quinta-feira, 6 de março de 2025

QUAIS SÃO AS SUAS TENTAÇÕES MAIS FREQUENTES?

 Missa do 1º dom. Quaresma. Palavra de Deus: Deuteronômio 26,4-10; Romanos 10,8-13; Lucas 4,1-13.

 

            Em todo primeiro domingo da Quaresma ouvimos o Evangelho das tentações de Jesus. Dois são os motivos. Primeiro, para nos tornar conscientes de que a nossa vida é um combate espiritual. Segundo, para nos lembrar de que a Quaresma, cuja meta é a nossa transformação, a nossa libertação em Cristo, é um tempo mais intenso do ataque do inimigo, para nos fazer desistir da conversão que sabemos ser necessária para a nossa vida. Tomar consciência disso não nos deve desanimar, pois não estamos sozinhos nesse combate espiritual: o Espírito Santo está conosco, como força do Alto, dada por Deus, para nos auxiliar.

            “Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão (batismo), e, no deserto, ele era guiado pelo Espírito. Ali foi tentado pelo diabo durante quarenta dias” (Lc 4,1-2). Por qual razão o Espírito Santo nos coloca numa situação de deserto e nos permite ser tentados pelo diabo? Porque Ele é o “Espírito da Verdade” (Jo 16,13) e essa Verdade precisa nos tornar conscientes das mentiras que nos habitam, mentiras que costumamos usar para justificar a nossa permanência no pecado.

            São Lucas nos informa que Jesus “foi tentado pelo diabo durante quarenta dias” (Lc 4,2). O número “quarenta” simboliza, na Bíblia, a duração da vida de uma pessoa. Portanto, assim como Jesus, nós somos tentados pelo espírito do mal a vida toda, sendo que essa tentação se intensifica quando experimentamos uma situação de fome, de carência, de ausência de algo que nos é importante e necessário. De fato, foi quando Jesus sentiu fome que o diabo se aproximou dele para tentá-lo. Portanto, quando sofremos uma carência, uma ausência, precisamos estar atentos porque ali é o momento oportuno para o tentador se aproximar de nós e nos propor falsas compensações para a nossa fome, para a frustração de um desejo que não está sendo satisfeito em nós.

Enquanto na primeira tentação o diabo propôs a Jesus dar livre curso aos seus desejos e não sofrer a frustração de nada, na segunda ele lhe prometeu um caminho de sucesso, de glória e de plena autorrealização. Exatamente porque vivemos num mundo capitalista que produz desigualdade social, o sonho de consumo da maioria das pessoas é ficar rica. Em nome desse sonho, sacrifica-se a saúde, o casamento, a relação com os filhos, a fé, a espiritualidade, o caráter, a honestidade etc. Enquanto ambicionam “ganhar o mundo inteiro”, essas pessoas destroem-se a si mesmas (cf. Lc 9,25) e aquilo que mais têm de sagrado na vida, esquecendo-se do que o próprio tentador disse: “Tudo isso foi entregue a mim e posso dá-lo a quem eu quiser” (Lc 4,6). Em outras palavras, o desejo pelo enriquecimento é puramente diabólico.   

Diferente de Mateus e de Marcos, Lucas é o único evangelista que, ao narrar as tentações de Jesus, encerra o relato com uma observação preocupante: “Terminada toda a tentação, o diabo afastou-se de Jesus, para retornar no tempo oportuno” (Lc 4,13). Quando, auxiliados pelo Espírito Santo, conseguimos resistir e não cair em tentação, não podemos aposentar nossas armas espirituais e pensar que conseguimos atingir um nível de maturidade emocional e espiritual que nos garantirá nunca mais cair no pecado. Para o diabo, nunca faltará o “momento oportuno” de voltar a nos visitar e nos tentar. Quando é esse momento? Principalmente, o momento da dor, da perda, do fracasso, da frustração, do cansaço, da decepção com Deus, com as pessoas, conosco mesmos e com a vida, o momento do envelhecimento, da perda de importância para a Igreja e para a sociedade da produção e do resultado; numa palavra, o momento da solidão da morte. É ali que o diabo se aproximará de nós e nos perguntará se valeu a pena termos sacrificado tantas coisas em nome da nossa fé, para agora morrermos como pessoas insignificantes e esquecidas por Deus e pelo mundo. Precisamos estar conscientes e preparados para esse ataque final do maligno.

Quais são suas tentações mais frequentes? Como você lida com sua fome, com sua carência? Você consegue ter maturidade para frustrar seus desejos, sempre que eles se tornam uma armadilha para manter você escravo(a) do pecado? Vivendo em um mundo materialista e competitivo, onde quem pode mais chora menos, você se percebe contaminado pelo desejo diabólico de ser um vencedor, uma pessoa de sucesso, garantindo-se ilusoriamente pelo acúmulo de riqueza material? Seus joelhos se dobram diariamente diante de Deus para pedir que Ele te faça prosperar sempre mais, ou para que Ele te conceda o pão de cada dia? Você tem consciência de que toda vitória sua contra o tentador é apenas temporária e que ele sempre encontrará um momento oportuno para voltar a te tentar? No momento de maior dor, de maior solidão e de maior insignificância, você manterá a sua fé no amor de Deus por você?

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi  

terça-feira, 4 de março de 2025

ESTE HOMEM DEVE MORRER!

 

“Os fariseus saíram da sinagoga e, junto com alguns do partido de Herodes, faziam um plano para matar Jesus” (Mc 3,6).

 “É réu de morte!” Então, cuspiram no rosto de Jesus, e o esbofetearam (Mt 26,66-67).

 “Então eles pegaram pedras  para atirar em Jesus” (Jo 8,59).

