Missa do 25. dom. comum. Sabedoria 2,12.17-20; Tiago 3,16 – 4,3; Marcos 9,30-37.
Vivemos
quase que constantemente sob pressão e debaixo de muita cobrança. As pressões e
as cobranças geram em nós ansiedade, que nada mais é do que um sentimento de
ameaça: se não correspondermos ao que nos é exigido, perderemos nosso lugar no
mundo. E aí, como iremos sobreviver?
Jesus,
no Evangelho de hoje, questiona nossa correria diária, nossas angústias e
preocupações, a razão de ser de tanta ansiedade em nossa vida. Ao chegar em
casa com seus discípulos, Jesus lhes perguntou: “O que vocês estavam discutindo
pelo caminho?” (Mc 9,33). Mas os discípulos “ficaram calados, pois pelo caminho
tinham discutido quem era o maior” (Mc 9,34). Por que a preocupação em “ser o
maior”? No contexto do Evangelho, ela surgiu como uma reação ao fato de Jesus
tornar seus discípulos conscientes da sua morte de cruz.
Qual
é a preocupação principal na vida de cada um de nós? O que nos motiva a fazer
as coisas que fazemos? O que estamos buscando na vida? Para muitas pessoas, a
motivação principal em fazer o que fazem é a busca do prazer, o seu próprio bem
estar. Para elas, a vida só vale a pena se elas estão se sentindo bem, ainda
que esse “sentir-se bem” seja no âmbito restrito do individualismo, do egoísmo.
Para outras pessoas, a motivação principal da vida é ser “o maior”, “o mais
importante”, tornar-se “a pessoa mais visível”, “sobressair-se” em relação aos
demais. E há um detalhe que precisa ser levado em conta aqui: tanto a pessoa
que busca o prazer (sentir-se bem) como aquela que busca sobressair-se em
relação às demais não suportam frustrações, isto é, não aceitam nenhum tipo de
cruz.
A
vida de Jesus nunca girou em torno do “sentir-se bem”, muito menos do
“sobressair-se” em relação aos outros. Para Jesus, o mais importante na vida
sempre foi ser fiel à razão que justificava a sua própria existência: Ele veio
para servir e para dar a vida em resgate por muitos (cf. Mc 10,45). Sua vida
foi uma vida para os outros, para uma causa, para uma tarefa que visava o bem
comum. Por isso, quando via pessoas correndo atrás de uma felicidade egoísta ou
de uma posição social superior à dos demais, Jesus apontava na direção
contrária, mostrando que ninguém se realiza fechando-se em si mesmo ou se colocando
acima dos outros; a nossa realização humana está em servir, em “viver para”, em
cuidarmos daquilo que está pedindo nossos cuidados.
Eis
porque Jesus, diante da preocupação dos discípulos em saber quem era o maior
dentre eles, toma uma criança, coloca-a no meio deles e a abraça (v.36). Na
época de Jesus, a criança era a pessoa mais desprezível da sociedade. Ela
simplesmente não contava, chegando até mesmo a ser ignorada. Hoje Jesus toma
aquela pessoa que nós mais ignoramos – o lixeiro; o catador de material
reciclável; a pessoa que limpa o prédio onde moramos; a “caixa”, o “entregador”
ou o “repositor” do supermercado, coloca essa pessoa diante de nós e a abraça,
para nos dizer: o sentido da vida não está em ser feliz de maneira egoísta ou
em ser maior do que os outros; o sentido da vida está em fazer-se próximo das
pessoas ignoradas e desprezadas; está em cuidar de quem não é cuidado, em amar
quem não é amado, em defender quem não é defendido por ninguém.
Quem
são as pessoas mais importantes do nosso tempo? Políticos? Juízes? Cientistas? Médicos?
Artistas? Cantores? Jogadores de futebol? Youtubers? E os lixeiros? E os
professores? “O pai da criança sabe o nome de cada jogador do seu time, mas não
sabe o nome da professora do seu filho... O país do futebol deveria ser o país
da educação” (Diogo Almeida - humorista). Nossos valores estão invertidos.
Ainda não entendemos que um cristão ou uma igreja que busca sua própria
grandeza é uma contradição com Cristo e o seu Evangelho, pois Ele deixou claro
que somente quando nos deixarmos afetar pela realidade das pessoas mais frágeis
e ignoradas pelo mundo é que poderemos sentir a presença d’Ele e do Pai! (cf.
Mc 9,37).
Há
um consenso geral de que a humanidade está mais desumana. Além do aumento da
violência e das desigualdades sociais, estamos sendo duramente atingidos pelos efeitos
do aquecimento global: geadas, secas, queimadas e ausência de chuva... O
externo reflete o interno, segundo São Tiago. A desordem externa revela a
interna: inveja e rivalidade, desordens, maldade, guerras e brigas, nascidas
das paixões em conflito dentro de nós; paixões em conflito que são consequência
da constante busca de prazer e de poder. A cobiça é o motor do nosso
consumismo. Matamos, brigamos e fazemos guerra, mas nada conseguimos possuir,
porque tudo está sendo destruído pela nossa ganância sem limites.
São
Tiago nos lembra que tudo poderia ser resolvido pedindo ao Pai, na oração, pois
Ele conhece nossas necessidades (cf. Mt 6,8). Mas, ainda que peçamos, Ele não
nos dará, se a motivação da nossa vida continuar a ser o prazer egoísta e o
desejo de ser o maior, de nos sobressair aos outros. Quando decidirmos tirar o
nosso egoísmo e o nosso individualismo do centro da vida, e abraçarmos tudo
aquilo que está ferido, fragilizado e pedindo para ser cuidado, a vida começará
a mudar. Mas isso levará tempo e exigirá de nós perseverança e constância no
bem, porque ferir e destruir acontecem rapidamente; curar e reconstruir leva
tempo...
Oração:
Senhor Jesus, visita o meu interior e põe fim aos conflitos que estão dentro de
mim, invertendo os meus valores e comprometendo o meu servir. Diante da
tentação do meu fechamento em mim mesmo(a), o Senhor coloca uma criança, uma
pessoa frágil, desprezada e ignorada, para que eu a abrace e cuide dela. Desse
modo, o Senhor me ensina que o sentido da minha vida não está dentro de mim,
mas fora, numa tarefa a ser realizada, num serviço a ser abraçado em favor de
uma pessoa ou de uma causa que é sagrada aos olhos do Pai. Liberta-me da cobiça
e da ganância de ter o que eu não preciso, o que não é essencial para a minha
vida. Concede-me paz de consciência e de coração, para que eu cuide daquilo que
fui chamado(a) a cuidar, e nesse cuidado, que eu encontre a Ti e ao Pai. Amém.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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