Missa
de Pentecostes. Palavra de Deus: Atos 2,1-11; 1Coríntios 12,3b-7.12-13; João
20,19-23.
Chegamos ao dia de Pentecostes,
palavra que contém em si o número cinquenta. Cinquenta dias após a Páscoa, os
judeus celebravam essa festa, por dois motivos: louvar a Deus pela bênção das colheitas
e pelo dom da Lei (os Dez Mandamentos). Exatamente neste dia, o Pai enviou o
Espírito Santo, prometido por seu Filho à sua Igreja. Desse modo, para nós,
cristãos, Pentecostes se reveste de um novo significado: é a festa do batismo
da Igreja, por assim dizer; é a celebração do dom por excelência do Pai e do
Filho: o derramamento do Espírito Santo. Pentecostes é a festa do Espírito
Santo!
Desde o princípio da história da
salvação, a presença do Espírito Santo foi sendo mencionada de maneira discreta
na Sagrada Escritura. Mas, antes de refletir sobre isso, é importante termos
claro que Ele é chamado “Espírito Santo” porque é o Espírito de Deus, e Deus é
Santo!
No
Antigo Testamento, o Espírito Santo é entendido como a força de Deus que
capacita sacerdotes, profetas e reis a cuidarem do povo que lhes foi confiado.
Neste sentido, o verdadeiro líder é uma pessoa que obedece ao Espírito de Deus,
que não se orienta pela voz do seu ego e dos seus desejos (ambições) humanos,
mas que se deixa orientar pela voz do Espírito em sua consciência. Quando o
líder abandona sua obediência à voz do Espírito, ele perde aquilo que a
Escritura chama de “unção”: o Espírito Santo se afasta dele. Exemplo clássico:
o rei Saul (cf. 1Sm 13,7b-15; 15,10-23; 16,14: “O espírito do Senhor tinha se
retirado de Saul”).
Os apóstolos tinham essa mesma
consciência: Deus concede o Espírito Santo àqueles que Lhe obedecem (cf. At
5,32). Isso significa que se eu quiser o Espírito Santo apenas para “desfrutar”
da sua unção, apenas para me sentir forte e ser bem sucedido naquilo que faço, sem
estar disposto a me submeter à Sua vontade, que é me tornar uma pessoa segundo
o coração de Deus, Ele não me será dado.
Retornando ao Antigo Testamento, por
muitos séculos, ao longo da história da salvação, se pensou que o Espírito de
Deus só era dado a algumas pessoas “privilegiadas”: sacerdotes, reis e
profetas. Foi graças ao profeta Joel que pudemos descobrir que o desejo de Deus
é derramar o Seu Espírito sobre todo ser humano: “Derramarei o meu espírito
sobre toda carne” (Jl 3,1). Propositalmente, Deus se refere ao ser humano como “carne”,
sinônimo da nossa fraqueza, do nosso nada, da nossa insuficiência. Pois bem:
Deus prometeu derramar em nós a Sua força, a Sua presença, o Seu princípio
vivificador, o Seu Espírito.
Jesus
disse: “é o espírito que vivifica, a carne para nada serve” (Jo 6,63). Sem o Espírito
Santo, somos apenas cadáveres – carne dada aos vermes, pessoas fadadas ao
apodrecimento. Só o Espírito de Deus nos faz “viventes”. Como afirma o apóstolo
Paulo, se é verdade que o nosso corpo está marcado pela morte, nosso espírito
está vivo, graças ao Espírito Santo que ressuscitou Jesus e dará vida também
aos nossos corpos mortais (cf. Rm 8,10-11)! Na verdade, essa carne vivificada
pelo Espírito foi representada simbolicamente no momento da criação, quando “o
Senhor Deus modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas narinas um
hálito (sopro) de vida e o homem se tornou um ser vivente” (Gn 2,7). Desse
mesmo modo Jesus comunicou o Espírito Santo aos apóstolos: “soprou sobre eles e
lhes disse: ‘Recebam o Espírito Santo’” (Jo 20,22).
