quinta-feira, 29 de julho de 2021

PEDIR O QUE EU DESEJO OU PEDIR O QUE EU NECESSITO AOS OLHOS DE DEUS?

 Missa do 18. dom. comum. Palavra de Deus: Êxodo 16,2-4.12-15; Efésios 4,17.20-24: João 6,25-34.

 

“Senhor, dá-nos sempre desse pão” (Jo 6,34). Esse pedido da multidão a Jesus revela que nós, seres humanos, somos seres necessitados. Mas, do que nós necessitamos? Quais são as nossas necessidades?

Nossas necessidades se dividem em três áreas: a física/biológica, a psíquica/emocional e a espiritual. As necessidades físicas/biológicas são o alimento, o descanso, a proteção, ter um teto (casa), um trabalho e uma terra (meio de sobrevivência). As necessidades psíquicas/emocionais são a paz, a alegria, o sentir-se amado, as amizades, o estar com os outros. Por fim, as necessidades espirituais são a fé, a esperança, o sentido da vida, o relacionamento com Deus, a capacidade de transcender, o desejo pela vida eterna.

O Evangelho de hoje nos revela que há uma diferença entre essas três necessidades: enquanto as duas primeiras se impõem a nós sem que precisemos escolhê-las, buscá-las, cultivá-las, a terceira precisa ser escolhida, desejada, buscada, cultivada. Por exemplo: a fome, a sede, o cansaço surgem naturalmente em nós, assim como a necessidade de sobrevivência; o desejo de ser amado, de ter amigos e de estar com as pessoas também surge naturalmente em nós, sem que escolhamos sentir tal necessidade. Mas os valores espirituais não surgem naturalmente em nós: eles têm que ser desejados, buscados e cultivados por nós.

Prestemos atenção ao que Jesus disse à multidão: “Vocês estão me procurando não porque viram sinais (espirituais), mas porque comeram pão e ficaram satisfeitos. Esforcem-se não pelo alimento que se estraga, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, e que o Filho do Homem dará a vocês” (Jo 6,26-27). A grande maioria das pessoas luta e se esforça em sobreviver, em ter o que comer, o que beber, o que vestir, onde morar; em ter um carro, uma casa, em ter amigos, em estar com as pessoas, em se sentirem amadas por alguém etc. Mas, quem se esforça em ter uma vida de oração disciplinada e profunda? Quem se esforça em ler e meditar a Sagrada Escritura diariamente? Quem se esforça em praticar uma religião, em buscar a Deus, em aprofundar seu relacionamento com Ele? Quem se esforça em viver conforme Jesus viveu, em ser uma pessoa justa, coerente, humilde, sensível à dor do seu semelhante?

Jesus está nos fazendo um convite: transcender; enxergar a vida para além das necessidades biológicas e psicológicas e ter a coragem de reconhecer que em cada um de nós há uma dimensão espiritual que pede atenção, alimento e cultivo. Se essa dimensão não for ouvida e levada em conta, vai causar em nós um constante vazio, uma constante insatisfação, uma constante falta de sentido. Como a maioria das pessoas não reconhece o espiritual dentro de si e, se o reconhecem, não se dão ao trabalho de cuidar dele, elas procuram preencher seu vazio interior com excesso de trabalho, com bebida, sexo, drogas, consumismo, ou silenciando o grito do seu espírito com remédios psicotrópicos (sedativos, calmantes, antidepressivos etc.).  

Tanto o Pai quanto o Filho sabem que nós somos seres necessitados. Ao falar sobre a oração, Jesus afirmou que “o Pai de vocês sabe do que vocês têm necessidade antes que vocês lhe peçam alguma coisa” (Mt 6,8), e ao nos ensinar a orar, nos ensinou a pedir: “o pão nosso de cada dia nos dai hoje” (Mt 6,11). No entanto, o Pai (no Antigo Testamento) e o Filho (no Novo Testamento) afirmaram claramente que “o homem não vive somente de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Dt 8,3; Mt 4,4). Isso significa que não podemos reduzir nossa vida somente às necessidades biológicas e emocionais, mas cuidar das nossas necessidades espirituais. Não podemos cometer o mesmo erro do povo de Israel, de preferir permanecer escravo no Egito, porque lá se podia comer carne e pão com fartura, do que enfrentar a fome no deserto como preço a ser pago para se tornar um povo livre na Terra Prometida.   

O problema de muitas pessoas é que elas sacrificam tempo e dinheiro para terem um corpo perfeito, um carro novo, uma casa melhor, um trabalho mais bem remunerado, para estar com os amigos, para viajarem e descansarem, mas não sacrificam nada, ou seja, não se esforçam para estarem com Deus, para cultivarem sua vida espiritual, para lerem um bom livro, para trabalharem seu caráter e seu temperamento em vista de se tornarem um ser humano melhor, um cristão melhor. Elas podem até ter recebido alguns sacramentos na sua infância e na sua adolescência, mas hoje vivem como pessoas pagãs, esquecendo-se da advertência do apóstolo Paulo: “Não continueis a viver como vivem os pagãos, cuja inteligência os leva para o nada” (Ef 4,17). São pessoas que se corrompem, que se perdem, que vagueiam sem rumo na vida, porque estão sempre sob o comando das suas próprias “paixões enganadoras” (Ef 4,22).

“Senhor, dá-nos sempre desse pão” (Jo 6,34). Do quê você tem fome? Do quê você tem sede? O que você está pedindo a Deus em sua oração? Qual necessidade está mais gritante dentro de você, neste momento? Quando foi a última vez que você alimentou-se espiritualmente? Como você tem cuidado do seu espírito?

 

ORAÇÃO: Senhor Jesus, sou um ser necessitado. Tenho fome; tenho sede; tenho desejo. No entanto, o mais importante não é aquilo que eu desejo, mas aquilo que o Pai sabe que eu tenho necessidade. Na minha oração, eu não sei, de fato, pedir aquilo que me convém, mas o Espírito Santo sabe verdadeiramente do que eu necessito; Ele sabe aquilo que o Pai deseja me dar em vista do meu bem e da minha salvação. Concede-me a graça de transcender, de enxergar a vida para além das minhas necessidades básicas e de cuidar da minha espiritualidade, abrindo-me ao Espírito Santo e permitindo que Ele opere em mim segundo os desígnios do Pai a meu respeito. Mais do que o pão de cada dia, concede-me a fé de cada dia, a esperança de cada dia, o amor de cada dia, o sentido da vida de cada dia. Amém!

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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