Missa de Cinzas. Palavra de Deus: Joel 2,12-18; 2Coríntios 5,20 – 6,2; Mateus 6,1-6.16-18.
No
sentido geral, “conversão” significa “mudança”. Ela se mostra necessária quando
nos damos conta de que tomamos uma direção errada na vida, trazendo destruição
para nós mesmos, para os outros e para o mundo em que vivemos. No sentido
bíblico, porém, a conversão tem um sentido mais profundo. Ele não é apenas
mudança de direção, mas um “voltar-se”: “Agora, diz o Senhor, voltai para mim
com todo o vosso coração (...). Voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno
e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar o castigo”
(Jl 2,12-13).
O
tempo da quaresma é um tempo de revisão de vida, o tempo em que, como o filho
pródigo, podemos tomar uma decisão em vista de salvar a nossa vida pessoal,
comunitária e social: “Vou me levantar, voltar para o meu pai e dizer-lhe:
‘Pai, pequei’” (Lc 15,18). Enquanto Igreja, somos membros do Corpo de Cristo, e
o nosso pecado pessoal afeta esse Corpo. Enquanto seres humanos, estamos
inseridos na sociedade humana, e o nosso pecado pessoal também produz
sofrimento no corpo social. “Voltai-vos para mim e sereis salvos, homens todos
dos confins de toda a terra” (Is 45,22). A quaresma não tem por objetivo apenas
a nossa salvação individual, mas a salvação da humanidade como um todo.
De
quem depende a nossa conversão? Em primeiro lugar, de cada um de nós, tomando
consciência da mudança que precisamos fazer em nossas atitudes, em nossa conduta
de vida afetiva, profissional e espiritual. Mas a conversão é, sobretudo, obra
de Deus em nós. Só Ele pode nos convencer da necessidade de mudança; só a sua
graça pode transformar nosso coração endurecido como pedra num coração
humanizado e dócil à ação do Espírito Santo (cf. Ez 36,26). Justamente porque a
conversão é fruto da graça de Deus em nós, o apóstolo Paulo faz este apelo:
“Deixem-se reconciliar com Deus!” (2Cor 5,20). Permitam que Deus cure as
feridas que o pecado abriu em vocês, na Igreja e na sociedade humana! Deixem-se
conduzir pelo Espírito Santo; deixem-se transformar por sua graça!
Jesus
nos recorda no Evangelho que a nossa vida é feita de relacionamentos: nós nos
relacionamos com o próximo, com Deus e conosco mesmos. Esses relacionamentos
estão saudáveis ou adoecidos? Eles têm gerado em nós paz ou conflitos? Para
sanar o nosso relacionamento com o próximo, Jesus nos fala da esmola. Ela deve
se traduzir em atitudes de compaixão para com quem sofre, para com quem
necessita de nós. Para sanar o nosso relacionamento com Deus, Jesus nos fala da
oração. Ela deve se tornar o espaço que damos a Deus para que Ele nos cure, nos
corrija e nos transforme pela ação da sua graça. Enfim, para sanar a nossa
relação conosco mesmos, Jesus nos fala do jejum como retomada da nossa
liberdade diante dos nossos instintos. O jejum reordena a nossa vida, porque
nos faz passar do “reagir” ao que sentimos para o “responder” àquilo que nos
afeta, e responder a partir da nossa vocação de filhos de Deus e não como
simples pessoas mundanas.
“Cristo
é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade” (Ef 2,14). Uma vez que o
nosso pecado pessoal atinge a Igreja em que nos encontramos e a sociedade em
que vivemos, tornando-se também pecado social, a Campanha da Fraternidade nos
chama à conversão convidando-nos a modificar aquelas atitudes que são opostas
ao Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. Segundo Efésios 2,14-16, Cristo
“derrubou o muro de inimizade” que se parava os povos; em seu corpo pregado na
cruz, “ele destruiu a inimizade” e reconciliou todos os homens com o Pai. Ora,
se Cristo derrubou o muro da inimizade, por que alguns católicos estão usando
as redes sociais para erguer um muro de inimizade entre o povo católico e o
Papa Francisco, entre o povo católico e a Conferência Nacional dos Bispos no
Brasil (CNBB)? Se Cristo orou ao Pai pedindo pela unidade entre os cristãos –
“Pai, que todos sejam um, para que o mundo creia que tu me enviaste” (cf. Jo
17,21), por que alguns católicos usam as redes sociais para combater o diálogo e
a unidade entre a nossa Igreja e outras igrejas cristãs?
Quando
Jesus iniciou sua quaresma, o diabo estava lá, esperando por ele no deserto
para tentá-lo, para confundi-lo (cf. Mt 4,1; Mc 1,13; Lc 4,2). Assim também
nossa Igreja no Brasil inicia sua quaresma sentindo a força do maligno agindo
nela, para dividi-la, colocando uns contra os outros. Se o espírito do mal
divide, o Espírito Santo une; se o espírito do mal levanta muros de inimizade entre
as pessoas, o Espírito Santo constrói pontes que possibilitam o diálogo, o
entendimento e a comunhão. Deixemo-nos guiar nesta quaresma pelo Espírito
Santo, e assim não cairemos nas armadilhas do espírito maligno.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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