 “E a partir desse dia, as autoridades dos judeus decidiram matar Jesus” (Jo 11,53).

 “Nós temos uma lei, e segundo a lei este homem deve morrer” (Jo 19,7).

Estes versículos são apenas alguns exemplos que nos recordam que os verdadeiros inimigos de Jesus nunca foram do campo político e, sim, do campo religioso. Quem matou Jesus foi a Religião, usando para tal crime o braço da Política (O Império Romano). Exatamente como aconteceu com Jesus, quem hoje deseja a morte do Papa Francisco não são pessoas movidas por interesses políticos, mas gente de dentro da Igreja, pessoas que, com a mesma arrogância dos fariseus e doutores da Lei, se consideram “católicos de verdade”, defensores da “sã doutrina”.

Os constantes ataques e perseguições que o Papa Francisco vem sofrendo, desde quando assumiu o seu pontificado, é a prova mais viva do quanto ele é fiel ao Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo: “Lembrem-se do que eu disse: nenhum empregado é maior do que seu patrão. Se perseguiram a mim, vão perseguir a vocês também... Farão isso a vocês por causa do meu nome, pois não reconhecem aquele que me enviou” (Jo 15,20.21). Unicamente por querer reconduzir a nossa Igreja ao Evangelho e questionar as tradições ultrapassadas que, ao invés de levar as pessoas para mais perto de Deus, as mantém afastadas do Reino, Francisco precisa pagar o mesmo preço que Jesus pagou: o preço da rejeição.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

TEMPO DE TRATAR A FERIDA

 

Missa da Quarta-feira de Cinzas. Palavra de Deus: Joel 2,12-18; 2Coríntios 5,20 – 6,2; Mateus 6,1-6.16-18.

 

“Toda a cabeça está contaminada pela doença, todo o coração está enfermo; desde a planta dos pés, até a cabeça, não há lugar são. Tudo são contusões, machucaduras e chagas vivas que não foram espremidas, não foram atadas nem cuidadas com óleo” (Is 1,5-6).

            Essas palavras do profeta Isaías revelam a situação do povo de Israel, ferido pelo seu próprio pecado. É a imagem do filho que livremente decidiu deixar a casa do pai, desperdiçou todos os seus bens, passou fome e o único emprego que encontrou foi cuidar dos porcos (cf. Lc 15,14-16). Mas foi ali, naquela situação, que ele “caiu em si” e tomou a decisão de voltar para junto do pai: “Vou-me embora, procurar meu pai e dizer-lhe: ‘Pai, pequei contra o Céu e contra ti’” (Lc 15,18).

            Eis o grande convite que o Senhor nos faz, neste início de Quaresma: “Voltai-vos para mim e sereis salvos, porque eu sou Deus e não há nenhum outro” (Is 45,22). “Volta, Israel, ao Senhor teu Deus, pois tropeçaste em tua falta” (Os 14,2). “Voltai-vos para mim com todo o vosso coração” (Jl 2,12). Nós somos livres e, muitas vezes, damos uma direção errada à nossa vida. Como saber se a direção da nossa vida está correta? Se ela está nos levando para Deus. Tudo o que nos afasta de Deus pode até nos dar algum tipo de ganho, mas nos leva para a destruição. Tudo o que nos aproxima de Deus é válido e precisa ser mantido ou retomado.

            Conversão é fazer a volta. Não voltamos para um determinado ponto da estrada; voltamos para uma Pessoa, para o nosso Deus: “É ele quem perdoa todas as tuas faltas e cura todos os teus males. É ele que redime da cova a tua vida e te cerca de carinho e compaixão” (Sl 103,3-4). “O Senhor cura os corações quebrantados e cuida dos seus ferimentos” (Sl 147,3). “Com o Senhor está o amor e redenção em abundância: ele resgatará Israel de toda a sua culpa” (Sl 130,7-8). 

            Jesus é o sacramento da misericórdia de Deus. Ele não veio quebrar a cana que já está rachada, nem veio apagar o pavio que já está quase se extinguindo (cf. Is 42,3). Pelo contrário, Ele “veio procurar e salvar o que estava perdido” (Lc 19,10); não veio chamar os justos, mas os pecadores, porque o Médico não existe para quem tem saúde, mas para quem está doente (cf. Mt 9,12.13). Eis, portanto, o convite do apóstolo Paulo: “Deixai-vos reconciliar com Deus” (2Cor 5,20).

Se é verdade que o pecado nos adoece da cabeça aos pés (cf. Is 1,3-4), temos que nos perguntar se realmente desejamos a nossa cura: “Antes de curar alguém, pergunta-lhe se está disposto a desistir das coisas que o fizeram adoecer” (Hipócrates). Quem não está disposto a abandonar as cebolas do Egito nunca porá os pés na Terra Prometida, rica de fertilidade.

A Campanha da Fraternidade nos recorda que a Terra não é um reservatório de recursos sem fim, mas uma Casa a ser cuidada. Além do cuidado com essa Casa (natureza, florestas, rios etc.), devemos cuidar das nossas relações humanas e sociais. 

“Precisamos superar a indiferença frente ao sofrimento da Terra e abandonar a idolatria dos desejos desordenados do consumismo e do materialismo” (TB, n.14). “O desafio para a nossa conversão nesta Quaresma é cuidar da casa: da casa interior de cada um de nós (espiritualidade), da casa em que habitamos (família), da casa em que passamos grande parte do nosso tempo (escola, trabalho), da casa em que nos relacionamos (rede) e da Casa Comum (Terra), pois nela tudo está interligado” (TB, n.16).  

Uma santa e fecunda Quaresma a todos nós! 


Pe. Paulo Cezar Mazzi