sexta-feira, 17 de julho de 2020

PACIÊNCIA E TOLERÂNCIA EM RELAÇÃO AO JOIO; CONFIANÇA EM RELAÇÃO AO TRIGO

Missa do 16. dom. comum. Palavra de Deus: Sabedoria 12,13.16-19; Romanos 8,26-27; Mateus 13,24-29.36-43.

 

Há uma incômoda presença no mundo: a presença do mal. Na imensa plantação de trigo, há uma incômoda presença: a presença do joio. Na imensa beleza da perfeição do trigo, há uma incomoda presença: a da imperfeição do joio. Há, portanto, uma incômoda verdade: a verdade de que, no campo que é o mundo, não existe somente o bem, mas também o mal, da mesma forma que, no campo da alma de cada um de nós, não existe somente o bem (trigo), mas também o mal (joio).

Como lidar com essa realidade? A proposta do momento tem sido a intolerância, o fanatismo, a intransigência. Pessoas que se julgam ser puro trigo se apresentam para eliminar do campo da política e da sociedade aquilo que elas consideram como puro joio. Essa intolerância com o joio é fruto do fanatismo, e o fanatismo nos faz cegos e intransigentes. O outro, que pensa diferente de mim, que professa uma fé diferente, que tem opiniões políticas diferentes, que vive uma sexualidade diferente, tem que ser eliminado, para o bem da humanidade!

Não é essa a atitude que Jesus nos propõe no Evangelho que acabamos de ouvir. “Os empregados perguntaram ao dono do campo: ‘Queres que vamos arrancar o joio?' O dono respondeu: ‘Não! pode acontecer que, arrancando o joio, arranqueis também o trigo. Deixai crescer um e outro até a colheita!’” (Mt 13,28-30). “Deixar crescer um e outro” significa que não nos cabe eliminar por nós mesmos aquilo ou aqueles que julgamos serem a causa do mal na Igreja, na sociedade, na humanidade. Significa que temos que aprender a exercitar a tolerância, a paciência; tolerância e paciência com os outros e conosco mesmos. Ninguém está pronto. Nenhum ser humano já está definido como joio (pessoa má) ou como trigo (pessoa boa). Todos nós estamos em processo; todos nós estamos cultivando o campo da nossa existência, e ainda não claro se o que prevalecerá nesse campo será o joio ou o trigo.

Jesus quis nos contar a parábola do joio para nos ensinar que não existe uma religião pura, uma igreja pura, um partido político puro, uma pessoa pura. Em todo ser humano e em todas as estruturas humanas existem o bem e o mal, o perfeito e o imperfeito, o “já” e o “ainda não”, a capacidade e o limite, a força e a fraqueza. Nossa tentação sempre é a de eliminar um dos polos, ficando somente com o outro. Mas isso, além de ser impossível, nos tornaria “aleijados”, soberbos, arrogantes, convencidos de que já estamos prontos.  

“A atitude sábia de deixar o ‘trigo e o joio crescerem juntos’, nos remete precisamente ao que temos de fazer com o nosso próprio ‘joio’: aceitá-lo, acolhê-lo, integrá-lo, reconhecê-lo como nosso, sem reduzir-nos a ele e sem nos deixar determinar por ele. A aceitação do ‘joio’ nos humaniza, pois nos faz descer de nosso pedestal egóico – feito de exigência, perfeccionismo e de complexo de superioridade – e aproximar-nos de nosso ser verdadeiro. Às vezes, no mal que queremos extirpar, há um bem que não sabemos descobrir” (Pe. Adroaldo Palaoro, sj). Portanto, a pergunta que cada um de nós precisa se fazer não é: “O que eu faço com o joio que há em mim?”, mas “O que eu quero fazer com o joio que há em mim?”. Querer arrancar totalmente o mal do mundo e de nós mesmos geralmente nos leva a causar um mal ainda maior.

Ao permitir que joio e trigo cresçam juntos no mesmo campo, Jesus nos convida à confiança: o joio nunca impedirá o trigo de crescer e de amadurecer, e quando as espigas de trigo estão maduras, distinguem-se claramente do joio! Não precisamos ter medo de que o mal prevalecerá sobre o bem. Não precisamos dizer a Deus o que Ele tem que fazer! Deus confia na boa semente de trigo que cada ser humano é. O mal não tira o sono de Deus. O mal não leva Deus a ficar deprimido, a Se sentir fracassado em relação ao ser humano ou a ficar pessimista em relação a ele.

Enquanto nós costumamos nos encher de pessimismo por causa da quantidade de joio no campo do mundo, Deus mantém o Seu olhar confiante e amoroso sobre cada espiga de trigo que cresce e amadurece sob o sol da Sua misericórdia: “A tua força é princípio da tua justiça, e o teu domínio sobre todos te faz para com todos indulgente... Dominando tua própria força, julgas com clemência e nos governas com grande consideração... Assim procedendo, ensinaste ao teu povo que o justo deve ser humano; e a teus filhos deste a confortadora esperança de que concedes o perdão aos pecadores” (Sabedoria 12,16.17.18)

O tempo presente é o tempo de nos cultivar como trigo até o momento da colheita. “A colheita é o fim dos tempos... (quando) o Filho do Homem enviará os seus anjos e eles retirarão do seu Reino todos os que fazem outros pecar e os que praticam o mal; e depois os lançarão na fornalha de fogo... Então os justos brilharão como o sol no Reino de seu Pai” (Mt 13,39.41-43). O Pai confiou ao seu Filho a tarefa de julgar, isto é, de separar o joio do trigo. O Filho, por sua vez, nos convida a confiar na força do trigo que há em cada um de nós, lembrando que o joio que há no outro sempre será oportunidade para que eu reconheça o joio que há em mim.

Enfim, em nosso processo de crescimento e de amadurecimento, não nos esqueçamos de que “o Espírito vem em socorro da nossa fraqueza” (Rm 8,26). Ele é o princípio do bem em nós. Ele nos faz pacientes e tolerantes com o joio que há em nós e nas outras pessoas. O Espírito Santo “intercede em nosso favor, com gemidos inefáveis... É sempre segundo Deus que o Espírito intercede em favor dos santos (cristãos)” (Rm 8,26-27). Aqui está mais um motivo para não nos tornarmos pessimistas ou nos sentirmos fracassados: por conhecer a boa semente que somos, o Espírito Santo intercede constantemente ao Pai, para que a verdade do trigo prevaleça em cada um de nós, apesar do joio que carregamos conosco. Entreguemos ao Espírito Santo nosso processo diário de amadurecimento, pedindo-Lhe a graça da paciência, da tolerância e da confiança em relação à semente de trigo que cada um de nós é.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi


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