Missa do 4º. dom. da páscoa.
Palavra de Deus: Atos dos apóstolos 4,8-12; 1João 3,1-2; João 10,11-18.
No
trecho que ouvimos hoje da conhecida parábola do Bom Pastor encontramos quatro
personagens: o bom pastor, o mercenário, o lobo e as ovelhas. Em relação a
Jesus, que se define claramente como “o bom pastor” (cf. Jo 10,11.14), nós
deveríamos nos sentir e viver como ovelhas, mas, em relação às outras pessoas,
nós corremos o risco de nos comportar também ou como pastores, ou como mercenários,
ou ainda como lobos! Somos pastores quando cuidamos; somos mercenários quando
usufruímos; somos lobos quando destruímos.
Já
na Idade Moderna, o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679) afirmou que “o
homem é lobo do homem”, ou seja, todo ser humano tem o instinto natural de
sobreviver, de se preservar, e se para isso for preciso atacar, ferir ou mesmo
matar seu semelhante, ele o faz. O problema é que hoje nós vemos o ser humano
agindo como lobo em relação ao seu semelhante não simplesmente por uma questão
de sobrevivência ou de auto-preservação, mas sobretudo por dinheiro – a “mão
invisível” do Mercado é, na verdade, a “pata” do grande lobo invisível que
condena à morte inúmeros seres humanos todos os dias –, pelo fanatismo
religioso ou por “nada”, simplesmente porque hoje a vida humana não vale nada e
matar não significa nada.
Para
sobreviver a esse mundo desumanizado e a essa cultura de morte, nós estamos
cada vez mais adotando posturas de lobos e nos afastando da nossa identidade de
ovelhas. Não podemos nos esquecer de que, dentro de cada um de nós habita um
lobo e um cordeiro. É verdade que às vezes precisamos dar vazão ao nosso lobo
interior, no sentido de lutar com todas as forças para defender a família, os
filhos, o casamento, os valores, a fé, a justiça, a vida... Contudo, é preciso
que o nosso lobo e o nosso cordeiro aprendam a dialogar e a conviver, pois
ambos fazem parte da nossa verdade como seres humanos.
Se
o lobo é um perigo evidente, o mercenário é um perigo sutil. Em nome da
democracia, da civilização, da liberdade de expressão, da liberdade religiosa
etc., nós estamos rodeados de mercenários, isto é, de pessoas que ocupam cargos
de autoridade aparentemente para cuidar de nós, quando, na verdade, não são
pastores, mas mercenários: a única preocupação deles é obter lucro,
enriquecer-se, mesmo que, para isso, tenham que fechar os olhos para situações
que provocam sofrimento, injustiça e morte às ovelhas que lhes foram confiadas.
Todo mercenário é um fantoche nas mãos de um lobo chamado dinheiro: ele nunca
se importa com a vida das ovelhas, mas apenas com o seu enriquecimento pessoal.
Sua alma deixou de pertencer ao Bom Pastor e passou às mãos do grande Lobo há
muito tempo...
Nós
também podemos agir como mercenários. Eis alguns exemplos: “O que eu posso
lucrar com essa pessoa?”; “De que maneira ela pode me ajudar a chegar aonde eu
almejo?”; “Quando a doença chegou para a minha esposa / para o meu marido, meu
compromisso matrimonial acabou”; “Para não ter trabalho com meus filhos, eu
terceirizo a criação/educação deles”. Numa palavra, se o mercenário sacrifica seu
tempo, renuncia ao descanso ou ao lazer e suporta algum sofrimento, é
unicamente para ganhar mais dinheiro e nunca para cuidar das ovelhas que lhe
foram confiadas.
Pedro
deixou claro que somente na pessoa de Jesus Cristo, nosso Bom Pastor, é que
podemos encontrar cura e salvação: “Em nenhum outro há salvação, pois não
existe debaixo do céu outro nome dado aos homens pelo qual possamos ser salvos”
(At 4,12). No entanto, é importante lembrar o que afirma o salmo do bom pastor:
“Ainda que eu caminhe por vale tenebroso nenhum mal temerei, pois estás junto a
mim; teu bastão e teu cajado me deixam tranquilo” (Sl 23,4). O pastor tem em
suas mãos dois instrumentos para cuidar das suas ovelhas: o bastão e o cajado. Enquanto
o bastão é utilizado para defender as ovelhas dos ataques dos lobos e de outras
feras, o cajado é utilizado para recuperar a ovelha que corre risco de cair no
precipício. Isso significa que o verdadeiro pastor não é somente aquele que protege
e cuida, mas que também educa e corrige.
Se
hoje nós temos crianças que precocemente agem como pequenos lobos em relação
aos seus colegas de escola, e também em relação aos professores, é porque seus
pais (quando os têm) usam demais o cajado (proteção e cuidado), mas quase nunca
ou nunca o bastão (educação e correção). Além do mais, é importante lembrar que
quando uma ovelha teima em ficar longe do seu pastor, se expondo de maneira irresponsável
e desnecessária a certos perigos, o pastor precisa de certa forma “agir contra”
o seu coração e quebrar a perna da ovelha, para que ela aprenda a ficar perto
dele e não mais expor-se irresponsavelmente a riscos de morte. Isso suscita uma
pergunta: eu aceito as correções que preciso receber do meu Bom Pastor, para me
deixar educar no caminho da justiça e da santidade, ou quero apenas o Seu
cuidado e a Sua proteção?
P.S.
Para nós, padres e bispos que, às vezes, devido à nossa insegurança interior ou à nossa duplicidade de vida, precisamos ficar o tempo todo afirmando a nossa autoridade
perante o nosso rebanho por meio de ameaças, vale lembrar que a nossa autoridade
de pastores só é reconhecida pelo rebanho na medida em que vivemos sob a
autoridade do Bom Pastor e procuramos nos configurar ao Seu coração, nos
submetendo diariamente ao bastão da Sua palavra, como Ele sempre se submeteu à
palavra do Pai...
Para sua oração pessoal: CURA
INTERIOR (Pe. Fábio de Melo)
Pe. Paulo Cezar Mazzi
Nenhum comentário:
Postar um comentário