quinta-feira, 25 de julho de 2024

COMO EU ALIMENTO AS RELAÇÕES QUE SÃO IMPORTANTES PARA MIM?

 Missa do 17º dom. comum. Palavra de Deus: 2Reis 4,42-44; Efésios 5,1-6; João 6,1-15

 

            Qual é a missão da Igreja: cuidar do corpo ou cuidar da alma das pessoas? Eis uma pergunta equivocada. Jesus veio salvar o ser humano nas suas três dimensões, segundo a mentalidade bíblica: corpo (físico), alma (psíquico) e espírito. Quando a Igreja levanta a sua voz para denunciar uma política e uma economia que produzem desigualdade social, fome, violência e morte, está sendo fiel a Jesus, que, “levantando os olhos, e vendo que uma grande multidão estava vindo ao seu encontro, Jesus disse a Filipe: ‘Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?’” (Jo 6,5). Jesus não ignorou a fome daquela multidão e nós também não devemos ignorar a fome, a miséria, a violência e tudo aquilo que atenta contra a vida das pessoas à nossa volta.

A fome no mundo não é um problema de falta de alimento, mas de concentração de renda, a qual produz desigualdade social. A fome de muitos é consequência direta da ganância de poucos, como afirmou Gandhi: “A Terra tem o suficiente para as necessidades de todos, mas não para a ganância de alguns”. Por isso, a solução do problema da fome passa pela partilha, como fizeram o profeta Eliseu e Jesus. Quando Eliseu mandou distribuir 20 pães de cevada para cem pessoas e foi questionado – “Como vou distribuir tão pouco para cem pessoas?” (2Rs 4,43) – respondeu: “Dá ao povo para que coma; pois assim diz o Senhor: ‘Comerão e ainda sobrará’” (2Rs 4,43). Diferente de Eliseu, nós temos uma mentalidade individualista, que nos leva a acumular, achando que aquilo garantirá a nossa sobrevivência.

            Hoje Jesus nos faz a mesma pergunta que fez a Filipe: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?” (Jo 6,5), uma pergunta que se desdobra em muitas outras: Por que seu relacionamento está definhando? O que você coloca da sua parte para alimentá-lo? Você identifica a sua fome de sentido de vida, que vai muito além do seu estômago? Você compreende que a sua relação conjugal não se alimenta somente de sexo, mas também de afeto, de diálogo e de companheirismo? Você tem consciência de que “cada vez mais as pessoas têm como viver (materialmente), mas elas não têm uma razão para viver” (Victor Frankl)? Você identifica o grito de fome das pessoas que necessitam do alimento da sua presença junto a elas?

            Andando pelo meio da multidão faminta, André descobriu um menino que tinha em sua bolsa cinco pães e dois peixes: “Está aqui um menino com cinco pães de cevada e dois peixes. Mas o que é isso para tanta gente?” (Jo 6,9). “Pães de cevada” – eles estavam presentes na narrativa de Elias e reaparecem agora no Evangelho. Só os pobres comem pão de cevada. Portanto, esse menino era pobre. E nós dizemos que, se tivéssemos muito dinheiro, acabaríamos com a fome que há no mundo. Puro engano. Há coisas em nossa vida que o dinheiro não pode comprar, nem alimentar, nem resolver.

“Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, tanto quanto queriam. E fez o mesmo com os peixes” (Jo 6,11). Os mesmos olhos de Jesus, que se levantaram para enxergar a multidão faminta (v.5), foram os olhos que se elevaram ao Pai para agradecer pelos cinco pães e pelos dois peixes: “Todos os olhos, ó Senhor, em vós esperam e vós lhes dais no tempo certo o alimento; vós abris a vossa mão prodigamente e saciais todo ser vivo com fartura” (Sl 145,15-16). Nós temos o hábito de agradecer a Deus pelo alimento que temos em nossa mesa? Depois de ter saciado aquela imensa multidão, Jesus orientou os discípulos: “Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca!” (Jo 6,12). Eis aqui outra causa da fome no mundo: o desperdício de alimento. “Mais de 1 bilhão de refeições vão parar no lixo diariamente no mundo; número é maior que o de pessoas que passam fome” (G1). Outra forma de entender o desperdício: quanto tempo desperdiçado diante do celular, dos jogos eletrônicos ou da TV? Quantas ocasiões desperdiçadas que poderiam diminuir distâncias e favorecer o reencontro?

Após ter sido saciada pela partilha que Jesus realizou, a multidão quis proclamá-lo rei. “Mas, quando notou que estavam querendo levá-lo para proclamá-lo rei, Jesus retirou-se de novo, sozinho, para o monte” (Jo 6,15). Sempre que quisermos transferir para Jesus responsabilidades que são nossas, ele vai se retirar e nos deixar falando sozinhos. Ele pode transformar toda e qualquer situação da nossa vida, desde que estejamos dispostos a fazer a nossa parte, a colocar em comum nossos cinco pães e nossos dois peixes. Todo e qualquer milagre exige a nossa participação, a nossa fé, a nossa disposição de mudar de atitude e o nosso esforço em colocar algo da nossa parte para alimentar aquilo que não queremos que morra.

Enfim, não nos esqueçamos do apelo do apóstolo Paulo: “Aplicai-vos a guardar a unidade do espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4,3). Ao invés de alimentarmos brigas e discussões, alimentemos diálogo, respeito, perdão, aproximação e reconciliação, na família, no ambiente de trabalho, em nossas comunidades paroquiais, nas escolas/faculdades, na vida do dia a dia.

 

Naquele tempo, na China, um discípulo perguntou ao mestre: - "Mestre, qual a diferença entre o Céu e o inferno?" E o mestre respondeu: - "É muito pequena, mas com grandes consequências." E o mestre explicou: - "Vi um grande monte de arroz, cozido e preparado como alimento. Ao redor dele, havia muitos homens, quase morrendo de fome. Eles não podiam se aproximar do monte de arroz, mas possuíam longos palitos de 2 a 3 metros de comprimento. No entanto, embora conseguissem apanhar o arroz, não conseguiam levá-lo até à boca porque os palitos, em suas mãos, eram longos demais. Assim, famintos e moribundos, embora juntos, permaneciam SOLITÁRIOS, curtindo uma fome eterna, diante de uma fartura inesgotável. Meu amigo: isto é o inferno."

E o mestre prosseguiu: - "Vi outro grande monte de arroz, cozido e preparado como alimento. Ao redor dele, havia, também, muitos homens e mulheres famintos, mas cheios de vitalidade. Eles, também, não podiam se aproximar do monte de arroz, pois possuíam longos palitos de 2 a 3 metros de comprimento. Eles, também, encontravam as mesmas dificuldades para levar à própria boca o arroz, já que os palitos eram longos demais. Porém, eis a grande novidade: com seus longos palitos, em vez de levarem à própria boca, eles serviam o arroz uns aos outros. Dessa forma, numa grande comunhão fraterna, juntos e SOLIDÁRIOS, matavam sua fome. Meu amigo: isso é o Céu."

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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