sexta-feira, 17 de março de 2023

DO NÃO ACEITAR ENXERGAR PARA O QUERER REALMENTE VER E SE RESPONSABILIZAR

 Missa do 4. dom. Quaresma. Palavra de Deus: 1 Samuel 16,1b.6-7.10-13a; Efésios 5,8-14; João 9,1-3.6-9.13-17.24-25.31-41.

 

            Alguns não conseguem enxergar uma saída para a sua vida, uma solução para os seus problemas. Alguns não conseguem mais enxergar o valor da pessoa com quem convivem há anos. Alguns não admitem enxergar o mal que estão fazendo a si mesmos e aos outros. Alguns só enxergam seus próprios interesses.

            Existe um não poder ver, mas existe também um não querer ver. Ver, enxergar, também significa tornar-se consciente, e quem se torna consciente não tem desculpas para continuar a viver como vítima, nem de si mesmo, nem dos outros. Será que você quer realmente ver, ou prefere continuar vivendo como cego? Vivendo como cego, não preciso tomar decisões: os outros decidem por mim; não preciso assumir nenhuma responsabilidade: posso me esconder dos desafios da vida atrás das mesmas desculpas de sempre.

            A cura do cego de nascença (Evangelho) nos fala da necessidade de corrigirmos a visão distorcida que temos em relação ao sofrimento, interpretando que quando Deus permite que uma pessoa sofra, é porque ela pecou: “Mestre, quem pecou para que nascesse cego: ele ou os seus pais?” (Jo 9,2). Na época de Jesus, havia uma mentalidade que afirmava que era possível a uma criança pecar antes de nascer, quando ainda estava no ventre de sua mãe. Jesus corrige essa visão distorcida, ao afirmar: “Nem ele, nem seus pais pecaram” (Jo 9,3).

O Evangelho nos fala de visões que se chocam: de um lado, os fariseus, que veem Jesus como “um homem que não vem de Deus, porque não guarda o sábado” (Jo 9,16), e os judeus, que veem Jesus como “um pecador” (Jo 9,24); de outro, o homem que era cego e que vê Jesus como “um profeta” (Jo 9,17), como “um homem que veio de Deus” (Jo 9,33). Quantas pessoas estão cegas, seja pelo fanatismo, seja pela ignorância? Quantas pessoas são doutrinadas por líderes políticos ou religiosos, por influencers, youtubers etc.?

Jesus afirmou que a verdade do seu Evangelho provoca uma reviravolta, fazendo com que “os que não veem vejam e os que veem se tornem cegos” (Jo 9,39). Os fariseus, que se julgavam ter uma visão esclarecida a respeito de tudo, não aceitam enxergar Jesus como Salvador, coisa que o cego de nascença enxergou não somente com seus olhos físicos, mas também com os olhos da sua fé (cf. Jo 9,38)! Desse modo, um relato que começou acusando um cego de nascença de ser pecador terminou relevando que o pecado não consiste em ter nascido cego (Jo 9,2-3), mas em insistir em não ver, em não querer enxergar (Jo 9,40-41).

            Depois de curado por Jesus, o cego começou a ver as coisas de uma outra forma, a ponto de não ficar mais em silêncio diante dos fariseus e de questioná-los pelo fato deles não quererem enxergar que Jesus era um homem de Deus (cf. Jo 9,30-33)! É assim que Jesus nos quer! Não homens e mulheres fatalistas, sentados à beira do caminho da vida, com os olhos fixos na tela de um celular, anestesiados por vídeos e imagens que nos mantêm distraídos, paralisados, sem dar passos concretos na direção da mudança que o próprio Deus quer que busquemos, para nós e para a sociedade.

O conflito entre os judeus e o homem que era cego fez com que este fosse expulso da sua comunidade religiosa (cf. Jo 9,34). Quando começamos a enxergar melhor as coisas, passamos a enfrentar conflitos com pessoas que até então nos impunham a sua maneira de ver. Mas existem certos rompimentos que são necessários. Quando começamos a ver com um pouco mais de profundidade, entendemos que precisamos nos afastar de pessoas e de hábitos que são nocivos, que nos adoecem, por nos oferecerem uma visão distorcida da realidade.

Assim como Jesus conversou com o homem que havia sido expulso da comunidade, ele nos pergunta se estamos dispostos a continuar aprofundando a nossa visão, compreendendo melhor a nós mesmos, os outros e à própria vida. Jesus nos convida a aceitar o desafio de permitir que certos acontecimentos quebrem com a imagem que temos de Deus, uma imagem distorcida, incorreta, que precisa ser reformulada porque não está sendo suficiente para sustentar a nossa fé frente aos acontecimentos do mundo atual.

“Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e sobre ti Cristo resplandecerá” (Ef 5,14). Desperte! Pare de depender da visão dos outros. Aprenda a enxergar com seus próprios olhos. Não aceite mais ser guiado(a) na vida por pessoas erradas. Lembre-se de que “se um cego conduz outro cego, ambos acabarão caindo num buraco” (Mt 15,14). Como é que um viciado em droga pode ajudar alguém que está querendo sair das drogas? Como é que uma pessoa que vive praticando adultério pode aconselhar positivamente alguém com problemas no seu relacionamento conjugal? Perceba quem é que influencia a sua visão a respeito do casamento, da família, da sexualidade, da política, do meio ambiente etc. Não tenha medo de romper com pessoas e situações que desejam manter você na cegueira, na ignorância de si mesmo e das possibilidades de mudança. Deixe-se conduzir pela luz do Senhor e da sua Palavra!

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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