Missa
do Domingo de Ramos. Palavra de Deus: Isaías 50,4-7; Filipenses 2,6-11; Marcos
15,1-39.
A celebração de hoje nos recorda a
entrada de Jesus em Jerusalém. Contraditoriamente, a mesma cidade que acolhe
Jesus, saudando-o com ramos e com gritos de “hosana” – lembrando que a palavra “hosana”
é uma súplica por salvação –, é a cidade que rejeita Jesus e o crucifica. A
mesma cidade que pede para ser salva crucifica o seu Salvador. Jerusalém é o
retrato do nosso mundo e de tantos de nós que suplicamos por salvação, mas
rejeitamos Aquele que pode nos salvar.
Já no tempo do profeta Isaías, Deus
havia denunciado a rejeição à Sua salvação nestas palavras: “Na conversão e na
calma estava a vossa salvação, na tranquilidade e na confiança estava a vossa
força, mas vós não o quisestes! Mas dissestes: ‘Não, antes, fugiremos a cavalo!’”
(Is 30,15). Preferir fugir a cavalo a confiar em Deus significa dizer que a
nossa salvação não depende de Deus, mas sim das nossas armas, da nossa tecnologia,
do nosso dinheiro, da nossa inteligência, da nossa própria força... Nos
esquecemos do que diz a Escritura: “ninguém se salvará por sua própria força” (1Sm
2,9; cf. Sl 33,16-17).
No momento em que Jesus é
interrogado, Pilatos diz: “Nada tens a responder? Vê de quanta coisa te acusam!”
(Mc 15,4). De quantas coisas Deus é acusado hoje? O mesmo ser humano que se
julga autônomo, dono da sua própria liberdade e autossuficiente em relação à
sua própria salvação, ao se dar conta de que sua própria força é incapaz de
salvá-lo, começa a acusar Deus por tudo o que dá errado em sua vida e no mundo
à sua volta. Em geral, nós não nos lembramos de consultar Deus a respeito das
decisões que temos de tomar, mas quando essas decisões causam consequências
desastrosas em nossa vida e na sociedade, costumamos acusar Deus de não nos
ajudar, de não se importar conosco, de parecer indiferente ao que se passa com
a humanidade.
Diante das acusações, Jesus não
respondeu nada (cf. Mc 15,5). Por que Deus responderia às acusações que Lhe
fazemos, se nós diariamente nos negamos a escutá-Lo? Às vezes, a melhor forma
de Deus responder a nós é por meio do silêncio. Nesse silêncio, onde só
escutamos o nosso grito, temos que reconhecer a nossa parcela de
responsabilidade diante de tantos acontecimentos. O silêncio de Deus é um
remédio amargo que às vezes precisamos tomar para curar aquelas feridas que
abrimos em nós mesmos e nos outros com as nossas palavras, carregadas de
agressividade, de maldade e de acusações injustas.
Enquanto Jesus fica em silêncio, a
multidão grita alvoroçada e, nesse grito, expressa a sua escolha por Barrabás, não
por Jesus. Quem nós queremos que seja solto? Ao quê damos vazão dentro de nós,
ou com o quê nos identificamos mais: com a mansidão de Jesus ou com a
agressividade de Barrabás? Barrabás é a figura do anti-herói. É ele quem mantém
os índices de audiência das novelas, quem recebe milhões de acesso na internet,
quem inspira adolescentes e jovens a se tornarem traficantes, quem convence
jovens a deixarem seus países e a
aderirem a “guerras santas” em nome do fanatismo religioso.
Diante do grito “Crucifica-o!”,
Pilatos pergunta à multidão, a respeito de Jesus: “Mas que mal ele fez?” (Mc
15,14). Que mal fez Deus, para que seja novamente crucificado com requintes de
ironia e crueldade pela mídia? Quem mal fez Deus para justificar o crescente
número de pessoas que se declaram ateias? Como revela o filme “Deus não está
morto”, por trás do ateísmo normalmente existe a dor de ter sido atingido pelo
mal. O mal que Deus fez foi ter permitido que o mal atingisse aquilo ou aqueles
que eu mais amava. O ateísmo é muito mais uma raiva de Deus do que uma crença
na não existência de Deus. Por isso, muitos ainda declaram: “Que desça agora da
cruz, para que vejamos e acreditemos!” (Mc 15,32). Que Deus apague toda sombra
de cruz da história da humanidade, para que eu acredite na Sua existência. Que
Deus me faça descer da cruz em que me encontro, para que eu possa crer no Seu
amor por mim...
O silêncio de Jesus diante das acusações
que recebeu enquanto estava sendo julgado foi quebrado na hora da cruz: “Meu
Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mc 15,34). Jesus comunga da mesma
sensação que temos de que Deus abandonou a humanidade a si mesma. Assim como
Jesus, nós não sentimos o Pai perto de nós na hora da dor. Assim como Jesus,
nossa fé algumas vezes entra em crise, e a imagem que temos de Deus se quebra em
inúmeros pedaços, porque não conseguimos entender o que está nos acontecendo.
Entretanto, o próprio Jesus nos ensinou a confiar incondicionalmente no Pai que
conhece cada uma das nossas necessidades (cf. Mt 6,25-34): nenhum fio de cabelo
cairá da nossa cabeça sem o Seu consentimento (cf. Mt 10,28-31).
Diante desse Pai, “Jesus deu um forte
grito e expirou” (Mc 15,37). No grito de Jesus está o grito de cada ser humano
por vida, por paz, por justiça, por misericórdia, por perdão... Expirando,
Jesus entrega seu hálito de vida (seu espírito) a Deus. Essa entrega é feita
com tal confiança que “o oficial do exército viu como Jesus havia expirado e
disse: ‘Na verdade, este homem era Filho de Deus!’ (Mc 15,39). Expirar lembra término.
Chegará o momento em que iremos expirar, como Jesus. Que o nosso expirar seja
vivido segundo as palavras do apóstolo Paulo: “sei em quem depositei a minha fé”
(2Tm 2,12). Sei nas mãos de quem eu entrego o meu espírito: nas mãos do Pai que
conta cada um dos meus passos errantes e recolhe no seu odre cada uma das
minhas lágrimas (cf. Sl 56,9), para enxugá-las e recompensá-las (cf. Is 25,8;
Ap 7,17). Quer eu esteja vivo, quer eu morra, continuarei pertencendo ao Senhor
Jesus (cf. Rm 14,7-8), meu único e verdadeiro Herói.
Para sua oração pessoal: HERÓI
(Ministério Adoração e Vida).
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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