quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

CHEIOS OU VAZIOS DA GRAÇA?

Missa do 2º. dom. do advento. Palavra de Deus: Gênesis 3,9-15.20; Efésios 1,3-6.11-12; Lucas 1,26-38.         

            “Onde você está?”, perguntou o Senhor Deus a Adão (cf. Gn 3,9). Deus, que tudo vê e tudo conhece, fez esta pergunta a Adão, para que ele tomasse consciência da direção que o pecado estava dando à sua vida, quando Adão decidiu desobedecer a Deus. Hoje Deus dirige esta pergunta a cada um de nós: “Onde você está?” Por que será que isso está acontecendo na sua vida? Qual tem sido a sua parcela de responsabilidade naquilo que está acontecendo com você? “Observe o seu caminho”, a maneira de conduzir sua vida, “reconheça o que você fez”, para que chegar na situação em que chegou (cf. Jr 2,23).
            Diante da pergunta de Deus, Adão disse: “Ouvi tua voz, (...) fiquei com medo (...) e me escondi” (Gn 3,10). Você já se deu conta da voz de Deus que fala à sua consciência? Você sente medo de Deus, ou se sente amado(a) por Ele? Você se esconde de Deus no seu dia a dia (no seu ativismo), ou se deixa encontrar por Ele (na sua oração)? Adão estava com vergonha da sua nudez, mas hoje a Palavra do Senhor nos convida a olhar para a nossa nudez, para as consequências maléficas e destruidoras que o pecado causa em nós, e reconhecer que somente o Senhor pode cobrir a nossa nudez; somente Ele pode curar as feridas que o pecado tem aberto em nós, em nossa família, em nossa sociedade. Por maior que possa ser o nosso pecado, devemos nos lembrar da Palavra que diz: “Onde foi grande o pecado, muito maior foi a graça” de Deus em nos salvar (cf. Rm 5,20).
            Por que iniciamos essa reflexão mencionando o pecado de Adão e o nosso? Porque a liturgia de hoje nos coloca diante do dogma da Imaculada Conceição da Virgem Maria, dogma que afirma que Maria, preparada por Deus para ser a Mãe de Seu Filho, foi concebida sem a mancha do pecado original, isto é, do pecado que todos nós herdamos de Adão (cf. Rm 5,12). Diferente de Maria, nós não somos “imaculados”. Temos consciência que estamos “maculados” com o nosso pecado, “maculados” com certas concessões que nos “mancham” por meio da corrupção, da desonestidade, da mentira. Diferente de Maria, que foi chamada pelo anjo de “cheia de graça” (Lc 1,28), nós podemos não estar “cheios” da graça de Deus neste momento, mas estamos aqui para receber do Senhor a Sua graça, a graça que nos santifica por meio da Palavra que Ele nos diz (cf. Jo 15,3). 
       Pensemos no significado dessas palavras: imaculada/maculada, pura/impura, limpa/suja. Há dias atrás, o Papa Francisco nos pediu para rezarmos pelos filhos que recebem “pão sujo” de seus pais. O que é o “pão sujo”? É o pão adquirido com trabalho desonesto, corrupto. Quantos filhos, “talvez educados em colégios caros, talvez criados em ambientes cultos, recebem dos pais comida suja, porque seus pais, trazendo pão sujo para casa, perderam sua dignidade!”. Quantos filhos têm fome de dignidade? Deus quer que o pão que nós comemos em casa seja fruto de um trabalho honesto, disse o Papa Francisco.
        De maneira provocadora, o Papa Francisco agora nos diz, na sua Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, que prefere uma Igreja “suja”, que sai de si e vai até os outros, para curá-los, para salvá-los; não uma Igreja “pura”, fechada em si mesma, preservada do contato com o sofrimento humano: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (EG 49). Que tipo de Igreja temos sido?
            Por fim, lembremos que se a nossa vida não é uma vida sem pecado, apesar disso, ela deve se tornar o “lugar da graça” de Deus, o lugar onde o Pai possa gerar seu Filho Jesus em nós, e por meio de nós, no mundo. O próprio Pai nos amou e nos escolheu em seu Filho Jesus “para que sejamos santos e irrepreensíveis, e vivamos sob o seu olhar, no amor” (Ef 1,4). Adão e Eva fugiram desse olhar amoroso do Pai. Maria, pelo contrário, escolheu viver sob esse olhar: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1,38). Que neste tempo de Advento, possamos a cada dia converter o nosso “não” (fechamento à vontade de Deus) em “sim” (abertura e docilidade à Sua vontade). Peçamos ao Espírito Santo que nos dê discernimento para percebermos, em cada atitude do nosso dia a dia, se ela nos torna mais cheios ou mais vazios da graça de Deus, se ela nos purifica ou nos macula... 

                                                                                                                                                                                  Pe. Paulo Cezar Mazzi 

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