Missa do Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor. Palavra de Deus: Isaías 50,4-7; Filipenses 2,6-11; Mateus 27,11-54.
Onde abrir uma empresa: no centro da
cidade ou na periferia? Segundo a mentalidade de mercado, o centro é preferível
à periferia. Ao enviar seu Filho ao mundo, o Pai não escolheu o centro, mas a
periferia; não escolheu a capital Jerusalém, mas a pequena Belém e a
insignificante Nazaré como lugares do nascimento e do crescimento de seu Filho.
Mas hoje Jesus chega ao centro, à capital do seu País, porque ele mesmo disse
que “não é bom que um profeta morra fora de Jerusalém” (Lc 13,33). Jerusalém, a
capital, precisa ter consciência de que sua política e sua religião produzem
morte, ao invés de vida. Da mesma forma, Jesus hoje entra em nossa capital, no
centro da nossa vida, para que nós mesmos possamos nos dar conta se somos humildes
ou arrogantes, promotores de guerra (montados sobre um cavalo) ou de paz
(montados sobre um jumentinho); se florescemos aonde a mão de Deus nos plantou
ou se vivemos lamentando por não ocuparmos um lugar central neste mundo marcado
por vaidade e por competição; se nossas atitudes promovem vida ou morte à nossa
volta.
A vida de Jesus foi uma vida de discípulo
de Deus. O discípulo primeiro ouve, escuta, aprende, para depois “levar uma
palavra de conforto à pessoa abatida”. Hoje nós somos discípulos de Jesus. Como
está a nossa escuta da sua Palavra (Evangelho)? Quais palavras saem da nossa
boca: palavras que edificam, que consolam, que levantam e transmitem esperança,
ou palavras que destroem, desanimam e afundam as pessoas no desânimo?
Além disso, Jesus foi uma pessoa que
enfrentou a realidade com suas adversidades e contrariedades. Ele não virou o
rosto e não se desviou daquilo que cabia a ele enfrentar. Como nós nos
comportamos diante da realidade? Fugimos dela? Nós a negamos ou a acolhemos
como o tempo em que fomos chamados a viver e a testemunhar a nossa fé?
Lembremos das palavras do Papa Francisco: “Não podemos esperar que tudo à nossa
volta seja favorável, para só então vivermos de acordo com o Evangelho de Jesus”.
Segundo o apóstolo Paulo, Jesus
escolheu viver no mundo como uma pessoa vazia de si mesma, sem orgulho,
soberba, arrogância ou vaidade, para que o Espírito de Deus pudesse habitar n’Ele,
pois “Deus resiste aos soberbos, mas dá a sua graça aos humildes” (1Pd 5,5). Ele
escolheu obedecer a Deus, ao invés de usar Deus para se promover, para ter uma
vida de sucesso e de fama. Como nós lidamos com os apelos de uma sociedade que
cultua o ego, incentiva a vaidade e idolatra o narcisismo? Do quê precisamos
nos esvaziar, para que a graça de Deus possa habitar em nós? Nossos joelhos se
dobram diante do Senhor Jesus ou diante de coisas que nos escravizam?
A narrativa da Paixão nos fala da
maneira como Jesus lidou com a violência, a injustiça, a dor e a morte. Ele não
respondeu às perguntas nem dos sumos sacerdotes, nem de Pilatos, porque sabia
que eram homens que não estavam interessados na verdade: “‘Não estás ouvindo de quanta coisa eles te acusam?’ Mas Jesus não respondeu uma só palavra, e o
governador ficou muito impressionado” (Mt 27,13-14). Nós ainda confiamos na força
da verdade, ou também estamos convencidos de que a mentira é necessária para se
sobreviver e obter sucesso no mundo atual?
Diante da anistia pascal, a multidão
escolheu Barrabás ao invés de Jesus. Existe hoje uma inversão de valores, uma
identificação doentia com o mal, com o bandido, com o assassino, com o
anti-herói. Como nós estamos em relação a isso? Os meus valores também estão
invertidos? Jesus é modelo de ser humano para mim? É nele que eu me inspiro,
para orientar minha conduta no dia a dia?
Diante da escolha da multidão por
Barrabás, Pilatos lavou as mãos: “Eu não sou
responsável pelo sangue deste homem. Este é um
problema vosso!”
O povo todo respondeu: “Que o sangue dele caia sobre nós e sobre os nossos filhos” (Mt 27,24-25).
A Campanha da Fraternidade lembrou da nossa responsabilidade diante dos que
passam fome: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14,16). Temos uma parcela de
responsabilidade pelo tipo de sociedade em que vivemos. O sangue que é
derramado injustamente perto de nós cedo ou tarde nos atingirá: “Ou nos
salvamos todos, ou não se salva ninguém” (Papa Francisco, FT n.137).
Estando
crucificado, Jesus ouviu insultos: “Salva-te a ti mesmo! Se és o Filho de Deus, desce da cruz!” (Mt 27,40). “A outros salvou... a
si mesmo não pode salvar!
Desça agora da cruz! e
acreditaremos nele.
Confiou em Deus; que o livre agora, se é que Deus o ama!” (Mt 27,42.43). A cruz de Jesus nos recorda que nós
nem sempre escolhemos o tipo de sofrimento que vamos enfrentar, mas sempre
podemos escolher a maneira de lidar com ele. A cruz também questiona a nossa
imagem de Deus: Ele existe? Ele me ama? Por que permitiu esse sofrimento em
minha vida?
Mas o mais perigoso é o fato de que a cruz nos faz
experimentar a ausência, o abandono de Deus: “Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonaste?” (Mt 24,46). Precisamos levar a sério as pessoas que não acreditam
em Deus devido ao sofrimento que existe no mundo. Além disso, precisamos estar
preparados para essa experiência terrível da ausência ou da sensação de sermos
abandonados por Deus. “Jesus não duvida de sua existência nem de seu poder para
salvá-lo. Queixa-se de seu silêncio: onde está? Por que se cala? Por que o
abandona precisamente no momento em que mais precisa dele? Jesus morre na noite
mais escura. Morre com um ‘por que?’ nos lábios” (Pagola, Jesus – aproximação histórica,
p.484).
A
resposta do Pai se dá após a morte do Filho! “E eis que a cortina do santuário rasgou-se de alto a baixo, em duas partes, a terra
tremeu e as pedras se partiram. Os túmulos se abriram e muito corpos dos santos falecidos ressuscitaram! Saindo dos túmulos,
depois da ressurreição de Jesus, apareceram na
Cidade Santa e foram vistos por muitas pessoas” (Mt 27,51-53). O céu se rasga
para acolher a oferenda do Filho em favor de toda a humanidade: “Ele provou a
morte em favor de todos os homens” (Hb 2,9). O céu se rasga para dizer que Deus
não aprova a violência e as injustiças que provocam a morte de tantas pessoas e
que, aqueles que o mundo mata, Deus ressuscita. A força redentora da morte de
Jesus se comprova na imediata ressurreição dos santos falecidos.
Hoje,
entregamos ao Pai nossa experiência de cruz e a crucificação de tantas pessoas
que morrem injustamente em nosso mundo. Clamamos pela sua intervenção na face
da terra (terremoto) e nos colocamos todos debaixo do véu rasgado, para receber
do céu os benefícios da morte redentora de nosso salvador Jesus Cristo.
Pe. Paulo Cezar Mazzi