quinta-feira, 9 de março de 2023

DE QUAL FONTE ESTOU BEBENDO, PARA SACIAR MINHA SEDE DE SENTIDO?

 Missa do 3º dom. Quaresma. Palavra de Deus: Êxodo 17,3-7; Romanos 5,1-2.5-8; João 4,5-7.9-10.14-26.29-30.39-42 (forma breve).

 

            A sede, assim como a fome, é uma necessidade básica que exige ser satisfeita. Saciar a sede é até mais importante do que saciar a fome, pois um ser humano consegue ficar dias sem comer, mas não sem beber água. Água é vida. Sobretudo na Sagrada Escritura, nascida no Oriente Médio, lugar árido e de escassez de água, a água é tão essencial para a vida que chega a ser comparada ao próprio Deus, que descreve a si mesmo como “fonte de água viva” (Jr 2,13).  

            Nós, seres humanos, temos diversos tipos de sede: sede de amor, de paz, de afeto; sede de justiça, de oportunidade, de igualdade; sede de fé, de esperança, de Deus (cf. Sl 42,2-3; 63,2). Não basta tomarmos consciência de que estamos com sede; precisamos identificar qual é a nossa sede para não darmos uma resposta errada a ela, tentando preencher vazio com vazio (a cisterna furada de Jr 2,13). Além disso, como nos mostrou o texto do Êxodo, suportar a sede é o preço que às vezes temos que pagar para sermos livres. Na sede que sentiu em determinado ponto da travessia pelo deserto, Israel preferiu voltar a ser escravo no Egito. O sofrimento causado pela abstinência de droga, por exemplo, é uma sede que precisa ser suportada, em vista da libertação do vício da droga. Isso vale também para outros vícios. Nós precisamos aprender a suportar determinadas sedes, se queremos nos libertar do mal que certas águas intoxicadas causam em nós.

            Jesus apresenta-se no Evangelho como verdadeira fonte de água viva. Cansado e com sede – era meio dia! –, ele se senta junto ao poço de Jacó e pede a uma mulher samaritana: “Dá-me de beber!” (Jo 4,7). Ao fazer esse pedido, Jesus está quebrando duas barreiras que existiam na sua época – um judeu não dialoga com um samaritano, assim como também um homem não dialoga com uma mulher em público. Quais barreiras existem entre você e Jesus, ou entre você e as pessoas das quais Jesus quer que você se aproxime?  

            Diante do espanto da mulher, Jesus lhe diz: “Se conhecesses o dom de Deus...” (Jo 4,10). Jesus é o verdadeiro e grande dom de Deus para saciar a sede de sentido de vida de cada ser humano! Além disso, o fato de Jesus ser “dom de Deus” significa que, para você poder beber da sua fonte de água viva, basta uma coisa: que tenha sede: “Quem tem sede, venha a mim e beba” (Jo 7,37). Jesus não disse: ‘Quem não vive em pecado, venha a mim e beba’ ou ‘Quem está com os sacramentos em dia, venha a mim e beba’. A condição para ter acesso à água viva que Jesus tem a oferecer é uma só: ter sede, o que significa sentir a necessidade de que precisa ser salvo; ter a consciência de que a sua cisterna está furada e não dá para continuar tentando preencher vazio com vazio.

            Qual é a sua sede, nesse momento? Como você tem procurado saciá-la? De onde você tem procurado beber, para que sua vida tenha sentido? Diante da promessa de Jesus de oferecer não apenas água, mas “água viva”, água que faz a pessoa sentir-se viva a partir de dentro, a mulher pediu: “Senhor, dá-me dessa água” (Jo 4,15), e Jesus lhe provocou: “Vai chamar teu marido e volta aqui” (Jo 4,16), e a mulher confessou a verdade: “Eu não tenho marido” (Jo 4,17). A salvação que Jesus veio nos trazer é um “dom de Deus”, mas a recepção desse dom passa pela abertura à verdade. Em outras palavras, a nossa sede mais profunda só pode ser saciada quando temos a coragem de reconhecer as mentiras que escondemos dentro de nós.

“Disseste bem, que não tens marido, pois tiveste cinco maridos, e o que tens agora não é o teu marido. Nisso falaste a verdade” (Jo 4,18). Por que Jesus toca na questão do marido daquela mulher? Porque, na Bíblia, Deus se define como “marido”, como “esposo” do seu povo, assim como o próprio Jesus é definido como “Esposo da Igreja” (cf. Ef 5,25ss.). A mulher samaritana representa o seu próprio povo, cuja religião sofre a influência de cinco crenças diferentes. Quando a mulher reconhece que o homem com quem vive não é seu marido, está dizendo que ela ainda não fez uma experiência verdadeira de Deus em sua vida.

Para quantos de nós Deus ainda não é Marido, Esposo? Quantos de nós ainda não experimentamos verdadeiramente o Deus que é amor? Quantas coisas ou pessoas estão ocupando o lugar que só pode ser ocupado por Deus, dentro de nós? O lugar de Deus, na vida de muitas pessoas, foi ocupado pelo consumismo, por algum tipo de vício, por doutrinas religiosas doentias e escravizadoras, pelos bens materiais, por uma sexualidade compulsiva e pervertida, pelas redes sociais etc. Não é de admirar que a ansiedade, a depressão, o tédio, a perda de sentido para a vida etc., encontrem tanto espaço dentro das pessoas do nosso tempo. A sede mais profunda continua gritando dentro delas, uma vez que não fizeram uma experiência com o Deus que é “fonte de água viva” (Jr 2,13).

Tendo encontrado em Jesus a coragem para se confrontar com a sua verdade, a mulher samaritana voltou para a sua cidade testemunhando: “Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Será que ele não é o Cristo?” (Jo 4,29). E o Evangelho afirma que “muitos samaritanos daquela cidade abraçaram a fé em Jesus, por causa da palavra da mulher” (Jo 4,39). Estamos no Ano Vocacional. Nossas cidades estão cada vez mais paganizadas – a maioria das pessoas vive como se Deus não existisse. Nossa presença na cidade é uma presença cristã, uma presença que desperta nas pessoas o desejo de conhecerem Jesus Cristo e de permitirem que a verdade do Evangelho as liberte de suas mentiras? Nós já aprendemos com Jesus a dialogar com as pessoas sobre a sede que elas sentem, sem impor-lhes doutrinas religiosas que nada dizem à vida delas?

Quando Jesus fez o convite: “Quem tem sede, venha a mim e beba” (Jo 7,37), estava se referindo ao dom do Espírito Santo, água viva, chamado pela Igreja de “Senhor que dá a vida”. Segundo o apóstolo Paulo, ele é o amor de Deus (Marido, Esposo), derramado em nossos corações (cf. Rm 5,5). Clamemos pelo reavivamento desse amor em nossos corações. Mergulhemos nessa fonte de água viva, que chega a nós pelo peito aberto de Jesus na cruz. Abandonemos nossas cisternas furadas e busquemos com sinceridade Aquele que é nossa fonte de água viva, o único que sacia nossa sede de sentido de vida.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi    

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