Missa do 3º dom. Quaresma. Palavra de Deus: Êxodo 17,3-7; Romanos 5,1-2.5-8; João 4,5-7.9-10.14-26.29-30.39-42 (forma breve).
A sede, assim como a fome, é uma
necessidade básica que exige ser satisfeita. Saciar a sede é até mais
importante do que saciar a fome, pois um ser humano consegue ficar dias sem
comer, mas não sem beber água. Água é vida. Sobretudo na Sagrada Escritura, nascida
no Oriente Médio, lugar árido e de escassez de água, a água é tão essencial para
a vida que chega a ser comparada ao próprio Deus, que descreve a si mesmo como “fonte
de água viva” (Jr 2,13).
Nós, seres humanos, temos diversos
tipos de sede: sede de amor, de paz, de afeto; sede de justiça, de
oportunidade, de igualdade; sede de fé, de esperança, de Deus (cf. Sl 42,2-3; 63,2).
Não basta tomarmos consciência de que estamos com sede; precisamos identificar qual
é a nossa sede para não darmos uma resposta errada a ela, tentando preencher vazio
com vazio (a cisterna furada de Jr 2,13). Além disso, como nos mostrou o texto
do Êxodo, suportar a sede é o preço que às vezes temos que pagar para sermos
livres. Na sede que sentiu em determinado ponto da travessia pelo deserto,
Israel preferiu voltar a ser escravo no Egito. O sofrimento causado pela abstinência
de droga, por exemplo, é uma sede que precisa ser suportada, em vista da
libertação do vício da droga. Isso vale também para outros vícios. Nós
precisamos aprender a suportar determinadas sedes, se queremos nos libertar do
mal que certas águas intoxicadas causam em nós.
Jesus apresenta-se no Evangelho como
verdadeira fonte de água viva. Cansado e com sede – era meio dia! –, ele se
senta junto ao poço de Jacó e pede a uma mulher samaritana: “Dá-me de beber!” (Jo
4,7). Ao fazer esse pedido, Jesus está quebrando duas barreiras que existiam na
sua época – um judeu não dialoga com um samaritano, assim como também um homem
não dialoga com uma mulher em público. Quais barreiras existem entre você e
Jesus, ou entre você e as pessoas das quais Jesus quer que você se aproxime?
Diante do espanto da mulher, Jesus
lhe diz: “Se conhecesses o dom de Deus...” (Jo 4,10). Jesus é o verdadeiro e
grande dom de Deus para saciar a sede de sentido de vida de cada ser humano!
Além disso, o fato de Jesus ser “dom de Deus” significa que, para você poder
beber da sua fonte de água viva, basta uma coisa: que tenha sede: “Quem tem
sede, venha a mim e beba” (Jo 7,37). Jesus não disse: ‘Quem não vive em pecado,
venha a mim e beba’ ou ‘Quem está com os sacramentos em dia, venha a mim e beba’.
A condição para ter acesso à água viva que Jesus tem a oferecer é uma só: ter
sede, o que significa sentir a necessidade de que precisa ser salvo; ter a
consciência de que a sua cisterna está furada e não dá para continuar tentando
preencher vazio com vazio.
Qual é a sua sede, nesse momento?
Como você tem procurado saciá-la? De onde você tem procurado beber, para que
sua vida tenha sentido? Diante da promessa de Jesus de oferecer não apenas
água, mas “água viva”, água que faz a pessoa sentir-se viva a partir de dentro,
a mulher pediu: “Senhor, dá-me dessa água” (Jo 4,15), e Jesus lhe provocou: “Vai
chamar teu marido e volta aqui” (Jo 4,16), e a mulher confessou a verdade: “Eu
não tenho marido” (Jo 4,17). A salvação que Jesus veio nos trazer é um “dom de
Deus”, mas a recepção desse dom passa pela abertura à verdade. Em outras
palavras, a nossa sede mais profunda só pode ser saciada quando temos a coragem
de reconhecer as mentiras que escondemos dentro de nós.
“Disseste
bem, que não tens marido, pois tiveste cinco maridos, e o que tens agora não é
o teu marido. Nisso falaste a verdade” (Jo 4,18). Por que Jesus toca na questão
do marido daquela mulher? Porque, na Bíblia, Deus se define como “marido”, como
“esposo” do seu povo, assim como o próprio Jesus é definido como “Esposo da
Igreja” (cf. Ef 5,25ss.). A mulher samaritana representa o seu próprio povo,
cuja religião sofre a influência de cinco crenças diferentes. Quando a mulher
reconhece que o homem com quem vive não é seu marido, está dizendo que ela
ainda não fez uma experiência verdadeira de Deus em sua vida.
Para
quantos de nós Deus ainda não é Marido, Esposo? Quantos de nós ainda não
experimentamos verdadeiramente o Deus que é amor? Quantas coisas ou pessoas
estão ocupando o lugar que só pode ser ocupado por Deus, dentro de nós? O lugar
de Deus, na vida de muitas pessoas, foi ocupado pelo consumismo, por algum tipo
de vício, por doutrinas religiosas doentias e escravizadoras, pelos bens
materiais, por uma sexualidade compulsiva e pervertida, pelas redes sociais
etc. Não é de admirar que a ansiedade, a depressão, o tédio, a perda de sentido
para a vida etc., encontrem tanto espaço dentro das pessoas do nosso tempo. A
sede mais profunda continua gritando dentro delas, uma vez que não fizeram uma
experiência com o Deus que é “fonte de água viva” (Jr 2,13).
Tendo
encontrado em Jesus a coragem para se confrontar com a sua verdade, a mulher
samaritana voltou para a sua cidade testemunhando: “Vinde ver um homem que me
disse tudo o que eu fiz. Será que ele não é o Cristo?” (Jo 4,29). E o Evangelho
afirma que “muitos samaritanos daquela cidade abraçaram a fé em
Jesus, por causa da palavra da mulher” (Jo 4,39). Estamos no Ano
Vocacional. Nossas cidades estão cada vez mais paganizadas – a maioria das
pessoas vive como se Deus não existisse. Nossa presença na cidade é uma presença
cristã, uma presença que desperta nas pessoas o desejo de conhecerem Jesus
Cristo e de permitirem que a verdade do Evangelho as liberte de suas mentiras? Nós
já aprendemos com Jesus a dialogar com as pessoas sobre a sede que elas sentem,
sem impor-lhes doutrinas religiosas que nada dizem à vida delas?
Quando
Jesus fez o convite: “Quem tem sede, venha a mim e beba” (Jo 7,37), estava se
referindo ao dom do Espírito Santo, água viva, chamado pela Igreja de “Senhor
que dá a vida”. Segundo o apóstolo Paulo, ele é o amor de Deus (Marido, Esposo),
derramado em nossos corações (cf. Rm 5,5). Clamemos pelo reavivamento desse
amor em nossos corações. Mergulhemos nessa fonte de água viva, que chega a nós
pelo peito aberto de Jesus na cruz. Abandonemos nossas cisternas furadas e
busquemos com sinceridade Aquele que é nossa fonte de água viva, o único que
sacia nossa sede de sentido de vida.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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