Missa do 15º dom. comum. Palavra de Deus: Amós 7,12-15; Efésios 1,3-14; Marcos 6,7-13.
A
palavra-chave da nossa liturgia deste final de semana é “ENVIADO”. Para
compreendê-la, podemos recordar as palavras de Jesus aos seus discípulos, na
noite do domingo de Páscoa: “Como o Pai me enviou, também eu vos envio” (Jo
20,20). Esse envio se deu, num primeiro momento, no coração de Deus: “Em Cristo, ele
nos escolheu, antes da fundação do mundo” (Ef 1,4). Nossa existência foi um
desejo de Deus. Ele nos enviou ao mundo para uma tarefa, uma missão. Como gosta
de afirmar o Papa Francisco, a nossa existência contém uma palavra única que
Deus deseja dirigir à humanidade.
No Antigo
Testamento, o sinônimo de enviado é “PROFETA”. Ele é a voz de Deus que deve
ecoar na consciência dos homens. Ninguém se torna “profeta” ou “enviado” por
iniciativa própria, mas de Deus. Além disso, a missão do profeta é anunciar uma
palavra que não é sua, mas de Deus. Aqui podemos nos perguntar: nós aceitamos
ouvir os profetas de Deus do nosso tempo, mesmo quando a mensagem que proclamam
vai contra a corrente e exige de nós conversão?
O diálogo que o profeta Amós tem com o
sacerdote Amasias revela o custo em ser profeta: ele deve ser a consciência
crítica não só da política, mas também da religião. Convocado e enviado por
Deus, Amós denuncia um culto vazio e estéril, refém de interesses políticos e
aliado da injustiça, um culto que não liberta nem salva. Todo cristão
chamado a ser profeta não deve se calar diante das injustiças, sejam elas
praticadas ou toleradas tanto pela política quanto pela religião.
Enquanto a primeira leitura nos fala do
envio de Amós, o Evangelho nos fala da do envio dos discípulos de Jesus. Até
agora eles estavam ouvindo e aprendendo de Jesus, mas chegou o momento de serem
ENVIADOS em missão. Neste sentido, cada um de nós é chamado a ser também discípulo
e missionário: “O Senhor Deus me deu língua de discípulo para que soubesse
trazer ao cansado uma palavra de conforto” (Is 50,4). Na celebração eucarística
escutamos a Palavra de Deus como discípulos. Ao voltarmos para a nossa vida
cotidiana, somos enviados para a missão de levar uma palavra de conforto à
pessoa abatida.
Ao enviar os Doze, Jesus “recomendou-lhes
que não levassem nada para o caminho, a não ser um cajado; nem pão, nem sacola,
nem dinheiro na cintura” (Mc 6,8). O cajado, na época, servia de apoio para
caminhar e também para defender-se de animais selvagens. Em outras palavras, ao
nos enviar em missão, Jesus quer que estejamos totalmente livres e não amarrados
a bens materiais; caso contrário, a preocupação com os bens materiais pode nos
roubar a liberdade e a disponibilidade para a missão. Jesus nos quer livres de
interesses humanos, não presos a ninguém, nem nos apoiando em garantias humanas
que supostamente garantam o sucesso da missão. Desprovidos de nós mesmos,
inclusive das nossas próprias capacidades, devemos realizar a missão que nos
foi confiada apoiando-nos unicamente na graça de Deus.
Um detalhe não pode ser esquecido. Antes
de Jesus enviar os Doze em missão, quis que eles vissem o seu “fracasso” em
Nazaré (evangelho de domingo passado – Mc 6,1-6). Portanto, os discípulos de
ontem (os Doze) e de hoje (nós) devem estar preparados para a rejeição, o
fechamento e a indiferença das pessoas em relação ao anúncio do Evangelho. Não
é porque trabalhamos para Deus que as portas do mundo se abrirão gentilmente
para nós; muito pelo contrário. Da mesma forma como a palavra de Amós incomodou
a política e a religião do seu tempo, e da mesma forma como a palavra de Jesus
incomodou os nazarenos, a nossa missão de sermos um Evangelho vivo para as
pessoas enfrentará rejeição por parte de muitos.
Eis porque Jesus dá aos Doze a seguinte
recomendação: “Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos escutar,
quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!” (Mc
6,11). Não devemos carregar conosco a poeira da rejeição daqueles que se
fecharam à Palavra de Deus. Esse tipo de fechamento não deve nos contaminar,
nos intimidar e nos convencer de que “não adianta” evangelizar o mundo no qual
estamos. Sacudir a poeira dos pés significa, portanto, deixar que a atitude de
fechamento fique somente com aqueles que, um dia, serão julgados pela Palavra
que rejeitaram.
Uma última palavra: “Não há nada no
mundo que habilite uma pessoa a superar dificuldades externas e limitações
internas, como a consciência de ter uma tarefa na vida” (Victor Frankl). Quando
tomamos consciência de que “somos uma missão nesta terra; por isso estamos
neste mundo” (Papa Francisco, EG 273), encontramos força para transcender as
adversidades momentâneas e sermos fiéis à tarefa que a vida nos confiou.
Conta-se que, após Hitler ser derrotado, todos os judeus foram libertos dos
campos de concentração. No campo onde Victor Frankl se encontrava, os judeus
restantes foram colocados num caminhão, para serem transportados para casa. Por
ser médico, Victor Frankl decidiu ficar no campo de concentração, cuidando dos
doentes; portanto, fiel à sua missão. Minutos depois, o caminhão que
transportava os judeus explodiu: era uma armadilha dos nazistas, seu último
suspiro de ódio contra os judeus. Victor Frankl não morreu junto com aqueles
judeus por ter se mantido fiel à sua missão. Em outras palavras, quem não se
desvia do foco da sua missão sempre encontra sentido para viver e não “explode”
diante dos reveses da vida.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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