, sem vida. Mas, de onde vem a aridez? Ela pode ser consequência de um descuido nosso em relação à nossa própria fonte interior, ou de um descuido em relação à nossa espiritualidade, descuido revelado pelo próprio Deus ao denunciar: “Eles abandonaram a mim, fonte de água vida, e cavaram para si cisternas, cisternas furadas, que não podem conter água” (Jr 2,13).
            “Minha alma tem sede de Deus e deseja o Deus vivo” (Sl 42,3). No coração de todo ser humano há uma sede, uma busca, uma procura por Deus. Mas, às vezes, não sabemos interpretar essa sede: buscamos fora aquilo que está dentro; procuramos longe aquilo que está perto. Pior ainda, nós não aceitamos caminhar pelo deserto da nossa aridez até reencontrarmos Aquele que é fonte de água viva. Ao invés disso, improvisamos: colocamos um remendo em nossa espiritualidade; damos respostas superficiais a uma sede que é muito mais profunda; desperdiçamos nossas energias cavando cisternas incapazes de conter água, porque são furadas.
O descuido com a nossa fonte interior pode fazer com que ela se torne seca, árida e dura como uma rocha. É possível que sintamos a nossa alma assim, neste momento: seca e dura, como uma pedra. Mas Deus disse a Moisés: “Eu estarei lá, (...) sobre o rochedo... Ferirás a pedra e dela sairá água para o povo beber” (Ex 17,6). Quando nos tornamos secos, áridos e endurecidos por dentro, precisamos ser “feridos”: a Palavra de Deus precisa bater duramente em nós, para que a nossa fonte interior seja desobstruída. Por isso, sentado junto ao poço de Jacó, Jesus hoje pergunta a cada um de nós: Qual é a sua sede, o seu anseio? De que forma você se reabastece? Onde você busca água para saciar a sua sede? A água que você bebe é uma água suja, contaminada? Você já parou para analisar o que pode estar obstruindo a sua fonte interior?  
            Sem nos dar conta, nós vamos permitindo que o mundo jogue um monte de entulho sobre a nossa fonte interior e aí não conseguimos mais ter acesso a ela. A resposta está dentro, mas não conseguimos entrar; a resposta está no fundo, mas não temos coragem de cavar. Nós nos habituamos com a superficialidade; nos habituamos a beber qualquer tipo de água para atenuar a nossa sede, ainda que ela continue clamando por Aquele que é fonte de água vida; como uma cisterna, nos contentamos em recolher algum pouco de água que o mundo nos oferece, mas esta água escoa rapidamente pelas brechas que estão abertas em nossa vida. Assim, quando pessoas à nossa volta nos pedem “Dá-me de beber”, nós não temos como ajudá-las.  
            Jesus hoje nos convida a desobstruir a nossa fonte interior. Embora desejemos encontrar, sem muito trabalho, uma água que sacie rapidamente a nossa sede, respostas rápidas para as nossas perguntas, remédios de efeito imediato para as nossas dores, Jesus nos revela que a nossa fonte interior só pode ser desobstruída quando nos dispomos a corrigir aquilo que em nossa vida está em desacordo com a Palavra de Deus, em oposição à Sua verdade. Foi por isso que a samaritana teve que admitir que o homem com quem ela vivia não era verdadeiramente seu marido. Nem todo homem é marido. Nem toda igreja ou grupo religioso que fala de Deus conduz para o verdadeiro Deus.
            Se neste tempo quaresmal Jesus diz a você o que disse à samaritana – “Vai chamar teu marido e volta aqui” – é para que você tenha a coragem de jogar fora seus remendos, abrir mão de suas mentiras, desfazer-se de suas máscaras, remover aquela camada de concreto que está sobre a terra árida da sua alma, a fim de que ela possa receber a água viva capaz de devolver fecundidade ao seu coração. Ao nos desfazer dos nossos falsos maridos, podemos ter o coração livre para aprender a adorar a Deus em espírito e verdade, pois “estes são os adoradores que o Pai procura”. Adorar o Pai em espírito e verdade significa buscá-Lo mais pelo desejo de estar em Sua presença do que pela necessidade de Lhe pedir alguma coisa. Só adora a Deus em espírito e verdade quem aprendeu a suportar a sua sede e a deixar-se conduzir para aquele que é Fonte de água viva, ao invés de beber de águas contaminadas.  
            No final do Evangelho aprendemos que toda pessoa que faz uma verdadeira experiência de Deus, isto é, que se encontra com a Fonte de água viva e bebe dela, torna-se um sinal para os outros: “Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz” (Jo 4,29); ‘Venham ver um homem que me fez tomar consciência de que o dom de Deus habita em mim; mais ainda, que Deus é dom, amor gratuito. Venham ver um homem que, com a sua Palavra, me ajudou a reconhecer meus enganos e despertou em mim a coragem de mudar’... Num mundo tão cheio de falsos maridos como o nosso, com tantas cisternas furadas que aparentam ser poços verdadeiros, precisamos ser para as pessoas um sinal que aponta para o verdadeiro Poço, a verdadeira Fonte, de modo que elas mesmas possam beber da água viva do Evangelho e nos dizer: “Já não cremos por causa das tuas palavras, pois nós mesmos ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o salvador do mundo” (Jo 4,42).  
             Assim como fez a mulher samaritana, deixemos com que do nosso interior jorre o testemunho do Evangelho para saciar a sede que as pessoas que convivem conosco têm do Deus vivo e da vida eterna... Em um mundo onde nada é gratuito, onde tudo tem seu preço, ajudemos as pessoas a compreenderem que em Jesus Cristo podem encontrar o dom de Deus, o Deus que é dom, que é amor gratuito, o Deus que, conhecendo a profunda sede que todo ser humano tem dentro de si, continua a Se oferecer como dom de salvação: “Que o sedento venha, e quem o deseja, receba gratuitamente água da vida” (Ap 22,17).  
(Receba – Ministério Adoração e Vida)
                                                                       ou
(O poço – Juninho)

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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