Missa do 4º dom. advento. Palavra de Deus: 2Samuel 7,1-5.8b-12.14a.16; Romanos 16,25-27; Lucas 1,26-38.
Onde Deus habita? Onde Ele escolheu habitar? A resposta
se encontra no livro do profeta Isaías: “Eu, o Senhor, habito em lugar alto e
santo, mas estou junto com o humilhado e desamparado, a fim de animar os
espíritos desamparados, a fim de animar os corações humilhados” (57,15).
O rei Davi, sustentado por Deus, derrotou todos os
seus inimigos e construiu um palácio majestoso em Jerusalém. Instalado no seu
palácio, pensou em construir um Templo para Deus habitar, uma vez que a Arca da
Aliança, símbolo da presença de Deus no meio de Israel, “habitava” numa tenda,
símbolo não só de provisoriedade, mas também do Deus peregrino, que caminha com
seu povo.
A ideia de Davi parecia boa, tanto que até o profeta
Natã assinou embaixo! Mas Deus tinha outros planos: não era Davi que construiria
uma casa (Templo) para Deus habitar, e sim o próprio Deus faria uma casa para
Davi: “(...) o Senhor te anuncia que te fará uma casa... Tua casa e teu reino serão
estáveis para sempre diante de mim” (2Sm 7,11.16). A “casa” era o juramento de
que nunca faltaria no trono de Israel um descendente de Davi.
Quando Salomão, o filho de Davi, construiu o Templo
de Jerusalém, Deus acolheu aquela construção enchendo-a com a nuvem da Sua
presença, a ponto de Salomão se encher de orgulho e afirmar: “O Senhor decidiu
habitar a Nuvem escura. Sim, eu construí para ti uma morada, uma casa em que habitas
para sempre” (1Rs 8,12-13). Mas Salomão estava enganado. O Templo que ele
construiu não era eterno. Destruído em 587 aC, pela Babilônia, e reconstruído
mais tarde por Esdras e Neemias, o Templo de Jerusalém foi destruído pelo
Império Romano no ano 70 dC, restando dele, até hoje, apenas uma parte da sua muralha
externa, chamada de “muro das lamentações”. Curiosamente, no lugar do Templo
foi construída a principal mesquita dos muçulmanos.
O que tudo isso tem a nos dizer? Nenhuma casa ou
templo que possamos construir para Deus habitar é garantia de que Ele estará
ali “para sempre”. Como afirmou Estêvão, “o Altíssimo não habita em obras de
mãos humanas” (At 7,48). Nenhuma igreja ou religião pode se presumir “possuidora”
de Deus. Deus é absolutamente livre e não cabe dentro de nenhum templo, nenhuma
igreja, nenhuma ideia, nenhum conceito e nenhum sentimento ou emoção que
possamos ter ou experimentar a respeito d’Ele.
Onde Deus habita? Onde Ele escolheu habitar? Ele escolheu
habitar no seio de uma virgem, moradora da insignificante Nazaré. “De Nazaré
pode sair algo de bom?” (Jo 1,45), perguntou Natanael. Por que Deus, ao desejar
se fazer pessoa humana em seu Filho Jesus Cristo, não escolheu o seio de uma
rainha, de uma mulher da corte, de uma habitante da capital de Israel,
Jerusalém? Por que se fazer pessoa humana no seio de uma simples “Maria”,
habitante de uma desprezada e até mesmo odiada Nazaré? Exatamente porque Ele escolheu
fazer sua morada entre os insignificantes e entre os desamparados deste mundo.
A liturgia de hoje nos convida a reler a nossa
história de vida. Nós acolhemos a nossa “insignificância” e o nosso “desamparo”
perante o mundo? Talvez, o “Templo” que um dia construímos a Deus, na esperança
de que Ele nunca nos abandonasse, na pretensão de que Ele ficasse conosco para
sempre, tenha sido destruído. Não só isso; talvez a casa que Deus prometeu “ser
estável para sempre” em nossa vida foi ou esteja sendo destruída. O que hoje é “estável
para sempre”? Nada, absolutamente nada. Nossa fé não vive de estabilidade; ela
vive de uma convicção: “Para onde ir longe do teu Espírito? Para onde fugir, longe
da tua presença? Se subo aos céus, tu lá estás; se desço ao abismo, ali também te
encontro” (Sl 139,7-8).
Deus está conosco como Presença escondida, quer
estejamos “para cima”, quer estejamos “para baixo”; quer a nossa casa esteja
estável, quer ela esteja instável; quer ela ainda esteja em pé, quer ela tenha
sido destruída. Da mesma forma como uma nuvem cobria a Tenda da Habitação no
deserto (cf. Ex 40,36-38), assim o Espírito Santo cobriu Maria com sua sombra
(cf. Lc 1,35), a fim de torná-la grávida de Jesus. Portanto, nós hoje
suplicamos que essa mesma sombra do Espírito de Deus nos cubra e nos engravide
de fé, de esperança, de alegria, de coragem, de perseverança, de suportação, de
fidelidade, de confiança, de modo que possamos dizer a Deus o que Maria disse: “Faça-se
em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38).
Nesta véspera de Natal oferecemos a Deus a nossa
insignificância, a nossa instabilidade, a nossa casa, a nossa Nazaré, o nosso
seio, a nossa humilhação, o nosso desamparo, e pedimos que Ele venha habitar em
nós; que Ele venha reconstruir a nossa casa; que Ele venha nos ajudar a
suportar a instabilidade deste mundo, fixando nossos corações onde se encontra
a estabilidade do Seu Reino eterno. Que o Deus que escolheu estar junto com os
humilhados e desamparados nos coloque também junto deles, onde podemos
experimentar a “carne” de seu Filho Jesus, a verdade do seu Natal.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
Obrigado, mais uma vez Pe. Paulo, por suas reflexões. Feliz Natal e uma 2024 muito próspero para vc e tooas suas atividades pastorais.
ResponderExcluirIgualmente, caríssimo irmão! Deus o abençoe!
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