Missa de Natal. Palavra de Deus: Isaías 9,1-6; Tito 2,11-14; Lucas 2,1-14.
Quando nasce uma criança, nós
dizemos que a mãe deu à luz um filho. Mas, no caso do nascimento de Jesus, a
Escritura afirma que ele “era a luz de verdade, que, vindo ao mundo, ilumina
todo ser humano” (Jo 1,9). Esta noite ou dia de Natal nos convida a nos deixar
envolver pela luz do Menino que é Luz, luz que significa orientação, esperança,
saída de uma situação de escuridão; luz que, por ser sinônimo de verdade, liberta-nos
dos nossos autoenganos e de todo tipo de mentira que nos escraviza; mais do que
tudo, luz que dá a todo ser humano a possibilidade de ver, experimentar, a
salvação que vem de Deus.
“Para os que habitavam na sombra da
morte, uma luz resplandeceu” (Is 9,1). O grande problema de “habitar na sombra
da morte” é habituar-se com ela, como os morcegos, que se sentem totalmente à
vontade quando estão no escuro. Muitas pessoas nasceram e cresceram habituadas
com a escuridão. Para elas, a luz agride, incomoda. Por isso, embora Jesus
tenha nascido como luz para iluminar todo ser humano que nasce, isso não
significa que sua luz seja desejada ou acolhida por todos. Nós mesmos, que
celebramos o Natal de Jesus, precisamos nos perguntar se, de fato, desejamos que
a luz da sua verdade ilumine todos os recantos da nossa alma, onde habitam as
nossas sombras mais escuras.
A celebração do nascimento de Jesus
nos fala da maneira pequena, discreta, até mesmo insignificante, como Deus
decide entrar na história humana, para redimi-la a partir de dentro: Jesus não
nasce na capital do Império Romano (Roma), nem na capital de Israel
(Jerusalém), mas na insignificante cidade de Belém. Nossos olhos foram
doutrinados a enxergar somente o que é grande e tem a aparência de importante.
Tudo o que é simples, pequeno e humilde não é visto por nós, e se o vemos, o
desprezamos. Com isso, acabamos jogando fora a salvação de Deus, porque ela que
não vem a nós embrulhada num enorme pacote de presente, mas mediada por
acontecimentos simples e corriqueiros do dia a dia.
“Nasceu para nós um menino, foi-nos dado um
filho”
(Is 9,5). A salvação de Deus não vem a nós por meio de um adulto forte, mas por
meio de uma criança recém-nascida, que necessita ser acolhida e cuidada por
nós. Em outras palavras, a salvação é um processo. Devemos respeitar as suas
fases, o seu crescimento, o seu desenvolvimento, o que exige de nós cultivo
diário, paciência, perseverança e confiança. Acelerar artificialmente o processo
não funciona. O menino que nasceu para nós, o filho que nos foi dado, não deve
ser abortado pelo nosso imediatismo.
A
celebração do nascimento de Jesus nos convida a acolher a salvação de Deus que
se manifesta a nós na Palavra: “No princípio
era a Palavra,
e a Palavra estava com Deus; e a Palavra era Deus... Tudo foi feito por ela e
sem ela nada se fez
de tudo que foi feito. Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a Palavra se
fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,1-3.14). Muitos gostariam de ouvir Deus
diretamente, sem a mediação de um pregador, de uma religião ou de uma igreja.
Mas Deus escolheu falar conosco por meio de seu Filho único, Jesus Cristo: “Muitas vezes e de muitos modos falou Deus outrora aos nossos pais, pelos
profetas;
nestes dias, que são os últimos, ele nos falou por meio do Filho” (Hb 1,1).
Qual
é o problema aqui? O problema é que Jesus foi rejeitado por ser uma pessoa como
nós. As próprias pessoas de Nazaré, lugar onde Jesus foi criado, não tinham fé
nele (cf. Mc 6,1-6). Hoje essa rejeição cresceu e se alastrou pelo mundo: grande
parte das pessoas não querem um Deus encarnado – feito pessoa humana –, mas um
Deus somente espiritual, celeste, transcendente. Elas querem ser salvas como
que “para fora da sua própria carne”. Por isso, buscam espiritualidades
desencarnadas, distantes da realidade humana, descomprometidas com a realidade
social na qual vivem. No entanto, o Natal nos convida a nos reconciliar com a
nossa própria carne, com o nosso humano, e a não desprezar nenhum ser humano,
porque ele é nossa carne (cf. Is 58,7).
“A
graça de Deus se manifestou trazendo a salvação para todos os homens” (Tt
2,11). O Natal é, antes de tudo, graça. Não somos salvos por mérito ou por
esforço nosso, mas por pura graça de Deus. Ela é como a chuva: não podemos
produzi-la; podemos, apenas, fazer como a terra: nos abrir para recebê-la;
permitir que ela penetre calmamente em nós e desça ao mais profundo de nós
mesmos, despertando nossa vitalidade interior, que nos faz fecundos,
independentemente das condições externas e adversas à nossa volta. Além disso,
a graça da salvação é destinada a todas as pessoas: se existe descrédito em
relação ao sentido do Natal é porque a nossa forma de celebrá-lo não contempla
a todos, mas somente aqueles que pensam como nós.
“Hoje,
na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo Senhor” (Lc
2,11). Cristo não nasceu para Maria, nem para José, mas para todos,
especialmente para cada pessoa que necessita ser salva. Esse Cristo é o Senhor,
título exclusivo de Deus Pai no Antigo Testamento e que havia sido usurpado
pelo imperador de Roma. Para nós, cristãos, só existe um Senhor: Cristo Jesus. “Quem
nele crê não será confundido... Ele é Senhor de todos, rico para todos os que o
invocam. Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor (Jesus) será salvo”
(Rm 10,11.13). Coloquemo-nos sob o senhorio de Cristo e sejamos anunciadores da
sua salvação às pessoas do nosso tempo.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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