Missa do 29. dom. comum. Palavra de Deus: Êxodo 17,8-13; 2Timóteo 3,14 – 4,2; Lucas 18,1-8.
Jesus nos deixa claro, no Evangelho de hoje, que é
necessário rezar sempre e nunca desistir. Ele mesmo rezava sempre, todos os
dias; se não conseguia fazê-lo durante o dia, por causa das multidões que o
procuravam, fazia-o à noite, ou de madrugada, mas jamais deixava de rezar.
A
oração não é uma questão de tempo, nem de vontade. Ela nasce de uma convicção:
sem Deus, eu nada posso. O texto do livro do Êxodo que hoje ouvimos deixa claro
que, durante a nossa vida, teremos inúmeros combates a enfrentar, e se não rezarmos,
seremos sempre derrotados. A nossa vitória não depende das nossas forças, nem
das nossas estratégias, mas unicamente da oração. Com afirma a Sagrada
Escritura: “Um rei não vence pela força do exército, nem o guerreiro
escapará por seu vigor. Não são cavalos (armas) que garantem a vitória; ninguém se
salvará por sua força” (Sl 33,16-17). Ninguém vence as dificuldades da vida
apoiando-se apenas em si mesmo, na sua força física, no seu dinheiro, na sua
inteligência, na sua estratégia ou nas suas armas. Para vencermos os combates
da vida, todos nós necessitamos da força do Alto, que só nos é concedida na
oração.
Mas,
e quando a oração se torna uma luta entre nós e Deus? E quando, na oração,
acontece uma batalha entre a nossa vontade e a vontade de Deus? Segundo David
Benner, “nós podemos comparar a oração como um rio. Você é convidado a entrar
neste rio e flutuar nele, deixando-se conduzir pelo Espírito Santo até a
presença de Deus. Mas, quantas vezes você entra nesse rio e, ao invés de se
deixar conduzir pelo Espírito, abraçando a vontade de Deus, você começa a nadar
contra a corrente, opondo resistência ao Espírito, porque quer que prevaleça a
sua vontade e não a vontade de Deus? Quando você faz isso, acaba por
transformar a sua oração num tormento. Isso distancia você da oração”.
A
oração não é o lugar onde nós dobramos Deus à nossa vontade, mas o lugar onde
precisamos acolher a vontade de Deus e confiar que aquilo que ele quer para nós
é, de fato, o melhor. Nós temos a mania de achar que a nossa oração é bem sucedida
quando saímos dela tendo conseguido aquilo que queríamos. Mas não. A oração bem
sucedida é aquela da qual saímos dispostos a fazer a vontade de Deus! E Deus
deseja que nós não fujamos dos confrontos da vida, mas que os enfrentemos com
coragem, paciência e determinação. Neste sentido, é importante compreendermos
que “pedir uma coisa a Deus não é certamente pretender que ele faça, em nosso
lugar, o que nós devemos fazer” (missal dominical, p.1269).
Essa determinação aparece nas palavras de Jesus ao
mencionar a atitude da viúva, que todos os dias batia à porta do juiz para
pedir que lhe fizesse justiça. “Durante muito tempo, o juiz se recusou” (Lc
18,4). É aqui que a nossa confiança na oração começa a se desfazer: temos a
impressão de que Deus se recusa a nos ouvir; se ouve, se recusa a nos atender,
como se não se importasse com a nossa causa. O que chama a atenção, no exemplo
que Jesus usa, é que a viúva não pede ao juiz um favor, que atenda a um capricho
seu, mas que lhe faça “justiça”. Ora, a função de um juiz não é justamente essa:
fazer justiça?
Propositalmente, Jesus usa o exemplo desse juiz
para nos falar de Deus como aquele que jamais deixaria de fazer justiça a quem
por ele clama, na oração: “Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai
fazê-los esperar?
Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa”
(Lc 18,7-8). Eis a certeza que Jesus quer que tenhamos: Deus não ignora as
injustiças que seus filhos sofrem neste mundo. Ele lhes fará justiça, sim. Não
podemos jamais duvidar disso. Não podemos jamais substituir a nossa confiança
em Deus pela sensação de que ele é indiferente ao que nos acontece.
Mas o problema persiste: Quando Deus nos fará
justiça? Quando Deus intervirá, para acabar com o mal que nos aflige? O que
Jesus quer dizer com esse “bem depressa?”. Quantas causas nossas foram
perdidas? Muitas pessoas deixaram de rezar exatamente porque Deus não lhes fez
justiça; elas suplicaram incansavelmente, mas ele não impediu a morte, não
impediu a falência da empresa, não impediu a guerra, não impediu a destruição,
nem o mal.
Diante da decisão de muitas pessoas em deixar de
buscar a Deus na oração, Jesus nos pergunta se, quando ele voltar, encontrará
fé sobre a terra; se encontrará alguém que ainda tenha fé. Ter fé nunca foi e
nunca será simples, porque a realidade em que vivemos é ambígua: nela se
misturam o bem e o mal, a verdade e a mentira, a justiça e a injustiça, e essa
ambiguidade deixa nossa fé confusa. Além disso, nossa fé em Deus sempre cria
expectativas: ele vai nos atender! Ele vai intervir! Ele fará justiça! Mas,
como nos lembra o Pe. Tomás Halík, no seu livro, “A noite do confessor”, “O discurso de Deus
é a própria vida, a vida que é uma correção constante, e por vezes dolorosa,
dos nossos desejos e ilusões” (p.106). Nossa fé, às vezes, precisa ser
purificada dos nossos desejos e ilusões, os quais nada têm a ver com a vontade
de Deus, e essa purificação só se dá numa experiência de forte decepção com
Deus.
Só
uma fé que já se decepcionou com Deus e “brigou” com ele, mas mesmo assim não o
abandonou, não o jogou fora, pode se manter viva até a volta de Jesus. Essa fé
deve nos ajudar a entender que, apesar do
silêncio de Deus, jamais devemos deixar de dialogar com ele, na oração. Ele tem
projetos e planos que nós, na nossa impaciência, não conseguimos compreender. Portanto,
lembremos mais uma vez a carta aos Hebreus: “Sem a fé, é impossível agradar a
Deus. Pois aquele que se aproxima de Deus deve crer que ele existe e que
recompensa os que o procuram” (Hb 11,6).
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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