Missa do 5º.
dom. da quaresma. Palavra de Deus: Ezequiel 37,12-14; Romanos 8,8-11; João
11,1-45.
Ao longo da vida, a morte costuma
cruzar várias vezes o nosso caminho: morreu nosso animal de estimação, morreu
uma pessoa que amávamos muito, morreu um conhecido; ouvimos falar de pessoas
que morreram num acidente ou numa guerra, e também ouvimos falar de pessoas que
se suicidaram. Além disso, as doenças, a fome, as drogas e a violência
continuam fazendo morrer inúmeras pessoas, muitas delas precocemente. E sempre
que a morte cruza o nosso caminho, nós acabamos por questionar Deus: “Aquele
que abriu os olhos ao cego não poderia ter impedido que essa morte
acontecesse?” (citação livre de Jo 11,37).
Sim. Deus não somente poderia como
realmente pode impedir todo e qualquer tipo de morte. Mas Ele, muitas vezes, não
intervém, principalmente quando a morte ocorre como um processo natural de uma
vida que biologicamente caminha para o seu fim. Na verdade, muito mais do que
impedir a morte de acontecer, Deus escolheu manifestar a força do seu amor por
nós abrindo as nossas sepulturas e nos fazendo viver, conforme a sua promessa:
“Quando eu abrir as vossas sepulturas e vos fizer sair delas, sabereis que eu
sou o Senhor” (Ez 37,13).
Mesmo amando Lázaro e sabendo que
ele estava gravemente enfermo, “Jesus ficou ainda dois dias no lugar onde se
encontrava” (Jo 11,6). Nós temos pressa e queremos que Deus aja imediatamente,
para impedir que a morte alcance aqueles que amamos. Mas pode acontecer que
Deus demore “ainda dois dias” e escolha chegar tarde, quando, pelo menos aos
nossos olhos, não haja mais nada que possa ser feito. Esta é uma verdade
difícil de aceitar: Deus pode permitir a morte, seja para nos ensinar algo a
respeito da verdadeira Vida, seja para manifestar a grandeza do seu amor, que é
mais forte que a morte, amor que nos faz passar da morte para a vida.
Marta e Maria poderiam ter chegado à
seguinte conclusão: De que nos valeu o amor de Jesus, a sua amizade para com a
nossa família? Da mesma forma, muitos hoje também poderiam questionar: De que
nos valeram as nossas orações, as nossas esperanças em Deus? A verdade é que
todos nós, que cremos, precisamos nos livrar de certa mentalidade mágica,
ingênua, a respeito de Deus, mentalidade esta que nos faz criar expectativas
exageradas e irrealistas em relação aos acontecimentos e à nossa própria
finitude humana. Muitas vezes, diante de uma doença, precisamos ter a humildade
de reconhecer que não se trata de esperar de Deus a cura, mas de colocar a
nossa casa em ordem, porque está chegando a hora de partir, de nos encontrarmos
definitivamente com Deus e entrarmos na verdadeira Vida.
Jesus foi muito realista com seus
discípulos: “Lázaro está morto. Mas por causa de vós, alegro-me por não ter
estado lá, para que creiais” (Jo 11,14-15). Para Jesus, a verdadeira fé nunca
deve funcionar como garantia absoluta contra a dor, o sofrimento e a morte, mas
como força de superação de tudo isso. A verdadeira fé é aquela que nos mantém
em pé mesmo depois do terceiro dia, mesmo que seja o quarto dia e que aquilo
que morreu já cheire mal, porque começou a apodrecer e não tem mais condições
nenhuma de ser recuperado, de voltar a viver (cf. Jo 11,39-40).
Portanto,
o Evangelho hoje nos convida a dirigir nossos olhos não para Lázaro, mas para
Jesus; não para aquilo que morreu, mas para Aquele que afirmou ser a nossa
Ressurreição e a nossa Vida (cf. Jo 11,25). Os mesmos olhos de Jesus, que
choraram a morte de Lázaro, foram os olhos que se dirigiram ao céu para
suplicar ao Pai pela sua ressurreição (cf. Jo 11,35.41). É neste sentido que o
apóstolo Paulo nos lembra: “Embora vosso corpo esteja ferido de morte por causa
do pecado, vosso espírito está cheio de vida, graças à justiça. E, se o
Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos mora em vós, então
aquele que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também vossos
corpos mortais por meio do seu Espírito que mora em vós” (Rm 8,10-11).
Ao
iniciarmos esta última semana da quaresma, Jesus exclama com voz forte, na
direção do túmulo de cada um de nós: “Vem para fora!” (Jo 11,43). Vem para fora
do túmulo do seu medo, da sua raiva, do seu pessimismo, do seu desânimo, da sua
acomodação! Vem para fora da sua tristeza, da sua depressão e do seu luto,
porque a continuidade da sua vida não depende daquilo que morreu em você, mas
da forma como você está lidando com essa morte! Vem para fora, porque há pedras
que você pode me ajudar a remover e ataduras que você pode me ajudar a soltar,
para que outros Lázaros voltem a viver. Vem para fora e ajude a proclamar ao
mundo a minha palavra, que tem poder de fazer passar da morte para a vida todo
aquele que a escuta e por meio dela crê em mim (cf. Jo 5,24.28-29).
Pe. Paulo Cezar Mazzi