Missa
do 4º. dom. da quaresma. Palavra de Deus: 2Crônicas 36,14-16.19-23; Efésios
2,4-10; João 3,14-21.
Todos
os dias acontecem coisas boas e coisas ruins no mundo em que vivemos, mas
normalmente são noticiadas quase que somente as coisas ruins. Além disso, as
notícias tidas como “péssimas”, aquelas que tiram o nosso sono, não são tanto
as que falam de violência ou de corrupção, mas as que se referem ao mau
funcionamento da economia. Como o próprio Papa Francisco já disse, se alguém
morre de fome, ninguém se importa com isso, mas se a Bolsa de Valores cai três
ou quatro pontos, o mercado financeiro e a sociedade entram em pânico.
Em
nosso País, ultimamente, as notícias não têm sido boas. Além dos escândalos de
corrupção, que se multiplicam, as más notícias vêm do campo da economia, o que
neste domingo levará muitas pessoas às ruas para protestarem contra o atual
governo. Mas exatamente hoje, no contexto em que estamos vivendo, a Palavra de
Deus nos leva a refletir sobre a causa das más notícias. Fazendo uma releitura
da história de Israel – particularmente, da sua capital Jerusalém – o autor do
Livro das Crônicas coloca o dedo na ferida e aponta a causa da destruição de
Jerusalém: eles “multiplicaram suas infidelidades” (2Cr 36,14).
Não
é exatamente isso que acontece não só com o Brasil, mas com o mundo? Infidelidade.
Infidelidade com a própria consciência e com Deus; infidelidade com a família e
com a maneira de exercer a profissão; infidelidade com os bens públicos e com a
forma como se lida com o dinheiro... Nós também vivemos hoje uma época de
multiplicação de infidelidades, de tal forma que constatamos o mesmo que o
autor das Crônicas: não há mais remédio (cf. 2Cr 36,16). Nossas infidelidades
pessoais têm consequências sociais: “Os inimigos incendiaram a casa de Deus e
deitaram abaixo os muros de Jerusalém, atearam fogo a todas as construções
fortificadas e destruíram tudo o que havia de mais precioso” (2Cr 36,19).
Você
reconhece essas imagens hoje? Casa de Deus incendiada: perseguição religiosa (Oriente
Médio), perda de fé em Deus e perda de confiança em si mesmo e no ser humano.
Muros abaixo: cidades desprotegidas, vidas expostas à violência (tráfico de
drogas, roubos seguidos de morte, agressão no trânsito, violência sexual etc.).
Construções fortificadas incendiadas: ninguém escapa da violência, da
degradação moral e das consequências da corrupção. Destruição de tudo o que há
de mais precioso: família, consciência moral, ética, a política como cuidado
com o bem comum, fé (corrupção em diversas igrejas; líderes religiosos infiltrados
na política para beneficiar os interesses de suas igrejas e não os da
sociedade), justiça, paz, esperança etc.
Assim
como Israel foi responsável pelos seus dias de desolação na Babilônia (70
anos!), assim nós precisamos nos perguntar qual está sendo nossa parcela de
responsabilidade na desolação em que nos sentimos tantas vezes. Conforme nos
mostrou o Salmo 137,4-6, somente uma coisa ajudou Israel a sobreviver à
desolação (Exílio): sua fé, sua confiança de que Deus não havia se esquecido
dele. Assim também, o apóstolo Paulo vem hoje nos lembrar que o nosso “Deus é
rico em misericórdia... Quando estávamos mortos por causa de nossas faltas, ele
nos deu a vida com Cristo” (Ef 2,4-5). Quando pensamos que não há mais remédio
que possa nos curar dos males que se abatem sobre a humanidade, Jesus afirma
que Ele foi levantado numa cruz, “para que todos os que nele crerem tenham a
vida eterna” (Jo 3,15).
A
imagem de Cristo crucificado nos fala de desolação e de consolação. Por amar
tanto a humanidade – e particularmente cada ser humano – o Pai permite que seu
Filho único sofra a desolação da morte de cruz, para que cada ser humano receba
a consolação de se saber salvo, redimido das suas infidelidades. E o apóstolo
Paulo insiste nessa consolação que recebemos da cruz de Cristo: “É por graça
que vós sois salvos!” (Ef 2,5). “(...) é pela graça que sois salvos, mediante a
fé” (Ef 2,8). Fé em quê ou em quem? Fé em Jesus Cristo crucificado e
ressuscitado, fé na graça da redenção da cruz, na morte redentora de Cristo em
favor de cada um de nós, de cada ser humano.
A
cruz de Cristo é a proclamação mais clara de que a salvação que vem de Deus é
graça: “(...) isso não vem de vós; é dom de Deus!” (Ef 2,8). Antes que cada um
de nós existisse, antes que cada um de nós caísse nas suas faltas, nas suas
infidelidades e se sentisse condenado por elas, Cristo Jesus abraçou a
condenação da cruz para nos absolver de todo tipo de condenação, venha ela de
nós mesmos (consciência) ou do mundo em que vivemos. Olhar para o Crucificado é
acolher o dom de Deus, que enviou o seu Filho para salvar cada ser humano, não
para condená-lo (cf. Jo 3,17).
Porém,
há uma coisa que pode nos condenar: não crer, não crer no amor de Deus, não
deixar-se abraçar pelo Crucificado, não querer ser levantado das quedas provocadas
pelas próprias infidelidades – numa palavra, não querer vir para a luz. Jesus
afirma que muitos preferem as trevas, porque se habituaram com elas, e a luz os
incomoda. Muitos se acostumaram a fazer o mal a si mesmos e à humanidade. São
pessoas que não querem a luz porque não querem ser denunciadas.
Neste
tempo de multiplicação de denúncias de corrupção, de impunidade e de
infidelidades, Jesus nos convida a agir conforme a verdade (cf. Jo 3,21), não
conforme a conveniência, nem conforme os que os outros ou a maioria faz. Agir
conforme a verdade é abraçar a própria cruz, uma vez que a cruz nada mais é do
que o encontro com a própria verdade. Sem esse duro encontro, nós continuamos
nas trevas da ignorância de nós mesmos e daquilo que Deus quer para nós. Só no
encontro com a própria verdade, só quando decidimos viver a partir da nossa
verdade é que encontramos paz, nos sentimos felizes e recuperamos a nossa saúde,
porque aceitamos a verdade de que a salvação é graça, é dom de Deus para cada
um de nós. Abracemos esse dom. Deixemos com que essa luz nos envolva e sejamos
portadores dela para aqueles que ainda estão escolhendo viver nas trevas.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
Para a sua oração pessoal: EU ENTREGAREI (Dagö)
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