Esta é a nossa verdade como seres
humanos: somos carne e espírito, fraqueza e força, sombra e luz, egoísmo e
amor, externo (o que se vê) e interno (o que não se vê). Nossa tarefa consiste
em colocar essas duas realidades para dialogarem. Além disso, todos os dias
precisamos escolher como queremos nos definir enquanto pessoa: a partir da
carne ou a partir do espírito; a partir de fora (da pressão que o mundo exerce
sobre nós) ou a partir de dentro (da força do Espírito Santo que nos habita).
Que o Espírito Santo nos habita – ainda
que, na maioria das vezes, como uma Presença ignorada! – já nos foi dito por
Jesus: “o Espírito da Verdade (...) estará dentro de vocês” (Jo 14,17). Como
percebê-Lo? Através do Seu gemido! Segundo o apóstolo Paulo, o Espírito de Deus
manifesta a Sua presença em toda a criação, não só no ser humano. Presente na
criação, Ele geme como que “em dores de parto... Mas nós também, que temos os
primeiros frutos do Espírito, gememos interiormente, suspirando pela redenção
do nosso corpo” (Rm 8,22-23).
Qual
é o gemido do Espírito? Ele suspira em nós através de um anseio, movendo-nos na
direção daquilo que somos chamados a ser, segundo a nossa própria vocação. Ele “geme”
em nós como sinal de que ainda não estamos prontos, mas o Pai e o Filho
continuam a realizar em nós a obra da salvação (cf. Sl 138,8; Fl 1,6). O gemido
do Espírito é um clamor ao Pai: “Abbá” (Papai), nos dando a certeza de que não
somos órfãos, mas filhos no Filho (cf. Rm 8,15-16; Gl 4,6). Quem está aberto ao
Espírito Santo houve o seu gemido no mundo: Ele geme protestando contra a
mentira, a violência, a injustiça, contra tudo aquilo que desumaniza as pessoas
e atenta contra a vida do ser humano, da criação e do meio ambiente.
Enfim,
olhando mais especificamente para a nossa vida espiritual, percebemos que o
gemido do Espírito se expressa de duas maneiras opostas: como consolação e como
desolação. Quando estamos na vontade de Deus, o Espírito Santo nos enche de
consolação, de alegria, de paz, de realização. Contudo, quando nos afastamos da
vontade de Deus, o Espírito Santo nos provoca desolação, tristeza, vazio,
angústia, convencendo-nos de que nós nos afastamos da nossa verdade, e aquela
situação nada tem a ver com a nossa liberdade e não nos trará nenhuma
realização.
Muitas
outras coisas poderiam ser ditas a respeito do Espírito Santo, mas estas já
bastam para nos convencer da absoluta necessidade que temos de clamar ao Pai o
reavivamento do seu Espírito em nós, em nossa Igreja, em nossas famílias, nas escolas,
faculdades e universidades, nos locais de trabalho, no campo da política e da
economia etc.
Dirijamos
nossa súplica ao Espírito Santo: “Espírito de Deus, enviai dos céus um raio de
luz! Vinde, Pai dos pobres, dai aos corações vossos sete dons. Consolo que
acalma, hóspede da alma, doce alívio, vinde! No labor descanso, na aflição
remanso, no calor aragem. Ao sujo lavai, ao seco regai, curai o doente. Dobrai
o que é duro, guiai no escuro, o frio aquecei. Enchei, luz bendita, chama que
crepita, o íntimo de nós! Sem a luz que acode, nada o homem pode, nenhum bem há
nele. Dai à vossa Igreja, que espera e deseja, vossos sete dons. Dai em prêmio
ao forte uma santa morte, alegria eterna!” (Sequência de Pentecostes).
Pe.
Paulo Cezar Mazzi